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Edição 126 - Prêmio Viva Leitura-8ª Edição
30/06/2016
 
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Vítimas da violência encontram nos livros a cura para a dor

O projeto já atendeu a 200 crianças e adolescentes vítimas da violência sexual

O projeto já atendeu a 200 crianças e adolescentes vítimas da violência sexual

Autor: Mariana Leal - ACS MEC


As páginas de todos aqueles livros da estante guardam muito mais que histórias reais ou imaginadas, versos e aventuras. Podem abrigar na sequência das palavras a cura das alegrias roubadas de uma fase da infância ou da adolescência. Para todos eles, crianças e adolescentes vítimas da violência sexual, a descoberta do mundo da leitura tem ajudado a superar uma dor profunda e calada, que às vezes a família demora a perceber. Desde 2015, os profissionais voluntários do Instituto Chamaeleon (leia-se camáleon), instituição sem fins lucrativos com sede em Brasília, têm usado oficinas de leitura, narração de histórias e produção de textos no atendimento gratuito a crianças e adolescentes do Distrito Federal no propósito de resgatar sonhos interrompidos e o otimismo com o futuro.

O projeto, denominado Literatura que Cura, foi premiado este ano na oitava edição do Viva Leitura, na categoria 3, denominada Territórios da Leitura. O concurso é realizado desde 2006 pelos ministérios da Educação e da Cultura, em parceria com a Organização dos Estados Ibero-americanos para Educação, Ciência e Cultura (OEI). O projeto já atendeu a 200 crianças e adolescentes vítimas da violência sexual. Os resultados têm sido tão positivos que a psicanalista Beatriz Schwab, presidente e fundadora do instituto, pensa em aprimorá-lo. “Quando chegam aqui, querem ficar na internet, como qualquer outro da idade deles, mas vamos incentivando a leitura e, no final, o livro passa a ser tudo na vida dessas crianças e adolescentes”, conta.

Atualmente, 52 crianças e adolescentes, vítimas de abuso e com dificuldades de aprendizagem, são atendidos pelo projeto, que dá prioridade a oficinas de leitura, produção de textos, desenho e narração de histórias nas sessões de terapia. Beatriz explica que o trabalho psicoterapêutico com base na leitura tem repercutido em melhor desempenho em sala de aula e redução dos casos de evasão. “Muitos abusos ocorrem no ambiente escolar, praticados por colegas ou mesmo professores”, afirma. A consequência imediata é a mudança do comportamento. “Muitos pais não percebem o real motivo pelo qual a criança ou o adolescente não quer ir para a escola”, acrescenta. “Crianças e adolescentes que sofrem abuso se tornam, de uma hora para outra, agressivos ou se isolam, querendo, por exemplo, ficar trancados no quarto. É preciso ficar atento.”

Voluntários — O projeto Literatura que Cura tem o incentivo da Vara Regional de Atos Infracionais da Infância e da Juventude do Distrito Federal e conta com o trabalho voluntário e especializado de psicólogos e profissionais da saúde, da educação, da cultura, das artes e do direito. “Por meio da literatura, dos livros, das histórias contadas, das rodas de leitura, dos saraus, do nosso clubinho da leitura, dos bate-papos literários e das atividades de formação de leitores, conseguimos transformar realidades massacradas pela dor, agonia e desesperança”, afirma Beatriz.

Os psicólogos do projeto oferecem treinamento aos contadores de histórias e aos oficineiros que trabalham com as crianças e adolescentes. Além de atuar nas sessões de terapia, os profissionais do instituto visitam creches e escolas e participam de palestras sobre a violência sexual contra adolescentes e crianças. A ideia básica é que as vítimas aprendam a preencher os momentos solitários com lembranças agradáveis, não deixando espaço para a tristeza e as recordações ruins. Em reuniões mensais, os diretores do Instituto Chamaeleon definem os temas de leitura que serão adotados nas oficinais de amenização de traumas. Além de ouvir as histórias, as crianças e adolescentes vítimas de abuso e maus-tratos participam de workshops de produção de textos, de criação de poesias, de leituras dramáticas e de desenho.

No ano passado, a pedagoga Patrícia Mezini, professora de ensino religioso em escola particular de Brasília, participou das atividades do instituto, ora como alfabetizadora, ora como contadora de histórias. Era a Tia Paty, que uma vez por semana ensinava a ler crianças com dificuldades de aprendizagem. “É muito gratificante ser um instrumento do bem, se colocar no lugar do outro, perceber seu sofrimento; aprendi muito com essas crianças. Eu dei amor, mas recebi amor também”, lembra. “Aconselho a todos a reservar um pouco do seu tempo para ações de voluntariado. Vivemos num tempo em que as pessoas estão muito egoístas, cuidando apenas de si. E criança é tudo de bom. Não importa se sejam pobres ou ricas; são todas uma bênção de Deus.”

Nas sessões de leitura, a cada livro lido, a criança ou o adolescente é incentivado a fazer um pequeno relatório sobre o que entendeu e como aquela história pode contribuir para a sua vida. De acordo com Beatriz, os depoimentos de pais e responsáveis das crianças revelam um quadro de melhor autoestima das crianças e jovens que participaram do Projeto Literatura que Cura. “O trauma nunca vai sumir, mas é possível conviver com ele e entender que elas foram vítimas de uma agressão e não tiveram culpa pelo acontecido. Temos relatos de adultos que constituíram família e conseguem trilhar a vida”, afirma.

Desafio — O projeto tem sido custeado por empresárias brasilienses que também doam livros, roupas, brinquedos, alimentos e ajudam a arcar com as passagens dos pacientes mais carentes, que moram longe do local de atendimento. O desafio atual do projeto Literatura que Cura é levantar recursos para publicar os cinco livros da coleção infantojuvenil Confrades do Bem. A ilustração e a edição do material já foram concluídas, com o apoio de profissionais voluntários.

Um desses livros traz cinco histórias escritas por crianças e adolescentes que participam do projeto e se inscreveram no concurso de produção de textos realizado pelo instituto. “As histórias não são sobre as suas dores. Nós não focamos a violência, mas um mundo melhor”, explica Beatriz. “E eles escrevem sobre esse olhar positivo sobre a vida futura nesse mundo.” (Rovênia Amorim)

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