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JORNAL

Com metodologia inovadora, crianças de escola do DF aprendem a ler na metade do ano letivo

Crianças com livros, sentadas no chão da biblioteca

Na manhã da quarta-feira, 13 de julho, dez crianças de 6 anos, da turma de primeiro ano da professora Viviane Alves, da Escola-Classe da 308 Sul, deixaram a sala de aula e seguiram com pressa e entusiasmadas para a biblioteca escolar. Sentaram-se no carpete emborrachado e colorido, com as pernas cruzadas, e receberam livros infantis. Uma por vez, leram o título e as primeiras páginas.

Com uma metodologia experimental própria de alfabetização, que associa a sistematização do método fônico com a visão da linha do construtivismo, a escola pública, situada no Plano Piloto de Brasília, tem conseguido que alunos do primeiro ano do ciclo de alfabetização aprendam a ler com fluência até o meio do ano letivo.

Na roda de leitura daquele dia, Nathaly Vivian descobriu a história da cachorrinha Daninha e da pulga que mora e pula de seu pelo toda vez que ela toma banho de xampu. Depois, vieram as histórias lidas por Mariana, João Gabriel, Samuel, Felipe, Yasmin, Nathália, Anelise, Maria Júlia e, por fim, João Lucas. Imerso na leitura, em voz alta e fluente, ele foi o último da turminha a se levantar para a merenda do dia — macarrão com carne cozida. Não queria deixar a biblioteca antes de saber o final do livro.

Comunicativo e dono de um sorriso sem um dos dentinhos da frente, João Lucas recordou-se da primeira história que leu quando aprendeu o segredo das letrinhas. A história do pastorzinho de ovelhas estava no livro que recebeu de presente da vovó Gegê. “Ele gostava de contar mentiras, e um dia veio o lobo mau, que queria comer as ovelhas; ninguém acreditou no menino, e as ovelhas só foram salvas porque o pai do pastorzinho chegou a tempo e gritou para espantar o lobo”, relatou João Lucas, de 6 anos. E assim, um a um, os alunos da professora Viviane vão aprendendo a ler.

Metodologia — A metodologia criada por Viviane, antes defensora do construtivismo, e pela pedagoga Luciene Trindade, que anteriormente limitava-se ao método fônico, é aplicada na Escola-Classe da 308 Sul desde 2012, tem repercutido e resulta em sucesso escolar na alfabetização e na produção de redações mais à frente. As duas professoras defendem a junção dos pontos positivos das duas formas de aprendizagem. “Com esse foco na consciência fonológica, observamos que em três meses os alunos começam a entender o processo de leitura”, afirma Viviane. “Até o fim do ano, quase todos os meus 29 alunos estarão lendo com fluência.”

De acordo com a professora, o método fônico não é silábico, mas trabalha com a estrutura do som das letras. Por isso, todos os dias, no começo da aula, os alunos passam por atividades para apreender a estrutura do fonema (som), do grafema (escrita) e do articulema (pronúncia). Os alunos que ainda não leem com fluência já exibem leitura silábica e pausada. “É preciso ser criativo e variar essas atividades de estímulo à leitura”, diz. Ela distribui letras de plástico para que as crianças falem palavras iniciadas por essas letras e usa muitos poemas e músicas. “Por exemplo, cantamos que a canoa virou porque a letra ‘p’ não soube remar, e assim por diante vamos criando e interagindo”, explica.

“O método fônico funciona, mas por ser muito mecânico é preciso vir junto do contexto em que a criança está inserida, e nisso está a contribuição do construtivismo”, acrescenta Luciene. “Nosso método junta o melhor dos dois, e estamos muito felizes com os resultados.”

Coordenadora no Centro Regional de Ensino do Plano Piloto, Luciene trabalha com a formação de professores dos anos iniciais do ensino fundamental de escolas da rede pública do Distrito Federal. Ela entende que a alfabetização, para ter sucesso, depende muito de quem está à frente desse processo na sala de aula. “A alfabetização depende do conhecimento do professor e, por isso, a formação é muito importante”, afirma. “A maior dificuldade no processo de alfabetização está na interpretação de textos: a criança tem de decodificar e entender o que está lendo, mas infelizmente a Escola da 308 Sul é uma exceção no DF e no Brasil.”

Segundo a professora, as crianças demoram até o final do 3º ano para completar o processo de alfabetização.

Apoio — Além da metodologia inovadora na alfabetização, com repercussão positiva e exemplo para as demais escolas da rede pública do Distrito Federal, os professores da Escola-Classe da 308 Sul recebem apoio, desde 2014, da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Tocantins (UFT), por meio do projeto de extensão Educação Inclusiva: Modos de Fazer, que se ampara em estudos de neuropedagogia. Outras cinco escolas da rede pública de Tocantins também são atendidas pelo projeto. A ideia inicial era auxiliar no processo de aprendizagem de crianças que apresentam algum tipo de dificuldade, mas todos os alunos acabaram por ser incluídos no projeto, que atua na formação continuada de professores das séries iniciais da Escola-Classe da 308 Sul, incluídos os da alfabetização.

De acordo com a professora Zaíra de Oliveira, coordenadora do projeto da UFT, existem várias formas ou estilos de aprendizagem. Segundo ela, o atraso na alfabetização, muitas vezes, ocorre por não se respeitar o estilo de aprendizagem do aluno. “O professor precisa saber identificar isso e atuar de forma adequada”, diz. Ela explica que há criança sistêmicas, que gostam de fazer registros e aprendem assim, enquanto outras são auditivas, não precisam anotar para aprender, mas têm dificuldades com as informações visuais. “As crianças têm estilos e tempos diferenciados no processo de alfabetização, e o nosso trabalho é conscientizar os professores alfabetizadores acerca dessa diferença para que identifiquem esses alunos em sala de aula”, explica. “Esse modo de alfabetização vai atuar nas dificuldades.” (Rovênia Amorim) (Republicada com alterações em 2.8.2016)