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JORNAL

Especial Dia do Professor-2014

Quarta-feira, 1 de Outubro de 2014

Edição 105

EDITORIAL - Especial Dia do Professor-2014

Em sua 105ª edição, o Jornal do Professor presta uma homenagem aos professores pela passagem de duas datas importantes no mês de outubro. O Dia Mundial do Professor, instituído pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) é comemorado no dia 5, em mais de 100 países. E o Dia do Professor, é festejado no Brasil no dia 15.

Nesta edição especial, selecionamos histórias e experiências vividas por professores de diversos estados. Você terá oportunidade de conhecer um pouco sobre o trabalho de Berta Lange de Morretes, docente da Universidade de São Paulo (USP) durante mais de 70 anos; Caren Bühler, professora no curso de pedagogia da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra) e coordenadora pedagógica no Colégio Sinodal, de São Leopoldo (RS); Alessandro Santana Reis, professor em duas escolas do Distrito Federal; Úrsula Velasques, professora da Escola Indígena Ñande Reko Arandu, em Coronel Sapucaia (MS); Simone Lessa, diretora da Escola Municipal Narciso Macedo, em Iguaba Grande (RJ); Ruth Julio dos Santos, Rosana Severo Spreckelsen da Cunha e Maria Ivone Alves Serpa, professoras gaúchas de Imbé, Santa Maria e Porto Alegre, respectivamente.

As professoras Ana Lúcia Pintro, Diana Morona e Maria Albertina Guizzo, do município catarinense de Cocal do Sul, participam da seção Espaço do Professor. A participante da seção Entrevista é Maria Isabel da Cunha, docente do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), de São Leopoldo (RS).

Ajude-nos a escolher o tema das próximas edições, votando na enquete colocada em nossa página. E aproveite para colaborar enviando sugestões, críticas, textos e músicas!

Seja bem-vindo!

Berta Lange de Morretes: “O prazer de ensinar e ajudar pessoas em busca de conhecimento está em primeiro lugar”

Professora Berta Lange de Morretes, em sua sala na USP

Professora da Universidade de São Paulo (USP) por mais de 70 anos (1941 a 2013), Berta Lange de Morretes, 97 anos, revela que o interesse pelo magistério surgiu quando ainda era estudante do antigo curso ginasial. Exemplo de dedicação e amor ao trabalho realizado, ela continuou atuante na universidade mesmo depois de aposentada. E justifica a motivação: “Em primeiro lugar está o prazer de ensinar e poder ajudar as pessoas que buscavam conhecimento”.

Com graduação em ciências naturais e livre docência pela própria USP e pós-doutorado pela University of California–Davis, Berta dedicou a vida ao ensino e à pesquisa na área de botânica, com ênfase em anatomia vegetal.

Berta nasceu na cidade de Iffeldorf, Alemanha. Filha de mãe alemã e pai nascido no Brasil, veio para o Brasil ainda criança.

Jornal do ProfessorComo surgiu o interesse pela carreira acadêmica, tanto pelo ensino quanto pela pesquisa?

Berta Lange de Morretes – Surgiu quando era garota, no ginásio. Como meus pais eram professores, mantinham uma escola em casa para quem não tinha condições de pagar por aulas de música, canto e desenho.

Foram mais de 70 anos de dedicação à USP. O que a fez continuar a trabalhar, mesmo depois de aposentada?

– Em primeiro lugar, o prazer de ensinar e de poder ajudar as pessoas que buscavam conhecimento. Depois, eu tinha condições e vontade de continuar meu trabalho de pesquisa.

O que mais valeu a pena, no decorrer da carreira acadêmica? O ensino, a pesquisa?

– As duas são complementares e valeram muito a pena. Ao pesquisar eu podia ensinar e aprender.

Nesse período de mais de 70 anos, a senhora detectou mudanças nos estudantes, de comportamento, atitudes, interesses?

– Em certo aspecto, o uso de muita tecnologia deixou tudo mais fácil para os alunos. Eu percebia uma certa falta de interesse por parte deles em relação a conhecimentos que para mim são essenciais, como fazer os desenhos anatômicos, por exemplo.

A senhora teria alguma mensagem ou conselho para os jovens professores que estão começando suas atividades?

– É difícil aconselhar, mas gostar do que faz e dedicar-se já é um bom caminho.

Vocação para o ensino começou cedo, admite educador do DF

Professor Alessandro Santana Reis na sala de aula, com alunos

Há 20 anos no magistério, com atuação em duas escolas do Distrito Federal, o professor Alessandro Santana Reis diz que trabalhar com educação é sua vocação e sua vida. “Não há nada que eu faça melhor e com mais satisfação do que ensinar. É o poder de transformar, de construir, de modificar positivamente as pessoas e a sociedade”, ressalta.

Professor de biologia e de ciências naturais, ele explica que o gosto pela profissão começou cedo. Com muita facilidade para ensinar, costumava dar aulas aos primos e aos colegas de escola. O interesse pela biologia surgiu no primeiro ano do ensino médio, quando precisou estudar sozinho a disciplina por não ter um bom professor. A paixão pela biologia aliou-se, então, à paixão pela docência. Foi então que Alessandro teve a certeza de sua escolha: “Seria um professor, com grande orgulho do papel que teria de desempenhar”, destaca.

Para ele, a educação é um processo dinâmico, no qual o professor e o aluno precisam interagir ativamente. “Devem ser momentos agradáveis, prazerosos, para os alunos e para mim”, diz. “Na medida do possível, respeitando as normas e seguindo o currículo vigente, minhas aulas são divertidas e participativas.”

Segundo Alessandro, a empolgação renova-se a cada aula, pois um assunto que não interessa a alguns pode ser extremamente interessante para outros. “Ao longo de uma manhã ou mesmo ao longo da semana são feitos os vários ajustes necessários para compatibilizar disciplina, aprendizagem, conteúdo e satisfação”, analisa. “O desejo de aprender dos alunos é um propulsor superpotente.”

O professor costuma trabalhar com projetos nas duas instituições. “Na escola pública, o espaço curricular, denominado Parte Diversificada, permite que a escola selecione bons projetos e os execute”, salienta. Atualmente, ele trabalha com um projeto de educação sexual, que abrange todo o ano letivo e tem o objetivo de reduzir o número de jovens contaminados com doenças sexualmente transmissíveis (DST) e de adolescentes grávidas.

Com graduação em ciências biológicas e especialização em educação, Alessandro trabalha nos três turnos. De manhã, leciona biologia no Centro Educacional Sigma, unidades Sul e Norte do Plano Piloto de Brasília. Nessa instituição também é coordenador de cadeira. Ele trabalha com alunos do terceiro ano do ensino médio que se preparam para o Programa de Avaliação Seriada (PAS) da Universidade de Brasília (UnB), para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e para os vestibulares tradicionais. À tarde, dá aulas de ciências naturais a alunos da sétima série (oitavo ano) no Centro Educacional 4, do Guará, escola da rede pública do Distrito Federal, da qual é professor concursado. Nessa mesma escola, à noite, ocupa o cargo de supervisor pedagógico da educação de jovens e adultos (EJA).

Embora vivencie realidades distintas nas duas instituições, Alessandro considera o professor como o elemento mais importante no processo de ensino-aprendizagem. “A ausência de alguns recursos não impede o trabalho do professor, mas, exige muito mais dele”, avalia. O segredo para ser um bom professor, enfatiza, é acreditar no poder transformador da educação e no potencial dos alunos, estudar, dedicar-se à profissão e trabalhar com amor. “Esses fatores, somados, são os eixos fundamentais para que um professor possa ser considerado um bom profissional.” (Fátima Schenini)

Carinho é forma de apoio aos alunos em escolas gaúchas

Professora Ruth com alunos em atividade de leitura

Há 23 anos no magistério, Ruth Julio dos Santos sempre desejou ser professora. Quando criança, brincava de dar aulas. Ela trabalha na Escola Municipal Santa Catarina, no município de Imbé, litoral gaúcho. Graduada em pedagogia, desenvolve atividades na biblioteca, com turmas que abrangem desde a educação infantil até o quinto ano do ensino fundamental.

Para ela, o carinho com os alunos é fator importante para a aprendizagem. “A professora tem de conquistar cada criança, com carinho e paciência”, ressalta.

Na biblioteca, Ruth promove A Hora do Conto. Se a turma é de pequeninos, ela usa fantoches para contar as histórias; se os alunos são maiores, somente livros. “A maior dificuldade ocorre no período logo após a hora do recreio, pois as crianças estão agitadas e custam a se aquietar”, diz. A solução é esperar até que os alunos se acalmem e possam escutar as historinhas.

Nesse período de mais de 20 anos no magistério, Ruth tem acompanhado a trajetória de muitos estudantes. Seus alunos sempre a convidam para participar de festas de aniversários, batizados, formaturas e casamentos. “Os alunos que eram pequenos cresceram e hoje têm filhos. Já dei aulas também para filhos de ex-alunos”, destaca. “Sou feliz com meu trabalho.”

Carinho é fator importante também para Rosana Severo Spreckelsen da Cunha, professora de educação física em turmas da pré-escola até nono ano do ensino fundamental na Escola Municipal Antonio Gonçalves do Amaral, no município de Santa Maria, também no Rio Grande do Sul.

“As crianças geralmente são carentes, pois ficam pouco tempo com os pais e costumam ser carinhosas com as professoras. Às vezes, me chamam de mãe”, revela. Ela observa que os adolescentes costumam ser mais reservados.

A educação física sempre fez parte da vida de Rosana. Filha de professores e casada com um professor da disciplina, ela acredita que o segredo para ser um bom profissional é fazer o que gosta. “O professor tem de passar entusiasmo aos estudantes porque eles percebem quando o professor está realmente fazendo aquilo que gosta e em que acredita”, observa. Rosana está no magistério há 25 anos.

Interação — Para a pedagoga Maria Ivone Alves Serpa, de Porto Alegre, o vínculo que o professor estabelece com o aluno é importante para o processo ensino-aprendizagem. “Se o aluno tem uma dificuldade, procuro entendê-lo”, diz.

Há 39 anos no magistério, com experiência como professora em todos os níveis, como orientadora educacional e como supervisora escolar, Maria Ivone não esquece uma turma de segundo ano do ensino fundamental para a qual deu aulas anos atrás. “Eram alunos considerados difíceis, mas eu sempre dizia a eles que eram muito inteligentes”, explica. Deu tão certo que, embora tenham mudado de escola, os estudantes fizeram questão de convidar a antiga professora para a formatura.

De acordo com Maria Ivone, hoje na Secretaria Estadual de Educação, as aulas eram tranquilas. Ela procurava dar oportunidade para os alunos interagirem. “Sempre dava um tempo para eles conversarem. Isso é entender a fase em que estão”, avalia. “Nunca facilitei nada. Sou exigente, mas sem maltratar e sem humilhar.” (Fátima Schenini)

Caren Bühler (Ulbra): “Sempre acreditei na importância e na essencialidade do professor”

Professora Caren Bühler

O bom professor pode fazer um bom trabalho, mesmo que as condições estruturais e logísticas não sejam as melhores. Quem garante é Caren Bühler, professora no curso de pedagogia da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra) e coordenadora pedagógica no Colégio Sinodal, de São Leopoldo (RS). Ela afirma que as dificuldades devem ser consideradas como desafios. Portanto, os professores não devem se omitir frente à responsabilidade com o aluno.

Interessada em divulgar a existência de bons professores na rede pública de ensino, ela fez pesquisa em seis escolas da rede municipal de um município gaúcho durante o curso de doutorado em educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). Sua tese, Bons Professores que fazem a Diferença na Vida do Aluno: Saberes e Práticas que Caracterizam sua Liderança, resultou no livro O Bom Professor: Referenciais que o Constituem, lançado em 2013.

Caren tem graduação em pedagogia e mestrado em educação.

Jornal do ProfessorO que a levou a escolher esse assunto para uma tese de doutorado?

Caren Bühler – Ao decidir fazer o doutorado, tive como pressuposto, que o trabalho deveria representar uma oportunidade de reflexão sobre minhas convicções pedagógicas em relação ao magistério, articuladas com a vivência docente ao longo dos anos. Consequentemente, era necessário compartilhá-las com os demais professores. Sempre acreditei na importância e na essencialidade do professor. Tive o privilégio de conviver com muitos professores maravilhosos, que tinham os mesmos ideais, pautados no discurso da possibilidade. Ou seja, o professor preparado teoricamente, amando sua profissão e seus alunos, jamais dirá: “É impossível fazer um bom trabalho”. Ele dirá: “Não se pode desistir, vamos em busca de todas as possibilidades”.

As questões iniciais eram:

• Por que, em contextos educacionais considerados precários, pedagógica e administrativamente (passado e presente), sempre temos encontrado bons professores que fazem a diferença em seu local de atuação e, consequentemente, na vida dos alunos, levando-os a querer aprender?

• Quem são esses bons professores?

• Quais os saberes que fundamentam sua prática?

• Que prática é essa?

• Como eles se constituíram enquanto bons professores?

Sendo assim, o grande objetivo foi teorizar sobre meus pressupostos de bom professor e, conduzida pelas questões apresentadas, analisar suas concepções e práticas. Decidi realizar a pesquisa na rede pública para romper com a afirmativa que seguidamente ouço no meio profissional: bom trabalho, somente na rede particular porque há condições físicas e materiais para tal. Quis socializar a existência dos bons professores nesse contexto, pois enquanto orientadora de estágio do curso de pedagogia, me encantava encontrá-los vivos e atuantes, apesar das visíveis dificuldades das escolas. Escolas que evidenciavam paradigmas discursivos sustentadas na afirmativa de que a educação vai mal e não tem mais solução. Foi muito importante a definição pela rede pública de ensino, uma vez que existe, muito fortemente, a ideia de que o bom ensino e os bons professores são exclusividade do sistema particular.

Quantas escolas e professores participaram de seu trabalho?

– A pesquisa foi realizada em seis escolas da rede municipal de ensino de uma cidade do Rio Grande do Sul. Foram entrevistadas as supervisoras pedagógicas dessas escolas, bem como os professores por elas indicados, como profissionais que se destacavam por fazer bom trabalho. Inicialmente, agendávamos uma entrevista com a supervisão, na qual questionávamos:

a) há bons professores na sua escola?

b) quantos?

c) por que são considerados bons professores?

Na sequência, entrevistamos os professores indicados, dirigindo a discussão em forma de autoavaliação para identificar os referenciais de bom professor, os quais eram observados nas aulas que ministravam. Dessa forma, nas entrevistas e observações de aula, foi envolvido um universo de 30 pessoas. Optamos por um número menor de escolas para que pudéssemos nos aprofundar teoricamente nos dados empíricos coletados em cada uma delas.

Qual a principal conclusão, com essa tese? Quais as qualidades (ou características) apresentadas pelos bons professores?

– Os dados da revisão de literatura resultaram em três referenciais principais nas práticas docentes:

a) valorização do relacionamento com o aluno;

b) dialética entre a objetividade e a subjetividade: comprometimento com os conteúdos curriculares, bem como com as condições de aprendizagem dos alunos;

c) processo de estar em formação constante (autoformação) que amplia a consciência espiritual e social do professor, visando à emancipação humana.

Esses referenciais, mediados com os dados empíricos, resultaram em três categorias:

a) conhecimento teórico-prático;

b) prática docente inovadora e motivadora;

c) metodologia inclusiva, norteada pelo afeto e pela firmeza.

O conjunto dessas categorias se revela mediante o exercício de liderança do professor, que na busca do crescimento do aluno considera dois pressupostos básicos: a valorização das potencialidades e do conhecimento do aluno e o desafio constante em levá-lo a superar as possíveis dificuldades, ao exigir dele o comprometimento necessário para uma boa atuação discente. Para tudo isso é muito importante que o professor tenha amplo conhecimento teórico em sua área de atuação, mas também que desenvolva a humanidade, que seja humilde para reconhecer a necessidade constante de autoavaliação e que aprenda permanentemente.

Os bons professores têm características que nascem com eles ou essas características podem ser assimiladas por todos que queiram?

– Os estudos mostram que nem sempre o bom professor inicia as atividades profissionais com esse perfil. Se ele revelar, no entanto, uma postura profissional caracterizada pela intenção docente em não se submeter ao discurso da impossibilidade, mas sim de reagir, pode romper com a superficialidade educacional presente em muitos contextos escolares e fazer um bom trabalho, mesmo que as condições estruturais e logísticas não sejam as melhores. É necessário que ele tenha compromisso com os objetivos educacionais e que valorize, em sua realidade diária, o saber ouvir, o poder falar e, principalmente, o dever falar. A realidade mostra que há professores que não deveriam ser professores, pois vão pelo caminho mais fácil, conduzido pelo discurso da impossibilidade. Não devemos aceitar a cristalização das dificuldades, mas participar ativamente dos espaços de discussão para contribuir com as tão necessárias melhorias na educação. Essas dificuldades não devem representar a omissão do professor frente à responsabilidade com o aluno. Devem ser consideradas desafios.

De alguma maneira, em seu trabalho, são aplicadas as descobertas feitas a partir dessa tese? Pode explicar?

– As atividades profissionais me oferecem a oportunidade de aplicar o tempo todo os resultados desses estudos, uma vez que atuo em duas funções essenciais no campo da educação. Como professora, no curso de pedagogia, em disciplinas que contribuem com a formação do professor; como coordenadora pedagógica, no ensino fundamental, anos iniciais. Nessas funções, refletimos com os futuros professores (universidade) e com os professores atuais (escola) sobre a importância de uma prática docente comprometida e sustentada nos referenciais e categorias antes citados, buscando sempre o entendimento de que o professor é muito importante e precisa se fortalecer em meio a um contexto educativo tão fragilizado e permeado de desafios internos e externos à escola, tais como o descrédito social em relação à profissão de professor; a falta de valores familiares, que acarreta a indisciplina e o desrespeito dos alunos para com os professores; a falta de confiança de um grande número de pais na proposta pedagógica da escola. A tese, para mim, representa um norte para meu trabalho. Tenho certeza de que o compartilhamento dela com meus colegas e alunos tem representado um auxílio muito grande na retomada da valorização da nossa nobre profissão: ser professor.

Ex-aluna chega a diretora de escola no RJ e mostra gratidão

Apresentação da banda da EM Narciso Macedo

Trabalhar na instituição onde estudou dos 6 aos 14 anos tem sido gratificante para a professora Simone Lessa, diretora da Escola Municipal Narciso Macedo, no município fluminense de Iguaba Grande. “Tenho um sentimento de gratidão por essa escola. Sinto que posso contribuir com a comunidade e com a história da instituição que fez e faz parte da minha vida”, destaca.

Professora de língua portuguesa e de língua inglesa, há 14 anos no magistério, Simone diz que ser educadora é uma missão, da qual sente muito orgulho. “Lecionar é participar da formação do indivíduo como um todo”, diz. Professora na instituição durante 13 anos, há dois na direção, ela explica que sempre teve vontade de voltar às raízes a fim de retribuir por tudo o que recebeu.

Nesse período de atuação como diretora, Simone retomou projetos socioculturais e pedagógicos, como a banda marcial, a realização de gincanas e de outros eventos, com a participação da comunidade. Também promoveu melhorias na estrutura física da unidade de ensino e implantou o sistema de exame simulado a fim de preparar e capacitar os estudantes para as provas e para a vida profissional.

Segundo a educadora, a escola, que completou 80 anos em agosto, passou por várias situações difíceis, a ponto de ser cogitado seu fechamento, em razão do baixo número de alunos. Graças a um grupo de profissionais, que assim como Simone, têm carinho e respeito pela instituição, a escola pôde renascer. “Estou feliz por contribuir para o bom desempenho da instituição”, ressalta.

Apesar dos problemas, a escola sempre se destacou pelas excelentes realizações durante todos esses anos. “Podemos perceber que sua história aqui na comunidade é muito importante e sua influência, muito forte; praticamente, quase todo o bairro teve a formação básica aqui”, diz Simone. “Por isso, há um sentimento de respeito e gratidão, comum entre alunos, funcionários, ex-alunos, ex-funcionários e comunidade.”

A escola tem, atualmente, 122 alunos matriculados em turmas do sexto ao nono ano do ensino fundamental, nos turnos da manhã e da tarde. (Fátima Schenini)

Índia caiouá brincava de dar aulas quando era criança

Professora Úrsula Velasques

De etnia caiouá, Úrsula Velasques sempre morou na aldeia Taquaperi, a 15 quilômetros do município de Coronel Sapucaia, em Mato Grosso do Sul. Desde pequena, ela manifestava a vocação para o magistério, pois gostava de brincar de professora com os irmãos. Quando completou 18 anos, foi convidada a lecionar a alunos do primeiro ano do ensino fundamental. “Fiquei muito feliz e, desde então, nunca mais deixei de trabalhar”, diz Úrsula, há nove anos no magistério.

Com licenciatura em ciências sociais, Úrsula trabalha na coordenação pedagógica da Escola Municipal Indígena Ñande Reko Arandu, no atendimento a estudantes do primeiro ao nono ano do ensino fundamental. A escola, dentro da aldeia, tem 768 alunos, 34 professores indígenas e seis não indígenas, residentes em fazendas próximas. Apesar de localizada em aldeia indígena, a instituição conta com computador e acesso à internet, além de equipamentos como data show e televisão.

Além das disciplinas obrigatórias do currículo, a escola também oferece aulas sobre a cultura e o modo de vida indígena (ava reko), com encontros semanais, fora da sala de aula. “Nosso objetivo é fundamentar o ava reko e complementar a educação familiar, incentivando os alunos a estarem bem, além de fortalecer nossa cultura e, principalmente, nossa língua”, explica Úrsula.

Para ela, o principal papel do professor é ensinar, mas deve também saber atuar com base na realidade na sociedade em que vive. “Cada lugar é diferente; por isso, quando estamos numa escola não é fácil”, admite. “Temos de saber entender o mundo da criança de hoje, o que ensinar e como ensinar.”

Como professora, ela acredita que é necessário ao profissional estar sempre atualizado, estudar e se aprofundar para ter firmeza em sala de aula. “Mas nada é mais prazeroso quando gostamos daquilo que estamos fazendo”, ressalta.

A educadora descreve como boa a vida na aldeia, onde as pessoas têm liberdade para construir suas casas onde quiserem, com espaço para plantar, e ainda podem escutar o canto dos pássaros. “É um lugar melhor do que qualquer outro”, avalia. (Fátima Schenini)

Catarinenses estimulam aprendizado em Clubinho de Matemática

Alunos e professoras do Clubinho de Matemática, em 2013

Ana Lúcia Pintro, Diana Morona e Maria Albertina Guizzo, professoras do município catarinense de Cocal do Sul, participam do projeto Clubinho da Matemática, criado para oferecer alternativas pedagógicas capazes de tornar a disciplina mais contextualizada, interessante e lúdica. O clubinho é também uma maneira de incentivar a dedicação dos alunos que participam da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (Obmep) e da Olimpíada de Matemática das Escolas Municipais de Cocal do Sul (Omemcs).

O projeto, da secretaria de educação do município, é desenvolvido com alunos do sexto ao nono ano das escolas municipais de ensino fundamental Demétrio Bettiol e Cristo Rei, no período do contraturno. As aulas, semanais, abordam conteúdos como porcentagem e proporcionalidade, geometria plana e espacial, unidades de medidas, algoritmos e álgebra. São usados jogos, vídeos, questões de olimpíadas de matemática, passeios de estudos e outros recursos que procuram tornar as aulas mais atraentes. Um recurso bastante usado é o cubo mágico. “Mais de 80 alunos já aprenderam a montar o cubo”, ressalta Ana Lúcia.

Todos os encontros são registrados com fotografias e descrição das atividades desenvolvidas, de forma a permitir às professoras e à coordenação um melhor acompanhamento dos trabalhos. Segundo Ana Lúcia, o lema estampado na camiseta que identifica o projeto – A Matemática tem o Poder de Abrir Portas – reflete-se em ações que resultem em novas descobertas e pesquisas.

Para fortalecer o aprendizado da disciplina foram criados este ano dois clubes olímpicos de matemática, Os Euclidianos e Reino Matemático.

O grupo Os Euclidianos, da escola Demétrio Bettiol, tem como lema Seguidores de Euclides Decifrando e Aprendendo Matemática. A coordenadora é a professora Diana Morona. O grupo Reino Matemático, da escola Cristo Rei, adota o lema Matemática em sua Vida e Cálculos em sua Mente. A coordenação é das professoras Ana Lúcia e Maria Albertina. (Fátima Schenini)

Confira o blogue do Clubinho da Matemática

Maria Isabel da Cunha (Unisinos): “Os estudantes merecem professores que encontram sentido no seu fazer”

Maria Isabel da Cunha

Docente titular do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), em São Leopoldo (RS), Maria Isabel da Cunha é professora aposentada da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), onde foi pró-reitora de graduação e coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Educação. Autora de livros, com grande experiência na área da educação – completará 50 anos de magistério em 2015 –, Maria Isabel desenvolve pesquisa sobre prática pedagógica e formação do educador. E tem um recado aos jovens professores: “Permaneçam na profissão se encontrarem sentido na mesma. Senão, devem procurar alternativas”. Segundo ela, “os estudantes merecem professores que encontram sentido no seu fazer”.

Com graduação em ciências sociais e em pedagogia pela Universidade Católica de Pelotas, tem mestrado em educação pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio Grande do Sul e doutorado em educação pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Jornal do Professor Em sua tese de doutorado, a senhora abordou o tema A Prática Pedagógica do Bom Professor: Influências na sua Formação. O que é necessário para ser um bom professor?

Maria Isabel da Cunha – O que me estimulou a realizar o estudo foi a intenção de alterar a lógica tradicional da pesquisa e da formação, que por longo tempo definia modelos teóricos de bom professor, com a descrição de um perfil ideal e, a partir daí, procurava aproximar os sujeitos concretos a essa idealização. Esse exercício se mostrava sempre frustrante, pois não levava em conta a história de vida dos professores, nem as circunstâncias em que aninhava sua ação. Resolvi, então, inverter essa ordem. Ou seja, identificar professores que os estudantes consideravam como bons e estudar suas práticas e formas de produção de seus saberes. Esse estudo foi realizado no final dos anos 1980 e se instituiu numa das primeiras pesquisas de cunho qualitativo e etnográfico sobre o professor, no cenário nacional. A intenção não foi criar um modelo de docência, mas valorizar os saberes docentes, produzindo uma teoria a partir da prática. Atualmente, muitos dos achados que, na época, foram surpreendentes já se instituíram como referentes da pesquisa sobre a docência.

Em sua carreira como professora universitária e pesquisadora, a senhora tem se interessado, de maneira especial, pelo tema formação de professores. Como está a formação de professores em nosso país, de maneira geral? O que poderia melhorar?

– Há uma vastíssima produção de estudos e pesquisas sobre a formação de professores no Brasil. Seu conteúdo foi acompanhando a evolução da compreensão do que se entende por formação. Com base na racionalidade técnica, acreditávamos que a formação consistia numa oferta de conhecimentos disciplinares aos futuros professores, que deveriam assimilá-los da melhor forma possível para, logo então, aplicá-los numa situação de prática. Essa era entendida como aplicação linear da teoria e, por isso coroava, através do estágio, a trajetória curricular. Esse modelo clássico de formação sempre se mostrou questionável, pois mesmo os alunos que obtinham boas notas nas disciplinas teóricas sentiam-se inseguros para enfrentar a prática profissional. Essa constante insatisfação provocou uma ruptura epistemológica, a partir do entendimento de que a prática é muito mais complexa e exigente do que a aplicação linear da teoria e que pode e deve ser o ponto de partida da aprendizagem.

Se a compreensão do que seja formação baliza os formatos que damos aos cursos que formam professores, vemos que hoje avançamos nos desenhos curriculares da formação inicial que inserem práticas precoces durante todo o currículo. Favorecem, assim, que o estudante vá se inserindo aos poucos na profissão, através da observação em situações reais no universo escolar. Entretanto, as estruturas acadêmicas ainda dificultam uma perspectiva integrada dos cursos de licenciatura, em geral repartidos entre os responsáveis pela parte do conteúdo específico da formação e aqueles que se encarregam da formação pedagógica. Essa condição, já denunciada intensamente pelos discursos educacionais, ainda não encontrou guarida na prática da formação. Além disso, com a atual política de valorização dos títulos de mestre e doutor para ingresso no magistério superior, há muitos professores de cursos de licenciatura que não têm experiência na docência da educação básica e nem sequer incluíram estudos das matérias pedagógicas em sua formação. Como, então, estarão aptos a formar professores? Esse cenário se aguça quando consideramos a pouca motivação dos jovens estudantes com a profissão docente, que não apresenta perspectivas de estímulos e valorização. Acorrem aos cursos de licenciaturas muitas vezes por falta de outra opção e muitos não têm a intenção de ingressar na carreira.

Na minha opinião, pois, a fragilidade da formação inicial de professores não está especialmente nos desenhos curriculares, mas na estrutura acadêmica, na formação dos formadores e no desprestígio profissional do magistério.

Quanto à formação em serviço, creio que, como toda a profissão, essa é uma condição inevitável. A docência é uma profissão complexa, que exige múltiplos saberes e está sujeita aos movimentos e contextos epistemológicos, tecnológicos, políticos e sociais. Portanto, o professor deve ser um sujeito aprendente, para fazer o mesmo com seus alunos. Entretanto essa condição exige, também, uma escola aprendente. Ou seja, um ambiente que abrigue uma comunidade de aprendizagem, que valorize os saberes que os próprios professores produzem, acompanhados de um processo de reflexão e teorização sobre a prática. Nessa perspectiva, é fundamental apostar na condição intelectual do professor e estimular sua autonomia, dando-lhe responsabilidade e cobrando-lhe responsabilidade. Em outras palavras, valorizar a sua profissionalidade. Infelizmente, as políticas governamentais nem sempre têm ido nessa direção, infantilizando o professor através de materiais instrucionais predefinidos, como se ele não fosse capaz de tomar decisões sobre seu fazer profissional. Mais adequado seria respeitar e estimular a escola como um espaço de produção de conhecimento, onde o desenvolvimento profissional dos professores acompanhasse a qualidade esperada do seu trabalho.

Uma palavra importante, ainda, vai para ressaltar a importância de um acompanhamento aos professores iniciantes. É necessário reconhecer que há uma fase de transição entre a formação inicial e o princípio da carreira docente. Muitos países já reconheceram essa fase como uma destacada etapa, que exige inversão de recursos e cuidados institucionais. Dela depende uma significativa parte da continuidade da docência e do seu êxito. E os professores experientes podem ser um significativo apoio a esses programas. Ambos aprenderiam, com resultados significativos para a qualidade da educação escolarizada. No Brasil, essa cultura ainda não se instalou, mas o seu reconhecimento qualificaria o magistério, em todos os níveis.

Em relação à formação de professores, qual a situação do Brasil em comparação a outros países?

– Há diferenças importantes. Em alguns países, a formação está localizada em instituições específicas para tal, como os modelos francês, suíço e de outros países similares. Na Argentina, há os institutos de formação do professorado, que têm essa missão. A maior parte da formação docente não está na universidade. A vantagem dessa modalidade é ter a formação de professores como coração institucional, um projeto que articula todos os esforços para tal missão. Em países como o Brasil, lutou-se para que a formação dos professores fosse realizada em nível superior, sob o argumento de que a ambiência acadêmica, incluindo o valor da pesquisa, seria importante para os futuros docentes. Entretanto, mesmo que esse argumento tenha sustentação, encontramos uma realidade em que grande parte dos cursos de licenciaturas se realiza em faculdades isoladas, que por proteção legal não precisam incluir a pesquisa na sua funcionalidade. E mesmo quando esses cursos ocorrem na universidade, parece que assumem uma condição periférica na estrutura acadêmica de poder.

No bloco europeu, com o advento de Bolonha (Tratado de Bolonha, 1999), a formação assumiu dois ciclos. A profissionalização se dá no segundo, já com o título de mestrado. Se comparado esse modelo com a realidade brasileira, ele aparece em desvantagem, pois pode haver um aligeiramento no processo formativo. Aqui, o mestrado ainda representa uma etapa exigente no que se refere à pesquisa e à apropriação teórica. Mas é certo que poucos docentes da educação básica têm chances de cursá-lo e, quando o fazem, geralmente, deixam esse nível de ensino, dadas as condições salariais. Do ponto de vista teórico, creio que precisamos reforçar o conhecimento do professor, inclusive a parte técnica, ainda que se reconheça que para a docência existem outros tantos saberes importantes. Nesse sentido, o exemplo de outros países poderia ser uma inspiração.

Quando procuramos um médico ou um jardineiro, os saberes técnicos orientam nossa escolha, ainda que saibamos que sua expertise não se reduz a eles. Portanto, não há de se temer assumir que o professor, na sua profissionalização, precisa de saberes técnicos e compreendê-los num contexto ético e político.

Como surgiu o interesse pela carreira acadêmica, tanto pelo ensino quanto pela pesquisa? Quando percebeu que tinha a vocação?

– Faço parte de uma geração em que o magistério era uma opção natural para as mulheres da classe média. Minha mãe era professora; tias e primas, também. A profissão era valorizada e havia a ideia de que se podia compatibilizá-la com as responsabilidades familiares. Portanto, não questionei muito essa escolha. Mas confesso que ela não me desagradava, pois sempre me encontrei nas ciências humanas e percebia que gostava de trabalhar com gente. Em 2015, farei 50 anos de magistério. Boa parte deles cumpri na educação superior e na educação profissional, mas comecei na escola básica e muito aprendi em cada uma dessas etapas da minha trajetória. Mesmo considerando que as oportunidades que tive não podem ser generalizadas para outras pessoas, ouso dizer que fui muito feliz na escolha e não a trocaria por outra profissão. Entre as grandes satisfações que reconheço na docência está um sentimento de crer ter sido importante para algumas pessoas, que tiveram sentido e significado muitas das ações que protagonizei ou de que participei. Ter sido útil parece dar sentido a nossa vida. E o magistério faz parte das profissões que, trabalhando com gente, encontram nas relações humanas construídas seu maior patrimônio. Entretanto, essa condição dificilmente se mede nos testes padronizados, nem pela métrica do currículo Lattes. Trata-se de um sentimento subjetivo, mais fácil de ser entendido por quem é professor.

O que diria aos jovens professores?

– Permaneçam na profissão se encontrarem sentido na mesma. Senão, devem procurar alternativas. Os estudantes merecem professores que encontram sentido no seu fazer. Estudem muito, articulem ações coletivas, construam comunidades de aprendizagem que favoreçam o empoderamento profissional. Usem a autonomia com responsabilidade. Sintam-se parte de uma classe profissional na qual o fracasso de um atinge a todos. Portanto, é fundamental a solidariedade e o compromisso comum. A luta por melhores condições de trabalho é crucial. Mas ela será conquistada se contar com a capacidade profissional e com a autoestima dos professores.

Ainda que nem sempre apareça, há muita coisa boa feita nas escolas do Brasil. Isso não significa deixar de reconhecer os grandes problemas ainda a ser enfrentados. Mas nenhuma medida terá sucesso sem o envolvimento dos professores. Por isso, sintam orgulho da profissão. Ela é da maior importância. E deve ser da melhor qualidade. (Republicada, com acréscimos, em 29.10.2014)