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JORNAL

Inovação e Criatividade na Escola

Segunda-feira, 11 de Janeiro de 2016

Edição 121

EDITORIAL - Inovação e Criatividade na Escola

Para a 121ª edição do Jornal do Professor, que trata do tema Inovação e Criatividade na Escola, optamos por apresentar o trabalho desenvolvido em algumas das instituições selecionadas pela chamada pública realizada pelo Ministério da Educação, com o objetivo de identificar, reconhecer e mapear iniciativas educacionais inovadoras na educação básica realizadas em todo o país.

Assim, escolhemos quatro escolas entre as 178 instituições incluídas no Mapa da Inovação e Criatividade na Educação Básica: Escola Estadual Júlia Catunda e Escola Municipal José de Moura, dos municípios de Santa Quitéria e de Maranguape, ambos no Ceará; Escola Bilíngue Libras e Português Escrito, de Taguatinga (DF); Escola Básica Municipal Visconde de Taunay, de Blumenau (SC).

Nossa entrevistada é a assessora especial do MEC Helena Singer, coordenadora do grupo nacional criado para implementar o Programa de Estímulo à Criatividade na Educação Básica.

E a participante da seção Espaço do Professor é a professora Fernanda Fonseca, da Escola Municipal Professor Washington Manoel de Souza, de Queimados (RJ).

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Escola inova em metodologia de ensino bilíngue para surdos

Aluno utiliza linguagem de sinais na sala de aula

A inovação e a criatividade estão em toda a escola. Por salas de aula e corredores silenciosos flui o conhecimento que poucos ouvintes conseguem entender e apreender. Com gestos rápidos e uma infinidade de sinais que traduzem palavras, frases e conceitos, professores e alunos interagem e avançam nos conteúdos obrigatórios da educação básica. A Escola Bilíngue Libras e Português Escrito, em Taguatinga, uma das regiões administrativas mais populosas do Distrito Federal, é a única da rede pública do Brasil a criar metodologia adequada para crianças e adolescentes surdos que têm como língua materna a língua brasileira de sinais (libras).

Criada em 2013, por lei local, a escola nasce, portanto, sob um projeto político inovador e se revela inclusiva também no sentido reverso. “O que é bom para o aluno surdo é bom para o aluno ouvinte”, explica a diretora Maristela Batista de Oliveira Bento, pedagoga com 20 anos de experiência na educação de alunos surdos. Por isso, por escolha das famílias, nas salas de aulas há alunos ouvintes que aprendem a língua de sinais para se comunicarem com os irmãos e os amigos surdos. O bilinguismo na língua de sinais e português escrito configura-se, portanto, numa espécie de chave para aproximar sujeitos de dois mundos que não se integram por não dominarem os códigos da comunicação.

“As pessoas ouvintes geralmente não sabem, mas para os alunos surdos, o português é a sua segunda língua e isso implica uma metodologia apropriada para que possam ter maior fluência no entendimento da escrita”, explica Gisele Morisson Feltrini, supervisora pedagógica da escola bilíngue. Thalya da Silva, 18 anos, aluna do segundo ano do ensino médio, conta que a escola tem permitido a ela se aprofundar nos conhecimentos cobrados nas provas de seleção para ingresso nas universidades. Com talento para desenhar, Thalya pensa em seguir uma profissão nessa área. Porém, entender o conteúdo das provas é ainda um problema e, por isso, os alunos surdos precisam de intérprete na realização dos exames.

“O português é muito pesado e seria importante ter uma prova adequada, com tradução na íntegra para libras por meio de vídeos”, sugere a aluna, que ficou surda antes dos dois anos em decorrência de uma meningite. A dificuldade com a língua portuguesa ocorre também no contexto social e familiar, uma vez que são poucas as pessoas que dominam a língua de sinais. Em casa, por exemplo, Thalya não consegue se comunicar com o irmão, apenas com a mãe. Ela não é exceção. Outros alunos da escola relataram a mesma dificuldade.

Acesso — Luana de Jesus, 17 anos, aluna do primeiro ano do ensino médio, diz que quer estudar direito para lutar pelos direitos dos surdos. “Existe uma pressão da sociedade ouvinte sobre os surdos porque não sabem das suas habilidades e potencial. É preciso dar acesso aos ouvintes à cultura surda”, observa. Em razão de todas essas dificuldades, Hudson Gonçalves, 20 anos, aluno do segundo ano do ensino médio, fala da importância da escola bilíngue de Taguatinga. “Eu consigo não apenas aprender, como tirar minhas dúvidas e me aprofundar no conhecimento de biologia, química, física, português e matemática para ingressar num curso superior”, explica. “As traduções feitas pelos intérpretes em libras nas escolas onde estudei são rápidas demais. Não dá para absorver tudo.”

A diretora explica que, nas escolas regulares em que há inclusão, o aluno surdo muitas vezes sente-se isolado por estar numa turma de ouvintes. “Ele se sente intimidado em expressar dúvidas e acaba acumulando defasagem de aprendizagem”, comenta.

A professora de biologia Thatiane do Prado, que prepara os alunos surdos para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e o Programa de Avaliação Seriada (PAS) da Universidade de Brasília (UnB), salienta que a metodologia adotada pela escola possibilita um aprendizado mais ativo. “Os alunos são sujeitos ativos no processo do conhecimento, opinam o tempo todo e não ficam apáticos”, afirma.

A escola bilíngue atende alunos da educação infantil ao ensino médio, com limite de dez alunos por turma, em razão da especificidade do ensino. O sistema bilíngue adotado pela escola atrai estudantes de outras regiões do Distrito Federal e Entorno. “A primeira língua da escola é a libras, mas o português escrito não é ensinado da mesma forma que os alunos ouvintes aprendem”, diz a diretora. “Usamos muito o visual para que eles possam adquirir vocabulário. Os surdos precisam muito do visual para interiorizar o conteúdo.”

Chamada — A Escola Bilíngue Libras e Português Escrito foi uma das 178 instituições de ensino selecionadas pela chamada pública aberta pelo Ministério da Educação, em 2015, para divulgar experiências de inovação e criatividade nas escolas de educação básica no Brasil.

Para participar da chamada, a direção decidiu enviar o projeto político-pedagógico da própria escola, que já nasceu dentro de uma proposta de inovação na gestão e na metodologia de ensino. O objetivo é divulgar e mostrar os resultados positivos e emocionantes que os 53 professores surdos e ouvintes, com proficiência em libras, têm alcançado. “Se não fosse essa escola, muitos alunos surdos já teriam se evadido e desistido de avançar nos estudos, simplesmente porque não conseguem ser entendidos”, ressalta Maristela.

Com a metodologia empregada pela escola, as crianças matriculadas adquirem fluência em libras e português escrito e, assim, podem ser entendidas dentro e fora dos limites do contexto escolar.

Filha de pais surdos, a professora da educação infantil Andréa Beatriz Messias Belém Moreira conta que conviveu em meio a ouvintes e surdos, habitantes de dois mundos que têm dificuldades em se comunicar e se compreender. “Numa sociedade em que a maioria das pessoas é de ouvintes, os surdos têm muito a nos ensinar”, afirma. “Eles são sempre considerados inferiores, mas não têm dificuldade para aprender, só não encontram facilidades para desenvolver suas habilidades.”

A professora relata que desde cedo teve de aprender a superar o sofrimento pessoal por sentir a rejeição e o preconceito de professores que não chamavam seus pais na escola para saber do seu desempenho em sala de aula. “Ouvia-os dizer que meus pais eram aqueles mudinhos, mas eu não aceitava isso, e dizia que eles falavam, sim, e que eu os entendia muito bem porque sabia a língua deles.”

Libras — A língua brasileira de sinais foi instituída pela Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, e reconhecida como sistema linguístico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical própria, para a transmissão de ideias e fatos. É a língua natural usada pelas comunidades surdas brasileiras. Estudos sobre a libras foram iniciados no Brasil em 1981.

Libras e português carregam estruturas diferenciadas. Documento publicado pelo Programa Nacional de Apoio à Educação de Surdos do Ministério da Educação, em 2004, sobre a língua brasileira de sinais e a língua portuguesa evidencia que, como em qualquer língua falada, “a fonologia é organizada baseada em um número restringido de sons que podem ser combinados em sucessões para formar uma unidade maior, ou seja, a palavra. Nas línguas de sinais, as configurações de mãos, juntamente com as localizações em que os sinais são produzidos, os movimentos e as direções, são as unidades menores que formam as palavras”. (Rovênia Amorim)

Escolas adotam práticas educativas e alunos têm melhor rendimento

Duas alunas apresentam projeto sobre literatura de cordel

Duas escolas públicas no interior do Ceará são exemplos de como a criatividade dos projetos educativos e a reorganização curricular podem contribuir para melhorar o convívio e o desempenho escolar. Em Santa Quitéria, município de 48 mil habitantes, a Escola Estadual Júlia Catunda adota a concepção de educação integral em projetos com diferentes temáticas e reserva mais tempo de aula para as disciplinas. A 200 quilômetros dali, a Escola Municipal José de Moura, na zona rural de Maranguape, também exibe inovação na forma de ensino e colhe, desde 2011, resultados positivos no aprendizado escolar.

Há dois anos, segundo a diretora da escola de Santa Quitéria, Francisca Edna Camelo Torres, a instituição deixou de usar a fragmentação do conteúdo tradicional em disciplinas diferentes a cada dia. Com o sistema adotado agora, os 575 alunos do ensino médio e das turmas de educação de jovens e adultos são imersos, a cada 15 dias, no conteúdo de determinada área de conhecimento. “Essa forma de organizar o currículo permite diversificar e aprofundar o conteúdo; rende mais”, afirma a diretora.

George Muniz, professor de matemática, diz o mesmo. “Esse sistema exige do professor mais planejamento das aulas para que não fiquem cansativas, mas a vantagem é que temos mais tempo para trabalhar com o aluno, tirar as dúvidas e consolidar o aprendizado”, explica. O resultado dessa nova sistemática tem se mostrado satisfatório no desempenho disciplinar e escolar, com reflexo nas médias, mais altas, no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Dados da escola mostram ainda que a taxa de aprovação passou de 84,8% em 2008 para 92,7% em 2014. A taxa de abandono caiu para a metade nesse mesmo período, de 12,7% para 6,4%.

Entrosamento — A melhoria no desempenho dos alunos é creditada à dinâmica dos novos projetos pedagógicos. A cada mês, de fevereiro a dezembro, um tema com abordagem social, de sustentabilidade ambiental e de respeitos às diversidades culturais, sexuais e religiosas é trabalhado pelos alunos e apresentado em eventos abertos à comunidade. “Trabalhamos o aluno integralmente, e esse projeto referenda essa visão”, destaca Francisca. Pesquisa realizada pela própria escola mostra que 96% aprovam os projetos temáticos.

Francisco Jardson Pinto Rodrigues, professor de história, diz que o tempo concentrado para as disciplinas e os projetos pedagógicos desenvolvidos na escola facilitam a interatividade entre os alunos. “A partir desse maior entrosamento, conseguimos trabalhar conteúdos interdisciplinares, o que tem levado os alunos a se tornarem mais críticos e reflexivos”, observa.

Comunidade — A Escola Municipal José de Moura, no distrito de Cachoeira, a 25 quilômetros de Maranguape, desenvolve a educação integral em iniciativa que envolve os moradores da comunidade, de 300 famílias. O projeto da comunidade educadora, iniciado em 2011, reúne 250 crianças e jovens matriculados na escola, da educação infantil ao nono ano do ensino fundamental.

Na nova visão adotada pela instituição de ensino, todas as pessoas do convívio dos alunos são vistas como professores fora da sala de aula. “Cada um tem algo a ensinar”, explica a diretora, Sandra Regina Freitas Lima. Em visitas a hortas, por exemplo, o agricultor vira professor ao passar seus conhecimentos. “E assim também o idoso conta histórias e seus saberes, o motorista do transporte escolar, a merendeira, a família e tantos outros”, diz Sandra Regina.

Cerca de 30 pessoas da comunidade participam das atividades da escola. De acordo com a diretora, os alunos, com essa prática educativa, acabam por receber uma formação humanística. “Eles aprendem a ouvir, a respeitar o meio ambiente e o outro”, diz. “Essa é a nossa concepção de educação integral: a criança e o jovem estão em formação não apenas na escola, mas na rua, em casa e na comunidade.”

Outro projeto inovador da escola é a criação de 12 turmas interativas, com os alunos do sexto ao nono ano, para pesquisas em grupo. Cada turma tem dez alunos. Todos os meses, um tema diferente deve ser pesquisado. “Esse projeto complementa o conteúdo e aproxima alunos de diferentes turmas, melhorando o convívio em toda a escola porque todos passam a se conhecer”, diz a diretora.

Os professores entram em cena e dão suporte ao trabalho de pesquisa, com orientações aos alunos. “Essas turmas interativas funcionam bem e são bem produtivas porque vemos mais de perto a necessidade de cada aluno”, afirma a professora de matemática Maria Dejane Costa da Rocha. “Como eles estão engajados no projeto, ninguém fica disperso.”

Maria Dejane salienta que a preocupação dessa nova prática educativa não é exclusivamente o conteúdo, mas o desenvolvimento integral do aluno. Os resultados, segundo ela, aparecem na maior autonomia dos estudantes nos estudos, na capacidade de produção de textos e na oralidade. (Rovênia Amorim)

Escola catarinense é reconhecida por iniciativas de sustentabilidade

Alunos na horta mandala

No município catarinense de Blumenau, a 130 quilômetros de Florianópolis, uma instituição tem se destacado pela criatividade na realização de ações de sustentabilidade. É a Escola Básica Municipal Visconde de Taunay, que atende alunos da educação infantil ao nono ano do ensino fundamental.

Tudo começou quando a diretora, Roseli de Andrade, conheceu uma experiência de fazenda sustentável no Instituto de Permacultura e Ecovilas do Cerrado (Ipec), no município goiano de Pirenópolis. Interessada em desenvolver um projeto de escola sustentável, ela compartilhou o que viu com a equipe de professores. A partir de nova visita dos educadores ao Ipec, algumas ideias passaram a ser postas em prática, com a criação coletiva do projeto Escola Sustentável, fundamentado no plano político-pedagógico da escola.

Roseli explica que vários espaços foram então criados por professores e alunos. Ela cita como exemplos a horta mandala, a espiral de ervas, o jardim biodiverso, a composteira, a revitalização do pátio de britas, com o plantio de árvores frutíferas, o isolamento térmico de uma sala de aula, com o uso de embalagens vazias de caixas de leite, e a construção da casamática, uma casinha feita com garrafas plásticas.

Para a diretora, as iniciativas provocaram mudanças positivas, tanto na escola quanto na comunidade. “A redução da quantidade de lixo no pátio da escola e nas salas de aula foi surpreendente”, afirma. “O reaproveitamento de materiais passou a fazer parte da rotina escolar.”

De acordo com Roseli, pesquisa realizada em 2015 comprovou que as famílias de 84% dos alunos do terceiro ano do ensino fundamental, que estavam na pré-escola em 2012, quando teve o início o projeto Escola Sustentável, passaram a ter horta em casa. “Tanto os alunos quanto seus familiares aprenderam o real significado de sustentabilidade”, avalia.

Mutirão — Encarregada da articulação do projeto Escola Sustentável entre estudantes, professores e comunidade, a professora Jeane Pitz Pukall diz que procurou, desde o início, envolver a todos no processo de mudanças. “Todos os espaços sustentáveis foram construídos em sistema de mutirão, com professores, estudantes e comunidade trabalhando juntos”, revela. Segundo ela, o projeto teve ótima aceitação por parte de todos, e a escola passou a ser referência em sustentabilidade e criatividade. “Os estudantes passaram a levar para casa as experiências vividas na escola e a incentivar seus pais a tomarem atitudes sustentáveis”, diz Jeane.

Com a divulgação dos trabalhos desenvolvidos na escola, os estudantes sentiram-se mais valorizados. “Houve um empoderamento com relação à escola”, diz a professora. “Hoje, os estudantes falam ‘a nossa horta’, ‘o nosso jardim’ e se preocupam que tudo esteja sempre lindo, limpo e bem cuidado.”

Professora da rede municipal de Blumenau há 26 anos, 16 deles na Escola Visconde de Taunay, Jeane é pedagoga, com habilitação em orientação educacional, especialização em psicopedagogia clínica e institucional e mestranda no Programa de Pós-Graduação em Ciências Naturais e Matemática da Fundação Universidade Regional de Blumenau. Sua pesquisa de mestrado aborda a formação continuada de professores, na escola, a partir de projetos criativos ecoformadores.

A Escola Visconde de Taunay é a primeira instituição de ensino de Blumenau a se tornar campo de pesquisa da Rede Internacional de Escolas Criativas (Riec). A pesquisa foi baseada em critérios do Instrumento de Avaliação do Desenvolvimento de Instituições Criativas (Vadecrie), criado pelo professor Saturnino de la Torre, da Universidade de Barcelona.

Em maio de 2013, a unidade de ensino recebeu o Certificado de Escola Criativa, pela riqueza e inovação de suas experiências. “A escola alcançou a média 8,5. Ou seja, 85 dos 100 critérios avaliados são cumpridos pela escola”, salienta a diretora.

Professora de ciências para os anos finais do ensino fundamental e de ciências agrícolas para o ensino médio, Roseli tem pós-graduação em gestão, supervisão e orientação educacional e inovação tecnológica. Ela está no magistério há 32 anos, 15 dos quais na função de diretora. (Fátima Schenini)

Saiba mais no blogue da EBM Visconde de Taunay

 

Brasil tem 178 instituições consideradas como exemplos

O Ministério da Educação selecionou 178 instituições entre as 683 que participaram, de setembro a novembro de 2015, de chamada pública destinada a identificar, reconhecer e mapear iniciativas educacionais inovadoras na educação básica desenvolvidas em escolas públicas e particulares e em organizações não governamentais de todo o país. A seleção abrangeu instituições escolares e não escolares, escolas indígenas, quilombolas, do campo e urbanas, da educação infantil, ensino fundamental, ensino médio e da educação de jovens e adultos.

A região com o maior percentual de selecionados foi a Sudeste, com 50,8%; a Norte, com o menor: 7,6%.

De acordo com a assessora especial do MEC Helena Singer, coordenadora do grupo nacional criado para implementar o Programa de Estímulo à Criatividade na Educação Básica, as instituições selecionadas fornecem uma abrangência muito boa de como está acontecendo a inovação em todas as regiões brasileiras. “Temos um mapa muito interessante, que dá para inspirar escolas e secretarias de educação nos mais diversos contextos de educação no Brasil”, salienta.

As informações relacionadas ao trabalho desenvolvido pelas 178 instituições selecionadas estão disponíveis no Mapa da Inovação e Criatividade na Educação Básica, publicado na internet. (Fátima Schenini)

Mais informações na página do Programa de Estímulo à Criatividade na Educação Básica na internet.

Educadora desenvolve projeto de controle do vetor da dengue

Estudantes participam de elaboração de cartaz

Há quatro anos no magistério, Fernanda da Fonseca e Silva é professora de ciências na Escola Municipal Professor Washington Manoel de Souza, em Queimados (RJ). Com licenciatura em ciências biológicas, bacharelado em biomedicina e mestrado em ciências pelo programa Biologia Celular e Molecular do Instituto Oswaldo Cruz, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), ela desenvolve pelo menos um projeto pedagógico por ano, aliando sempre educação e saúde.

Em 2015, Fernanda implantou o projeto Intervenção Educativa no Controle do Aedes aegypti em duas turmas do sexto ano do ensino fundamental. Segundo ela, um bimestre do sexto ano é dedicado à abordagem da temática Água e Vida. “Estabelecer relações entre a água e a saúde, de modo a compreender a importância de evitar a contaminação e o acúmulo da água na prevenção de doenças, é um dos principais objetivos desse bimestre”, explica.

Para contextualizar o assunto, Fernanda apresentou, inicialmente, gravuras em tamanho ampliado para os alunos reconhecerem o mosquito e obter informações sobre seu ciclo de vida, doenças que transmite, sintomas, tratamento básico e prevenção. O projeto foi desenvolvido durante três semanas. Naquele período, além de assistir a vídeos sobre a dengue, os alunos foram incentivados a fotografar prováveis focos de proliferação do mosquito na escola, em suas próprias residências, praças e outros locais por ele frequentados. Cada estudante apresentou as imagens obtidas aos demais.

Uma lista foi elaborada com indicações de checagem para o controle do vetor nas residências, com base na campanha 10 Minutos contra a Dengue, da Fiocruz. “A proposta de intervenção educativa enriqueceu o aprendizado (de forma lúdica) e despertou uma consciência social mais crítica e ativa nos alunos”, destaca Fernanda. “Eles se mostraram mais preocupados com a saúde da família e da comunidade.” (Fátima Schenini)

Helena Singer (MEC): “A escola pode inovar em todos os seus aspectos”

Helena Singer

As mudanças trazidas pelas tecnologias da informação nas últimas décadas exigem práticas inovadoras e criativas nas escolas brasileiras. Atento às novas necessidades para uma educação de qualidade no século 21, o Ministério da Educação lançou chamada pública para conhecer iniciativas bem-sucedidas Brasil afora. Um mapa traz 178 práticas inovadoras e criativas, selecionadas com base em cinco dimensões: gestão, currículo, ambiente, metodologia de ensino e intersetorialidade.

Nesta entrevista ao Jornal do Professor, a socióloga, com doutorado pela Universidade de São Paulo, Helena Singer, coordenadora do Programa de Estímulo à Criatividade na Educação Básica, instituído em 2015, explica que conhecer essas iniciativas criativas e inovadoras é o passo inicial para embasar políticas públicas para uma educação básica de maior qualidade e reinventar uma escola próxima à realidade dos alunos da era digital.

“A escola pode inovar em todos os seus aspectos e é isso que estamos buscando com essa iniciativa do MEC”, ressalta. (Rovênia Amorim).

Jornal do ProfessorO que é a iniciativa para Inovação e Criatividade na Educação Básica do Ministério da Educação?

Helena Singer — Essa iniciativa tem por objetivo mapear o que está acontecendo no campo da educação básica — entre escolas e instituições que se dedicam ao público da educação básica, que são as crianças, adolescentes, jovens e mesmo o público que não frequentou a escola na idade certa — de mais inovador e que já esteja dialogando com os desafios do século 21 e com as diversas possibilidades no campo da comunicação, no processamento das informações. Há um diagnóstico de que muita coisa mudou no mundo, mas o modelo escolar continua basicamente o mesmo. Isso afeta também a qualidade da educação. Então, é preciso apontar caminhos de como reorganizar a estrutura escolar no sentido novo. Isso vai impactar positivamente na qualidade da educação.

Como a escola inova no século 21?

— Ela pode inovar em todas as suas dimensões. Por exemplo, na organização do espaço. Normalmente, temos nas escolas uma organização estruturada em cima de salas de aulas, corredores. Dentro das salas de aula, temos as carteiras enfileiradas de frente para a lousa. A inovação não é colocar computadores em cima das carteiras e substituir a lousa por uma digital, mas reorganizar esse espaço escolar de maneira que possibilite mais a troca entre os estudantes do que a posição mais passiva de estar na carteira ouvindo o que o professor está expondo. Porque a mudança no mundo das informações, da internet, possibilita que o estudante navegue pelo conhecimento, faça suas pesquisas com base em seus interesses. Isso muda também a relação dele com o professor. O professor tem mais que orientar o processo de pesquisa do que estar expondo um conhecimento, um conteúdo específico o tempo todo.

Então, a disposição da sala de aula nova já propõe maior troca entre os estudantes e o auxílio do professor, circulando entre eles. Também podem existir estruturas escolares que nem precisem de salas de aula. Podem ser baseadas em espaços de produção de conhecimento mais diversos, como laboratórios, bibliotecas, salas de leitura. Enfim, outro jeito de organizar. A gestão da escola também pode ser nova. Temos uma estrutura baseada na concentração das decisões em cima da equipe gestora, da direção da escola. E já há leis, todos os documentos orientadores, que preconizam a gestão democrática, mas isso é mais difícil de organizar. E uma estrutura nova, na qual os estudantes possam ter voz na decisão sobre os projetos que a escola vai desenvolver, até como utilizar os recursos, como organizar os espaços, envolver os pais, também... A escola pode inovar também no currículo, que não precisa ser baseado apenas em componentes curriculares e de uma forma seriada. Pode organizar os estudantes de uma outra forma, por grupos de interesse. Pode desenvolver projetos que vão dialogar com o que está previsto nas diretrizes curriculares, mas também no contexto daquela escola, onde ela está; fazer pesquisas sobre esse contexto; descobrir quais são os desafios e as potências daquele lugar. Ou seja, a escola envolver o território onde ela está e envolver os estudantes e os professores nessas pesquisas. Enfim, a escola pode inovar em todos os seus aspectos. É isso que estamos buscando com essa iniciativa do MEC.

Os projetos que chegaram ao MEC mostram que os professores e os gestores estão entendendo essa proposta e que estão conseguindo inovar?

— Sim. Recebemos 683 inscrições, de quase todos os estados, que mostram muita riqueza. Para se inscrever, a instituição tinha de comprovar que, se já não chegou ao resultado final, tem um bom plano de resultado, ainda que não esteja dando resultados completos. Não adianta ser novo, ser criativo e não ter resultados.

Quando surgiu a ideia dessa iniciativa no MEC e quais são as dimensões contempladas?

— Já faz dois anos que o Ministério da Educação tem sido demandado por instituições civis da sociedade, por escolas, para olhar para esse movimento de renovação, de transformação da estrutura escolar. Com base nisso, criou-se essa iniciativa, no início de 2015, que veio atender a essa demanda, promovendo uma reflexão sobre a inovação e a criatividade nas cinco dimensões da educação. Esse processo de revisão da estrutura escolar ocorre em cinco dimensões: I) em cima do ambiente escolar; II) como se organiza o currículo dessa instituição; III) como se propõem metodologias que tenham o estudante como protagonista, ou seja, esse estudante que está navegando na internet, que está produzindo conhecimento, que está fazendo filme no celular, que está o tempo todo em rede social, manifestando as suas opiniões, compartilhando as coisas que descobre: como se traz isso para o ambiente da escola; IV) na relação com a comunidade, com as famílias, com o contexto em que a escola está, ou seja, a escola que faz do contexto tema para o seu currículo, que envolve estudantes e professores nessa pesquisa; V) a escola, a instituição educativa que articula a rede de direitos, ou seja, que garanta os direitos fundamentais da criança, dos adolescentes e dos jovens, com a percepção de que o direito de aprender é indissociável dos demais.

Criança nenhuma vai aprender se não estiver com a saúde garantida, se não sentir o ambiente saudável, seguro. A escola, sozinha, não é capaz de garantir tudo isso. Ela precisa de uma articulação com outros agentes, equipamentos públicos, instituições comunitárias que atendem a essa mesma população para garantir um plano comum que vá, mesmo, assegurar os direitos das crianças, adolescentes e jovens.

A chamada pública do MEC abarca inovações de todas as escolas, públicas e particulares?

— Exatamente. Essa chamada foi aberta para escolas públicas e privadas e também para instituições educativas não escolares porque podem inovar em uma dessas dimensões já citadas, e isso pode ser inspirador para as escolas. Porque, às vezes, essas instituições têm mais liberdade de inovar e já encontraram caminhos que podem inspirar outras escolas ou mesmo as secretarias de educação a formular propostas de um novo sentido.

Quantas inscrições foram realizadas e quantas selecionadas?

O site recebeu quase 3,9 mil visitas. Pessoas que entraram e começaram a se cadastrar e não preencheram até o final o formulário, provavelmente porque perceberam que essa chamada era para um segmento específico, que são as instituições que atendem diretamente a crianças, adolescentes e jovens. Não é ainda para instituições que fazem formação de professores ou que desenvolvem metodologias e tecnologias sociais. Há muita produção nessa área, que é interessante. Pretendemos, no futuro, lançar chamadas para isso. Mas 683 delas preencheram completamente o formulário. São instituições mais próximas dos critérios definidos. Temos oito grupos de trabalho regionais que dão conta de todos os estados, com especialistas nesse campo da inovação na educação básica. São professores de universidades, de secretarias de educação e de cultura, organizações da sociedade civil e das próprias escolas que já tenham regionalmente trabalhos reconhecidos como inovação. No total, são 104 lideranças no campo da educação inovadora e criativa que ajudaram a formular os critérios para a seleção. Foram, então, os avaliadores dessas inscrições e selecionaram 178 instituições, que dão uma abrangência muito boa de como está acontecendo a inovação, nas diversas regiões do Brasil, da educação infantil e fundamental, do ensino médio e da educação de jovens e adultos. Instituições escolares e não escolares, escolas indígenas, escolas quilombolas, escolas do campo e escolas urbanas. Enfim, temos um mapa muito interessante, que dá para inspirar escolas e secretarias de educação nos mais diversos contextos de educação no Brasil.

Nesse apanhado, alguma região se destacou na inscrição de iniciativas inovadoras e criativas?

— Existe uma questão que é numérica mesmo. É esperado que os estados mais populosos tenham mais de tudo. Mais quantidade de gente, mais quantidade de instituições. Tivemos um número maior de inscrições nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro, como também é desses estados o maior número de instituições reconhecidas. Mas temos praticamente exemplos de todas as unidades federativas, com números menores, mas proporcionais ao tamanho da população e ao número de instituições.

Essa iniciativa não premia, mas mesmo assim houve interesse das escolas em participar e revelar as iniciativas de inovação e criatividade. O que o MEC pretende fazer com essas iniciativas bem-sucedidas?

— As instituições tiveram interesse que essas iniciativas fossem conhecidas pelo Brasil todo. Foram chanceladas pelo MEC como instituições que devem inspirar a educação básica no Brasil. Então, lançamos um mapa, na internet, que permite à pessoa levantar todos os estados, municípios, instituições públicas e privadas, fazer a pesquisa que quiser. Depois disso, pretendemos fazer programas na TV Escola sobre essas instituições. Serão programas de debate com os integrantes dos trabalhos regionais sobre esses aspectos todos. Enfim, queremos fomentar o debate sobre a mudança que se espera e que se deseja para a instituição escolar para que ela atenda mais aos anseios do século 21. Então, a agenda para os próximos meses é de debate e divulgação.

Essa iniciativa deve virar uma rotina no MEC, com novas chamadas públicas?

— Estamos pensando em algumas possibilidades e em tornar essa chamada pública até permanente. Como ela não premia, poderíamos ter atualização do mapa e também fazer chamada pública para outros tipos de instituições que tentaram se inscrever — vimos que há uma demanda e que algumas não se adequaram ao perfil dessa primeira chamada. Então, poderíamos ter chamadas públicas para universidades; para instituições de educação superior que fazem formação de professores sob a perspectiva inovadora; para secretarias de educação municipais e estaduais que tenham programas que fomentem a inovação na educação básica. E, a partir daí, desenhar orientações para a política pública, como o tipo de formação de professores poderia ser mais fortalecido; ajudar as secretarias de educação a apoiar as escolas inovadoras — às vezes, as secretarias nem sabem que há uma escola inovadora em sua rede. Ao saber, podem querer apoiar, e o Ministério da Educação poderia ajudar, criando diretrizes de apoio à inovação para que ela se sustente e se consolide.

É uma nova forma de fazer política pública para a educação...

— Na verdade, isso está no escopo dessa iniciativa, de que essa política pública também deva ter um formato inovador. Normalmente, a política pública é feita a partir de programas desenhados nas secretarias ou no próprio Ministério da Educação. E as escolas ou secretarias fazem a adesão ao programa desenhado. Essa política inovadora tem um formato diferente porque, antes, estamos mapeando, entendendo o que as instituições já fazem, o que estão fazendo e o que está dando certo e o que precisam para, a partir daí, desenhar os programas capazes de fortalecê-las. Queremos fortalecer uma imensa rede no Brasil pela melhoria da educação, entrando agora nos aspectos pedagógicos. Ou seja, como podemos organizar o ambiente, encontrar metodologias que garantam a aprendizagem e articular a escola com a comunidade de forma a tornar o currículo mais significativo.