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JORNAL

Superdotação

Sexta-feira, 28 de Novembro de 2014

Edição 107

EDITORIAL - Superdotação

Superdotação é o tema da 107ª edição do Jornal do Professor. E selecionamos para vocês, experiências desenvolvidas em Núcleos de Atividades de Altas Habilidades–Superdotação (Naah-s) do Acre, Espírito Santo, Santa Catarina e Distrito Federal.

Nossa entrevistada é a presidente do Conselho Brasileiro para Superdotação (Conbrasd), Susana Graciela Pérez Barrera Pérez. A participante da seção Espaço do Professor é a professora Maria da Conceição de Oliveira, da Escola Família Agrícola Santa Ângela, em Pedro II (PI).

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Desafio de trabalhar com talentos motiva professoras catarinenses

Alunos particpam de oficina de robótica

A oportunidade de aprender coisas novas, todos os dias, é a maior motivação da pedagoga Sandra Duarte Hottersbach em seu trabalho no Núcleo de Atividades de Altas Habilidades–Superdotação (Naah-s) de Santa Catarina, em São José, município da região metropolitana de Florianópolis. “Aqui, um dia nunca é igual ao outro; sempre tem um aprendizado novo, um desafio, uma conquista”, afirma. “Isso é o que me motiva a vir todos os dias trabalhar.”

Com especialização em psicopedagogia institucional e clínica, Sandra atua na área de educação especial há 16 anos. Desde 2011, atua no Naah-s. Em seu trabalho, ela orienta professores, alunos e famílias, visita escolas e faz palestras com esclarecimentos sobre o processo de identificação de alunos com indicadores de altas habilidades–superdotação.

Para a professora Ananda Ludwig Burin, responsável pela oficina de lógica e matemática, a principal motivação é o desafio diário de trabalhar com superdotados. A maior satisfação é verificar o desenvolvimento das habilidades dos alunos. Com graduação em matemática e especialização em educação especial, ela ingressou no magistério em 2008. Desde 2012, trabalha no Naah-s.

Encarregada da oficina de robótica educacional, Sirlei Ignácio diz que o trabalho com estudantes superdotados, que realiza desde 2010, é “apaixonante”. Segunda ela, os alunos são interessados, pesquisam e participam de debates. Com graduação em pedagogia e em educação especial, ela trabalha na área há mais de 20 anos.

Dividir o que sabe com os alunos é o que motiva a professora de língua portuguesa Mara da Rosa Siqueira, responsável pela oficina de leitura e produção textual. A motivação é maior quando observa modificações nos alunos, seja no âmbito intelectual, relativamente à aquisição de conhecimentos da língua portuguesa, seja no comportamental, ao reparar evolução na conduta e nas relações interpessoais e sociais.

Há nove anos no magistério, Mara trabalha no Naah-s desde 2012, após aprovação em concurso público. Ela tem graduação em letras e especialização em mídias na educação. É aluna do Programa de Mestrado Profissional em Letras (Profletras) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

Oficinas — Mais de 500 estudantes foram atendidos pelo Naah-s catarinense desde o início do funcionamento, em 2006. “Nosso número de alunos varia de 40 a 70, com média de 55 alunos atendidos regularmente”, diz a coordenadora do núcleo, Andréia Alves Panchiniak. O atendimento ocorre de manhã e à tarde, no período do contraturno das aulas.

O Naah-s também oferece a oficina de múltiplas linguagens artísticas e a oficina exploratória, criada para desenvolver o potencial dos alunos das séries iniciais que ainda não têm definida uma área de destaque ou de interesse.

Psicóloga da Fundação Catarinense de Educação Especial (FCEE) desde 2004 e pedagoga com pós-graduação na área da infância, Andréia defende a realização de campanhas de sensibilização e incentivo à estruturação de serviços para que efetivamente os alunos superdotados tenham assegurados seus direitos em todas as regiões do país. (Fátima Schenini)

Mais informações na página da FCEE na internet e no blogue do Naah-s de Santa Catarina.

 

Parcerias ajudam a desenvolver talentos de estudantes no Acre

Alunos participam de oficina de desenho e pintura

Mais de 300 alunos foram atendidos até agora pelo Núcleo de Atividades de Altas Habilidades–Superdotação (Naah-s) do Acre desde o início efetivo das atividades, em 2007. O atendimento, no período do contraturno, é feito nas salas de recursos multifuncionais das próprias escolas em que os estudantes superdotados estão matriculados. Os encontros, quinzenais, ocorrem por período de seis meses a um ano, mas podem ser estendidos.

“Buscamos atender ao máximo as necessidades dos alunos que frequentam as salas de recursos, visando a um maior desenvolvimento de suas habilidades”, diz a coordenadora-geral do Naah-s, Brenda Nádyla Souza. Segundo ela, umas das preocupações do núcleo é a inserção dos estudantes identificados como talentosos em atividades como cursos e estágios. Nesse sentido, são mantidas parcerias com universidades, institutos federais de educação, ciência e tecnologia, instituições do Sistema S e escolas de música e de idiomas.

Brenda explica que o mapeamento das instituições que podem prestar auxílio no desenvolvimento das habilidades demonstradas por esses alunos é feito por profissionais do Naah-s. Munidos de registros que mostram os talentos de cada estudante, os profissionais visitam as instituições para tentar obter a inserção dos alunos em alguma atividade.

De acordo com Brenda, o Naah-s promove cursos, oficinas e palestras para que os professores, tanto da rede regular de ensino quanto das salas de recursos multifuncionais, possam reconhecer a presença de altas habilidades–superdotação nos alunos. O Naah-s também procura conscientizar os pais durante visitas domiciliares feitas no decorrer do ano.

Outra iniciativa do Naah-s do Acre é a realização de projetos em diferentes escolas para incentivar os alunos a frequentar as salas de recursos multifuncionais. “Já fizemos projetos com artes, com jogos como xadrez, literários, com publicação de livros, e até com confecção de roupas”, salienta a coordenadora. Um exemplo é o trabalho Desenhando o Futuro, desenvolvido pelo professor Marco Melo, este ano, para alunos com altas habilidades na área de artes de várias escolas.

Os estudantes participaram de oficinas com a técnica lápis sobre papel, durante seis meses, e apresentaram as obras em exposição realizada na Escola de Ensino Médio Lourival Pinho, em 18 de novembro último.

Identificado como portador de altas habilidades quando estava no terceiro ano do ensino médio da Escola Lourival Sombra Pereira Lima, em 2007, Marco Melo foi convidado a atuar como monitor dos estudantes atendidos na área de artes plásticas — ao completar 18 anos, ultrapassara a idade máxima permitida para continuar a receber atendimento no núcleo. O trabalho, em princípio informal, tornou-se oficial no ano seguinte, quando então Melo criou seu primeiro projeto, na área da pintura, o Jovens Talentos no Mundo das Artes. Reformulado em 2009, o trabalho passou a se chamar Jovens Talentos no Mundo das Artes na Escola.

Graduado em letras, Melo também atua como professor de língua inglesa em um centro de idiomas. (Fátima Schenini)

Saiba mais no blogue do Naah-s do Acre

Trabalho com superdotação conquista pedagogas no ES

Alunos participam de oficina de artes

Com experiência de quase 40 anos no magistério capixaba, a pedagoga Maria da Penha Benevides França Silva continua a fazer o trabalho de atender, orientar e encaminhar familiares de crianças e jovens superdotados, bem como professores e membros da comunidade em geral. Apaixonada pela temática, Penha trabalha no Núcleo de Atividades de Altas Habilidades–Superdotação (Naah-s) do Espírito Santo, em Vitória.

“Adoro participar do cotidiano dos trabalhos desenvolvidos em prol desses alunos”, ressalta. Ela trabalha na área desde 1991, quando foi convidada a participar de grupo empenhado na criação da seccional ES da Associação Brasileira para Superdotados, atual Associação Brasileira para Altas Habilidades–Superdotação (Abahsd). “Após a criação, comecei a me envolver e a me apaixonar pela temática, e realizamos o curso Ferramentas para Pensar”, revela Penha. A partir daí, formou-se um grupo de estudos, que começou a ser procurado por famílias em busca de orientação. Em 1995, surgiu o Projeto de Atendimento ao Aluno Talentoso (Paat), que se expandiu para cidades do interior.

Penha trabalha no Naah-s desde a implantação, em novembro de 2005. “Minha maior satisfação é perceber que o Naah-s está propiciando aos alunos atendimento na área de seu interesse”, salienta a pedagoga, que tem especialização em educação especial. Outro motivo de contentamento é poder transmitir aos professores, durante palestras ou cursos de formação, o compromisso e a satisfação de trabalhar com superdotação.

Esse sentimento é compartilhado por Carly Cruz. Pedagoga, com mestrado e doutorado em educação e especialização em educação especial, Carly está no magistério há 33 anos. Ela revela que o interesse pela área foi despertado ao atender, entre 1996 e 1998, um estudante que tinha, como indicação preliminar, deficiência intelectual. “O aluno me surpreendia, a cada atendimento, com suas colocações, pela capacidade abstrata e por ter começado a ler aos dois anos e meio”, recorda. “Para entender quem era de fato esse aluno, comecei a estudar sobre as altas habilidades–superdotação.”

Em funcionamento na Escola Estadual Desembargador Carlos Xavier Paes Barreto, em Vitória, o Naah-s conta com três pedagogos especialistas na área e dois professores, que desenvolvem oficinas de artes e robótica educacional. Atualmente, são atendidos 130 alunos. A média de atendimento em todo o estado é de 668 alunos, distribuídos em 13 municípios e em 44 escolas estaduais.

O núcleo mantém parceria com órgãos e instituições como a Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e a Universidade de Vila Velha (UVV). (Fátima Schenini)

Saiba mais na página da Abahsd na internet e no blogue do Naah–s do ES

Atendimento especializado ajuda a elevar autoestima de alunos no DF

Alunos na sala de recursos do Celan

A maior satisfação da professora Leila Branco, que atua há dez anos no atendimento educacional especializado a alunos com altas habilidades–superdotação, é ver o desenvolvimento da autoestima dos estudantes. “O aluno com altas habilidades é um estudante ‘invisível’ ou ‘rotulado’ no contexto escolar, muitas vezes incompreendido”, destaca. “Quando ele participa do atendimento e encontra outros alunos que têm paixão por aprender assuntos incomuns ou motivação intrínseca para realizar projetos sente-se feliz.”

Há 23 anos no magistério público do Distrito Federal, Leila trabalhou como professora de história e de sociologia no ensino médio em escolas das regiões administrativas de Ceilândia, Guará e Taguatinga. Foi também coordenadora pedagógica do ensino médio e do ensino especial.

Ao descobrir que a Secretaria de Educação do Distrito Federal oferecia, desde 1975, um serviço educacional a alunos com superdotação, ela se identificou com a metodologia adotada e viu ali uma oportunidade desafiadora de trabalhar com alunos de alto potencial. “Fiquei curiosa e fascinada pelo referencial teórico adotado, do educador norte-americano Joseph Renzulli”, recorda.

No Centro de Ensino Fundamental 1 do Lago Norte, onde trabalha, Leila atua na sala de recursos para altas habilidades, que atende estudantes da própria escola e também de outras instituições. O trabalho é realizado uma vez por semana, com oito alunos por turno, no período contrário ao das aulas normais. “Tive alunos que escreveram livros de ficção, de até 350 páginas, e de poesia. Outros criaram jogos. Um deles descobriu novo padrão matemático”, revela a professora. “Meu trabalho é de tutoria, e busco suporte e parceria com a Universidade de Brasília (UnB) ou de especialistas quando o trabalho supera as expectativas ou requer um conhecimento de que não disponho.”

No caso do padrão matemático, por exemplo, Leila diz que foi auxiliada pela professora doutora Aida Fadel, coordenadora do Projeto Precoce da Faculdade de Tecnologia da UnB.

Segundo Leila, os alunos podem ser indicados por professores, pela família ou procurar, eles mesmos, o atendimento, caso se identifiquem com o perfil de altas habilidades. Em todos os casos, devem passar por um período de observação, no qual vão desenvolver atividades exploratórias de conhecimento, de instrumentalização e de projetos para resolução de problemas vinculados a áreas de interesse, tais como astronomia, botânica, literatura e sustentabilidade.

De acordo com dados do primeiro semestre deste ano, mais de 1,5 mil estudantes foram atendidos por professores do Núcleo de Altas Habilidades–Superdotação (Naah-s), que atuam em 19 unidades escolares. O atendimento é feito de forma centralizada nas diversas coordenações regionais de ensino. “No Distrito Federal, contamos com a participação importantíssima da Associação de Pais, Professores e Amigos dos Alunos com Altas Habilidades–Superdotação (Apahs-DF)”, salienta a chefe do Naahs na Secretaria de Educação, Viviane Calce de Moraes. “Acredito no trabalho de parceria da secretaria com a Apahs para o fortalecimento do atendimento e ampliação das conquistas.”

Viviane explica que o núcleo do Distrito Federal atende 70% dos estudantes da rede pública e 30% da rede particular, da educação infantil até a idade máxima de 18 anos. O atendimento é feito de acordo com a habilidade ou área de interesse do aluno, mas certos temas têm mais destaque em alguns locais. “É o caso de Sobradinho, com a robótica; Planaltina, com as artes cênicas; Gama, com a área acadêmica, e Plano Piloto, com as artes visuais, entre outros”, explica Viviane. Há 16 anos no magistério, ela tem graduação em pedagogia e especialização em psicopedagogia. (Fátima Schenini)

Escola do Piauí desenvolve projeto para reflorestar área do entorno

Plantio de muda

Professores e alunos das turmas do 6º ao 9º ano do ensino fundamental da Escola Família Agrícola Santa Ângela, no município de Pedro II, Piauí, participaram de atividades de plantio de mudas de candeias e moringas na área de entorno da instituição, no segundo semestre deste ano. Sementes de jatobá, sabiá, jurema, pau-d’arco, mucunã, faveira, leucena, manga e caju já foram selecionadas para um novo plantio, em continuidade às atividades de reflorestamento.

O empreendimento é uma das ações do projeto Problemas de Outrora, Sementes do Hoje, Frutos do Amanhã, apresentado pela escola na 4ª Conferência Nacional Infantojuvenil pelo Meio Ambiente, promovida pelos Ministérios da Educação e do Meio Ambiente, em 2013, no município goiano de Luziânia. Segundo a professora Maria da Conceição de Oliveira, o projeto pretende criar uma área com plantas nativas e frutíferas e um viveiro para reflorestar o entorno da escola.

A ideia foi bem aceita, tanto pela comunidade escolar quanto pelas famílias. “Por meio dessas famílias, o projeto está sendo desenvolvido nas comunidades”, explica a professora.

Além do plantio de mudas, o projeto incluiu palestras, visitas de alunos a locais como o lixão do município e ao Açude Joana, responsável pelo abastecimento de água da localidade. Outras atividades foram a realização de minicursos teóricos e práticos e mostras em salas temáticas sobre a importância de manter a pureza do ar.

Graduada em letras, com pós-graduação em língua portuguesa e literatura, Maria da Conceição é professora de português. Ela participa do programa Mais Educação como facilitadora da oficina de orientação, estudo e leitura. (Fátima Schenini)

Susana Graciela Pérez Barrera Pérez: “Identificação precoce dos alunos com AH-SD permite o atendimento de qualidade”

Susana Graciela Barrera Pérez

A presidente do Conselho Brasileiro para Superdotação (Conbrasd), Susana Graciela Pérez Barrera Pérez, diz que a identificação precoce dos alunos com altas habilidades–superdotação (AH-SD) permite o atendimento de qualidade, que exige conhecimento e atitude e deve garantir o desenvolvimento do potencial e das habilidades específicas.

Doutora em educação, pesquisadora e docente com experiência na formação de professores em cursos de extensão e pós-graduação, Susana acredita que o trabalho feito com alunos que apresentam AH-SD deve ser pautado em suas áreas de interesse para haver comprometimento com a tarefa e criatividade. “O objetivo é que eles possam alcançar autonomia para a busca do conhecimento socialmente elaborado e a construção do seu próprio conhecimento”, diz.

Consultora da Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco) para a então Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação, no período de 2007 a 2011, e delegada do Brasil na Federación Iberoamericana del World Council for Gifted and Talented Children (Ficomundyt), ela defende a necessidade de formação especializada de pediatras, psicólogos, psicopedagogos e professores para o atendimento a alunos com superdotação.

Jornal do ProfessorQuais as principais características de uma pessoa com altas habilidades–superdotação? Como fazer esse reconhecimento? As altas habilidades manifestam-se em quais áreas?

Susana Pérez — As pessoas com altas habilidades–superdotação apresentam três grandes conjuntos de traços — habilidade acima da média, criatividade e comprometimento com a tarefa relacionada à área na qual ela apresenta habilidade acima da média, não com a tarefa da escola. Elas mostram desempenho e potencial elevados em áreas gerais ou específicas relacionadas às inteligências (lógico-matemática, espacial, naturalista, musical, linguística, intrapessoal, interpessoal ou corporal-cinestésica). São pessoas muito curiosas, com interesses complexos e diversos, com um senso de humor muito sofisticado. Muitas vezes, não gostam da rotina e se distraem na sala de aula se não forem suficientemente desafiadas. São perfeccionistas, gostam de ler muito e costumam aprender a ler e a escrever antes de ingressar na escola. É importante destacar que o termo correto é altas habilidades–superdotação, não altas habilidades ou superdotação, visto que é a mesma coisa. O trabalho A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva e documentos anteriores usam essa terminologia, cunhada pelo Conbrasd em sua fundação, em 2003. A identificação dos indicadores de AH–SD pode ser feita por professores ou por profissionais com conhecimentos sobre o assunto ou supervisionados por especialistas. Esse potencial elevado pode se expressar em qualquer área do conhecimento e do desenvolvimento humanos.

Qual a importância de se detectar a existência de alunos com altas habilidades–superdotação nas escolas? Que encaminhamento deve ser feito por professores e escolas?

— Identificar e desenvolver potenciais é um dever da escola, pois é um direito do aluno ter suas necessidades educacionais especiais identificadas e atendidas. Assim, a identificação precoce dos alunos com AH-SD permite o atendimento de qualidade, que exige conhecimento e atitude e deve garantir o desenvolvimento do potencial e das habilidades específicas. O contexto acadêmico deve, também, favorecer a socialização dos superdotados com seus colegas e assim buscar um desenvolvimento integral desses alunos. O estudante com AH-SD deveria ser identificado e atendido pelo professor do atendimento educacional especializado, na sala de recursos multifuncionais. É isso que está previsto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) [Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996], na Resolução nº 4/2010 e no Parecer nº 13/2009 do Conselho Nacional de Educação, no Decreto nº 7.611, de 17 de novembro de 2011 e na Lei nº 13.005, 25 de junho de 2014 [Plano Nacional de Educação]. Infelizmente, são pouquíssimos os professores ou profissionais formados para isso. Os cursos de atendimento educacional especializado geralmente oferecem um número insuficiente de horas dedicado a esse conteúdo, o que não permite qualificar os professores para o processo de identificação e atendimento. Como resultado, temos menos de 12 mil alunos registrados no Censo Escolar e uma política pública precária, sem apoio financeiro que a sustente.

Que tipo de trabalho deve ser feito com esses alunos, com quais objetivos? Há uma idade mínima para dar início a esse trabalho?

— O trabalho feito com alunos com AH-SD deve ser pautado em suas áreas de interesse para que possa haver comprometimento com a tarefa e a criatividade. O objetivo é que eles possam alcançar autonomia para a busca do conhecimento socialmente elaborado e a construção do próprio conhecimento. Isso deve ser feito de forma integral e inclusiva, visando à expressão livre de potencialidades e criatividade. Para isso, o processo de ensino-aprendizagem deve seguir um curso atraente e desafiador. Ele pode acontecer já na educação infantil. Também devem ser trabalhadas eventuais dificuldades ou áreas com desenvolvimento prejudicado. Esse atendimento educacional visa a atender as necessidades educacionais especiais, conforme previsto no documento Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, e deve ocorrer, como o mesmo documento orienta, “desde a educação infantil até a educação superior”.

Como preparar os professores para trabalhar com alunos superdotados, de forma a estimulá-los a desenvolver as potencialidades?

— Aos professores deve ser oferecida capacitação sobre as altas habilidades–superdotação para que os mitos que envolvem a área sejam substituídos por conhecimentos pertinentes e científicos. Seria um avanço, nesse quesito de capacitação, a educação superior, nos cursos de graduação, oferecer na grade uma disciplina sobre o tema, assim como formação específica para o atendimento educacional. Profissionais da área da saúde (pediatras, psicólogos), psicopedagogos e professores de todas as disciplinas deveriam receber formação para o atendimento a esses estudantes. Além disso, deveria haver formação continuada dos professores por parte das secretarias estaduais e municipais de educação e pelo próprio Ministério da Educação. Nos cursos de atendimento educacional especializado oferecidos pelo MEC, nos programas de formação de educação na diversidade e nos cursos privados há uma carga horária muito maior destinada às áreas de deficiência. Em números, os estudantes com AH-SD são a metade daqueles com deficiências. Além disso, a identificação e o atendimento aos estudantes com AH-SD é mais complexa.

Alunos com altas habilidades também são vítimas de bullying e de preconceito?

— Com certeza, muitos passam por essa experiência. Isso ocorre porque esses alunos apresentam interesses em assuntos que não são muito comuns para a idade. O pensamento divergente causa estranheza aos colegas e até mesmo aos professores. Esses estudantes também são muito sensíveis a temas sociais que se distanciem dos abordados pelo currículo escolar. Como a escola e a sociedade ainda estão despreparadas para lidar com as diferenças, o bullying tem sido frequentemente denunciado por esses alunos e seus familiares. O bullying chega a ser tão forte que, em alguns casos, os alunos com AH-SD escondem o desempenho para não ser identificados.

Qual sua opinião sobre os núcleos de atividades de altas habilidades–superdotação (Naahs) criados pelo MEC?

— Como instrumento de implementação da política educacional para esses alunos, são boas iniciativas, que deveriam ter mais apoio e cuidados em todos os sentidos. Deveriam existir no país 27 desses núcleos. Mas no 2º Encontro Nacional dos Naahs, de 11 a 13 de novembro último, em Foz do Iguaçu (PR), com o apoio do Conbrasd, não mais de 20 representantes, entre coordenadores ou participantes, estiveram presentes. Isso, apesar de o MEC ter enviado passagens e subvencionado um representante de cada núcleo. Sabemos que em muitos estados esses núcleos foram extintos ou não estão funcionando. Isso é realmente preocupante porque nesses estados não há nenhum atendimento a nossos alunos. Em outros, os Naahs funcionam acoplados a serviços de atendimento a alunos com deficiência, sem profissionais qualificados. Em outros, ainda, o atendimento é feito por profissionais sem a necessária qualificação.

Outra dificuldade é a localização dos núcleos nas capitais e, em duas delas, Belo Horizonte e Recife, subordinados à secretaria municipal de educação. Isso limita a atuação. Em estados como Amazonas e Maranhão, por exemplo, é humanamente impossível oferecer orientação ou atendimento no interior, o que compromete a eficiência. Sabemos que a grande maioria dos Naahs tem sérias dificuldades, como falta de recursos econômicos, materiais e humanos. Não raramente, falta apoio das secretarias de educação estaduais. Essa realidade inviabiliza o aumento do número de alunos identificados, hoje insignificante frente aos mais de 2,5 milhões de estudantes com AH-SD que deveriam estar identificados e sendo atendidos, de acordo com as estimativas mais conservadoras.

Outra questão importante é que as escolas particulares não atendem alunos com AH-SD. Alegam que a LDB estabelece, como “dever do Estado”, oferecer esse atendimento. De outra parte, alguns Naahs deixam de atender alunos da rede particular, com base em orientações contraditórias dos órgãos aos quais estão subordinados e do próprio MEC. É um equívoco. Os alunos com AH-SD também são sujeitos de direito e devem ser atendidos. Mas esta é a realidade que vivemos.

Quais os principais resultados dos eventos realizados em Foz do Iguaçu, no 2º Congresso Internacional sobre Altas Habilidades–Superdotação, no 10º Congreso Internacional sobre Superdotación, Talento y Creatividad, e no 6º Encontro Nacional do Conbrasd?

— Os resultados foram positivos, em termos de aprimoramento teórico e prático. Esses eventos vêm se constituindo em fatores de máxima relevância no país e no exterior. Tivemos palestrantes e participantes de 12 países diferentes (Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador, Espanha, Irlanda, México, Peru, Portugal e Uruguai), que deram contribuições importantíssimas para a área, ao expor e compartilhar experiências. Certamente, todos saíram enriquecidos.

Durante o evento foi feita uma homenagem à professora Maria Helena Novaes Mira, pesquisadora pioneira da área, e criado o Prêmio Maria Helena Novaes, outorgado às comunicações orais que obtiveram nota 10 na avaliação dos membros da comissão técnico-científica dos eventos. Haverá continuidade nos próximos encontros nacionais do Conbrasd (EnCo). Também foi elaborada declaração, resultado das mesas sobre políticas públicas internacionais, que oferece recomendações para a melhoria do atendimento aos alunos com AH-SD. Ela será entregue aos ministérios de educação dos 12 países participantes.

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