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JORNAL

Prêmio Viva Leitura-8ª Edição

Quinta-feira, 30 de Junho de 2016

Edição 126

EDITORIAL - Prêmio Viva Leitura-8ª Edição

A oitava edição do Prêmio Viva Leitura, promovido pelos ministérios da Educação e da Cultura em parceria com a Organização dos Estados Ibero-americanos para Educação, Ciência e Cultura (OEI), é o tema da 126ª edição do Jornal do Professor.

Para apresentação nesse número, selecionamos cinco projetos entre ganhadores e finalistas: Literatura Cura, do Instituto Chamaeleon, de Brasília (DF); Pacto pela Leitura – Formação de Pais Leitores, da Escola Municipal Leocádia Felizardo Prestes, de Porto Alegre (RS); e Tornar Visíveis os Invisíveis, um Desafio Instigante, da Biblioteca Pública Municipal Avertano Rocha, de Belém (PA). Os três estão entre os quatro vencedores da premiação.

Plantando Leitura, Colhendo Conhecimento, da Biblioteca Pública Municipal Protásio Lopes Pessoa, de Tefé (PA) e Alimente Heróis com Livros, da Escola Municipal José Carlos Pimenta, na zona rural de Goiânia (GO), fazem parte dos finalistas do Prêmio Viva Leitura – 8ª Edição.

Nossa entrevistada é a professora Suzana Vargas, diretora da Estação das Letras, no Rio de Janeiro (RJ). Andrea d’Andria, professora de música do Centro Educacional Sesi, de Taguatinga (DF), participa da seção Espaço do Professor.

Para saber mais sobre o Prêmio Viva Leitura acesse sua página na internet.

Ajude-nos a escolher o tema das próximas edições, votando na enquete colocada em nossa página. E aproveite para colaborar enviando sugestões, críticas, textos e músicas.

Seja bem-vindo!

Professor de escola rural em Goiás ensina a transformar alunos em heróis de leitura

Professor Cléssio e alunos na sala de aula

Inconformado com as notas dos alunos em leitura e produção de texto, o professor transformou-se em um desses heróis comuns, que não usam capas e nem disfarces, mas têm como superpoder a obstinação de que podem fazer algo para melhorar a qualidade da educação. Com esforço e otimismo, Cléssio Pereira Bastos, 31 anos, professor de português e língua inglesa, imprimiu criatividade em projeto pedagógico, que chamou de Alimente Heróis com Livros, e tem conseguido estimular os alunos do sétimo ao nono ano da Escola Municipal José Carlos Pimenta, na periferia de Goiânia, a ler livros e a escrever melhor, bem como a exercer a cidadania enquanto críticos de situações de injustiça social.

Interdisciplinar, o projeto, que resultou no sucesso da escola da comunidade rural de Vila Rica, a 25 quilômetros de Goiânia, foi iniciado em 2015. No início do ano letivo, 3,5 era a nota média em leitura e escrita das turmas dos anos finais do ensino fundamental. No fim do ano, a menor nota foi 8,5. “Eles vivem numa comunidade carente, não recebem muitos incentivos nos estudos, e era urgente uma ação no sentido de inspirá-los com exemplos de superação a partir do conhecimento”, diz o professor, que tem mestrado em crítica literária. “Eles estão inseridos em uma cultura de não leitores e só veem livros na escola; por isso, o trabalho tem de ser muito bem focado para que aprendam a gostar de ler.”

O livro escolhido para iniciar o projeto foi Eu sou Malala, biografia da jovem paquistanesa Malala Yousafzai, prêmio Nobel da Paz de 2014, baleada pelo Talibã (movimento nacionalista que atua no Afeganistão e no Paquistão) por defender seu direito à educação. A obra foi escrita em parceria com a jornalista inglesa Christina Lamb.

Como a escola funciona em tempo integral, a leitura dividiu-se em dois turnos, cada um com uma hora de duração. Os alunos sensibilizaram-se com a história e despertaram para a leitura. “O livro da Malala foi escolhido porque os alunos não gostavam muito de estudar por se acharem obrigados a ir à escola”, afirma o professor. “Então, fui atrás do exemplo de uma menina, da idade deles, que quase morreu por querer estudar.”

Doações — Como não havia um exemplar para cada aluno, uma versão impressa do livro ficava à disposição dos estudantes, enquanto o trecho lido era projetado na parede da sala de aula. Alunos e professores de outras disciplinas revezavam-se na leitura e acabaram por trabalhar informações sobre a geografia, a história e a cultura do Paquistão. Ao final da leitura do livro, os alunos decidiram colaborar com doações para a Fundação Malala, que investe para garantir o mínimo de 12 anos de educação para jovens de países periféricos. “Na vila onde moram, cercada por mato e onde existem apenas quatro ruas, meus alunos conseguiram arrecadar o equivalente a US$ 100, que foram depositados no Fundo Malala”, conta o professor.

Diante do sucesso do projeto no ano passado — foi um dos finalistas do Prêmio Viva Leitura de 2016 —, o professor Cléssio decidiu aprimorá-lo este ano para que tenha a participação de toda a escola, da comunidade e da família. Para 2016, além da biografia de Malala, os alunos terão dois títulos para ler: o Diário de Anne Frank, obra sobre Annelies Marie Frank, adolescente alemã de origem judaica, vítima do Holocausto, e a biografia de Ben Carson, neurocirurgião, psicólogo e escritor norte-americano. “Fizemos uma rifa para a aquisição desses títulos”, explica o professor.

Daniele Rodrigues de Morais, 13 anos, aluna do sétimo ano, ajudou a vender as rifas para arrecadar o dinheiro. Com o professor e 60 colegas, ela foi a Goiânia e, pela primeira vez, entrou numa livraria. No total, conseguiram comprar 200 livros. “Já sei a história da Malala, mas agora quero ler a história da Anne Frank”, diz a estudante.

Marcelo Rosa da Silva Jesus, 14 anos, até se esqueceu da timidez para falar dos livros que começou a ler. “Eu não dava muita importância para a leitura, mas depois que comecei a participar do projeto estou lendo mais porque melhora o texto e tenho mais ideias para escrever”, afirma.

Comunidade — Após a leitura dos títulos, os alunos terão de produzir uma ação na comunidade com base nas histórias. “Meus alunos são heróis com livros”, entusiasma-se o professor Cléssio, que mantém uma página na internet, a Looking 4 Heroes, para dividir as experiências em sala de aula e atrair parcerias para projetos de promoção da leitura e cidadania. O professor espera que, no fim deste ano, os livros lidos pelos alunos sigam para outras escolas e estimulem a formação de novos leitores.

Otimista com os resultados — os alunos vêm apresentando melhoras no rendimento escolar após o projeto —, Cléssio planeja ampliar a ação na escola e em outras unidades de ensino da região, com intercâmbio de leitura presencial ou por videoconferências. “Sem leitura não há aprendizado. Não adianta ensino de gramática sem vivência com a língua em sua forma escrita e não adiantam trabalhos voltados para o social sem a humanização que a leitura promove”, afirma. “E também não adianta entregar livros nas mãos dos alunos sem que haja um trabalho de motivação para uma leitura de qualidade. Eu digo sempre que todo projeto é simplesmente uma desculpa para levar meu aluno a ler.” (Rovênia Amorim)

Vítimas da violência encontram nos livros a cura para a dor

Beatriz Schwab

As páginas de todos aqueles livros da estante guardam muito mais que histórias reais ou imaginadas, versos e aventuras. Podem abrigar na sequência das palavras a cura das alegrias roubadas de uma fase da infância ou da adolescência. Para todos eles, crianças e adolescentes vítimas da violência sexual, a descoberta do mundo da leitura tem ajudado a superar uma dor profunda e calada, que às vezes a família demora a perceber. Desde 2015, os profissionais voluntários do Instituto Chamaeleon (leia-se camáleon), instituição sem fins lucrativos com sede em Brasília, têm usado oficinas de leitura, narração de histórias e produção de textos no atendimento gratuito a crianças e adolescentes do Distrito Federal no propósito de resgatar sonhos interrompidos e o otimismo com o futuro.

O projeto, denominado Literatura que Cura, foi premiado este ano na oitava edição do Viva Leitura, na categoria 3, denominada Territórios da Leitura. O concurso é realizado desde 2006 pelos ministérios da Educação e da Cultura, em parceria com a Organização dos Estados Ibero-americanos para Educação, Ciência e Cultura (OEI). O projeto já atendeu a 200 crianças e adolescentes vítimas da violência sexual. Os resultados têm sido tão positivos que a psicanalista Beatriz Schwab, presidente e fundadora do instituto, pensa em aprimorá-lo. “Quando chegam aqui, querem ficar na internet, como qualquer outro da idade deles, mas vamos incentivando a leitura e, no final, o livro passa a ser tudo na vida dessas crianças e adolescentes”, conta.

Atualmente, 52 crianças e adolescentes, vítimas de abuso e com dificuldades de aprendizagem, são atendidos pelo projeto, que dá prioridade a oficinas de leitura, produção de textos, desenho e narração de histórias nas sessões de terapia. Beatriz explica que o trabalho psicoterapêutico com base na leitura tem repercutido em melhor desempenho em sala de aula e redução dos casos de evasão. “Muitos abusos ocorrem no ambiente escolar, praticados por colegas ou mesmo professores”, afirma. A consequência imediata é a mudança do comportamento. “Muitos pais não percebem o real motivo pelo qual a criança ou o adolescente não quer ir para a escola”, acrescenta. “Crianças e adolescentes que sofrem abuso se tornam, de uma hora para outra, agressivos ou se isolam, querendo, por exemplo, ficar trancados no quarto. É preciso ficar atento.”

Voluntários — O projeto Literatura que Cura tem o incentivo da Vara Regional de Atos Infracionais da Infância e da Juventude do Distrito Federal e conta com o trabalho voluntário e especializado de psicólogos e profissionais da saúde, da educação, da cultura, das artes e do direito. “Por meio da literatura, dos livros, das histórias contadas, das rodas de leitura, dos saraus, do nosso clubinho da leitura, dos bate-papos literários e das atividades de formação de leitores, conseguimos transformar realidades massacradas pela dor, agonia e desesperança”, afirma Beatriz.

Os psicólogos do projeto oferecem treinamento aos contadores de histórias e aos oficineiros que trabalham com as crianças e adolescentes. Além de atuar nas sessões de terapia, os profissionais do instituto visitam creches e escolas e participam de palestras sobre a violência sexual contra adolescentes e crianças. A ideia básica é que as vítimas aprendam a preencher os momentos solitários com lembranças agradáveis, não deixando espaço para a tristeza e as recordações ruins. Em reuniões mensais, os diretores do Instituto Chamaeleon definem os temas de leitura que serão adotados nas oficinais de amenização de traumas. Além de ouvir as histórias, as crianças e adolescentes vítimas de abuso e maus-tratos participam de workshops de produção de textos, de criação de poesias, de leituras dramáticas e de desenho.

No ano passado, a pedagoga Patrícia Mezini, professora de ensino religioso em escola particular de Brasília, participou das atividades do instituto, ora como alfabetizadora, ora como contadora de histórias. Era a Tia Paty, que uma vez por semana ensinava a ler crianças com dificuldades de aprendizagem. “É muito gratificante ser um instrumento do bem, se colocar no lugar do outro, perceber seu sofrimento; aprendi muito com essas crianças. Eu dei amor, mas recebi amor também”, lembra. “Aconselho a todos a reservar um pouco do seu tempo para ações de voluntariado. Vivemos num tempo em que as pessoas estão muito egoístas, cuidando apenas de si. E criança é tudo de bom. Não importa se sejam pobres ou ricas; são todas uma bênção de Deus.”

Nas sessões de leitura, a cada livro lido, a criança ou o adolescente é incentivado a fazer um pequeno relatório sobre o que entendeu e como aquela história pode contribuir para a sua vida. De acordo com Beatriz, os depoimentos de pais e responsáveis das crianças revelam um quadro de melhor autoestima das crianças e jovens que participaram do Projeto Literatura que Cura. “O trauma nunca vai sumir, mas é possível conviver com ele e entender que elas foram vítimas de uma agressão e não tiveram culpa pelo acontecido. Temos relatos de adultos que constituíram família e conseguem trilhar a vida”, afirma.

Desafio — O projeto tem sido custeado por empresárias brasilienses que também doam livros, roupas, brinquedos, alimentos e ajudam a arcar com as passagens dos pacientes mais carentes, que moram longe do local de atendimento. O desafio atual do projeto Literatura que Cura é levantar recursos para publicar os cinco livros da coleção infantojuvenil Confrades do Bem. A ilustração e a edição do material já foram concluídas, com o apoio de profissionais voluntários.

Um desses livros traz cinco histórias escritas por crianças e adolescentes que participam do projeto e se inscreveram no concurso de produção de textos realizado pelo instituto. “As histórias não são sobre as suas dores. Nós não focamos a violência, mas um mundo melhor”, explica Beatriz. “E eles escrevem sobre esse olhar positivo sobre a vida futura nesse mundo.” (Rovênia Amorim)

Bibliotecária leva amor pelos livros a moradores de rua

Teca Lima, o educador cultural Pedro e dois assistidos do Centro Pop seguram o troféu do Prêmio Viva Leitura

O amor pelas pessoas e pelos livros ocupa os dias de uma bibliotecária de Belém, Pará, há 34 anos. Terezinha Maria de Jesus da Conceição Lima, a Teca Lima, acredita que, por meio da leitura, as pessoas podem adquirir conhecimentos, crescer, viajar, relaxar, se fortalecer e amenizar o sofrimento. “A leitura é um momento de prazer”, destaca. E como ela gosta de gente, tem se preocupado em levar os livros até aqueles que estão mais distantes e isolados, como detentos e quilombolas. “Tudo dá certo quando gostamos de pessoas”, diz.

Funcionária da Biblioteca Estadual do Pará, cedida ao município, Teca trabalha na Biblioteca Pública Municipal Avertano Rocha, no distrito de Icoaraci. E foi ali que ela desenvolveu projeto com moradores de rua, o Tornar Visíveis os Invisíveis, um Desafio Instigante, um dos ganhadores da oitava edição do Prêmio Viva Leitura, iniciativa dos ministérios da Cultura e da Educação, em parceria com a Organização dos Estados Ibero-americanos para Educação, Ciência e Cultura (OEI). Na premiação, entregue em maio deste ano, o projeto foi o vencedor da categoria 1, Biblioteca Viva.

Teca criou o projeto em 2014, a partir da observação da parcela da sociedade que inclui pedintes, guardadores de carros e artesãos. O trabalho, realizado em parceria com o Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro Pop), contribuiu para a integração e o reconhecimento da comunidade em relação aos moradores em situação de rua.

Segundo Teca, eles gostam de frequentar o espaço da biblioteca, onde não só têm oportunidade de ler e pegar livros emprestados, como de usar o computador e participar dos variados projetos culturais lá desenvolvidos. Um deles é o Boi Literário Paraense, promovido pela biblioteca há mais de 30 anos. Em preparação para a festa, realizada em 24 de junho, com brincadeiras típicas juninas, os homens participaram de oficinas de musicalidade e as mulheres se dedicaram à personalização de indumentárias e bordados.

Outra importante atividade promovida pela biblioteca é o Jardim Poético, realizado sempre no mês de abril. Um dia inteiro é dedicado a atrações como apresentações de banda e coral, além de uma exposição dos objetos de artesanato feitos pelos moradores de rua.

A biblioteca também apoia os projetos desenvolvidos pelo Centro Pop, como o Auto de Natal e a Paixão de Cristo, e atividades culturais, como o Cinema na Biblioteca, que contam sempre com a participação dos moradores de rua. “Deus me colocou na profissão acertada”, diz a bibliotecária, que tem especialização em organização de arquivos e em gestão pública. Ela, inicialmente sonhava em ser psicóloga. “A leitura tem me surpreendido além do que eu já sei, pois as possibilidades são intermináveis”, diz. “Afinal, é só se permitir deixar acontecer.”

Teca acredita ter sorte de trabalhar naquele local. “É uma biblioteca dinâmica, atuante, com pessoas que comungam com os meus pensamentos”, afirma. “Tanto que todos os nossos projetos têm sempre a literatura como base para outras linguagens artísticas.”

Prêmio — O Prêmio Viva Leitura foi o primeiro que Teca obteve em sua carreira, mas ela se sente premiada sempre que empresta um livro, vê que algum leitor conseguiu pesquisar sobre o assunto procurado ou que usuários da biblioteca são aprovados em concursos, entre outros pontos. “Isso, para mim, é um prêmio porque sei que tive uma pequena participação na realização de sonhos.”

O prêmio recebido, no valor de R$ 25 mil, ajudou a implementar e incrementar o espaço de leitura criado no Centro Pop, com a doação de estantes e obras para o acervo. Os livros foram adquiridos a partir das indicações de assuntos e títulos feitas pelos próprios moradores de rua. Localizado na mesma rua da biblioteca, a quatro quarteirões de distância, o Centro Pop conta com profissionais dedicados a trabalhos como abordagem e triagem de moradores de rua, emissão de documentos e realização de oficinas. (Fátima Schenini)

Professoras acionam os pais ao estimular os alunos a ler melhor

Professora Cláudia Sepé (em pé) com Rossana Abreu, mãe de aluno

Ao perceberem que os estudantes da educação infantil não conheciam obras clássicas da literatura, como O Patinho Feio, nem sabiam como abrir os livros, duas professoras da Escola Municipal de Ensino Fundamental Leocádia Felizardo Prestes, em Porto Alegre, entenderam que era necessário mudar essa situação. Para elas, a mediação de leitura deve ter início em família, pois o gosto de ler deve ser estimulado desde a mais tenra idade e permanentemente reforçado ao longo dos anos. Portanto, estava claro que a primeira coisa a fazer era estimular essa prática entre os pais.

Cláudia Sepé, responsável pela biblioteca escolar no período diurno, e Sandra Holleben, professora de duas turmas de educação infantil, criaram então o projeto Pacto pela Leitura – Formação de Pais Leitores, iniciado em agosto de 2014, com a participação de 14 mães e um pai. Após encontro inicial, no qual foi explicado que os pais deveriam pegar livros na biblioteca e ler para os filhos, em casa, de forma contínua, as reuniões passaram a ser realizadas quinzenalmente.

Nessas ocasiões, as duas professoras abordavam temas como técnicas de leitura, estudo de vocabulário e análise das ilustrações. Também falavam sobre os elementos não verbais — expressão facial, entonação e modulações de voz — que fazem parte do ato de ler. O feedback sobre as leituras — se os pais tiveram alguma dificuldade, se os filhos gostaram ou não — era outro ponto incluído nas reuniões.

Em cada encontro, os pais escolhiam um livro a ser lido para os filhos, em casa. Além da leitura, eles deveriam executar algumas tarefas propostas pelas professoras, como criar nova capa e novo título para a obra ou registrar em vídeo as leituras da família. Tudo passou a ser postado em facebook criado especialmente para o grupo. Para dar mais visibilidade ao projeto e sensibilizar outras famílias a participar, foram confeccionados buttons com o slogan “Somos uma família leitora”.

A iniciativa continua este ano, com algumas mudanças. “Começaremos a investir em vídeos, feitos por nós mesmos e pelos participantes, para divulgar nossas ações”, adianta Cláudia. Embora os objetivos do projeto não tenham sido totalmente atingidos, os resultados obtidos até agora são considerados importantes. Ela leva em conta as condições de vulnerabilidade social da comunidade onde a escola se insere e o fato de que muitos pais nem sequer buscavam as avaliações trimestrais dos filhos. Por isso, considera essa aproximação uma grande conquista.

Prêmio — O projeto foi um dos ganhadores da oitava edição do Prêmio Viva Leitura, promovido pelos ministérios da Educação e da Cultura, em parceria com a Organização dos Estados Ibero-Americanos para Educação, Ciência e Cultura (OEI). Ele foi o vencedor da Categoria 2, Escola Promotora de Leitura.

“Ter vencido o Prêmio Viva leitura teve um sabor especial, confirmou que estamos no caminho certo com nossas propostas de incentivo à leitura”, ressalta Cláudia. “Isso mostra como é possível, mesmo em condições adversas de trabalho, em comunidades carentes, desenvolver projetos que promovam a inclusão de fato.”

Com graduação em letras (literatura de língua portuguesa) e doutorado em comunicação, mídias e processos socioculturais, Cláudia também leciona na Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos). Ela é professora de língua portuguesa nas faculdades de Comunicação e Jornalismo. (Fátima Schenini)

Para professor amazonense, a leitura transforma o ser humano

Professor Dijaik lê história para crianças

Pedagogo em Tefé, pequeno município do Amazonas, Dijaik Nery de Sousa está empenhado em democratizar o acesso à informação e em desenvolver o gosto pela leitura entre os frequentadores da Biblioteca Pública Municipal Protásio Lopes Pessoa, por ele coordenada. “A leitura transforma o ser humano”, diz. “Ela ensina, disciplina, incita a busca do novo, o tira da escuridão da ignorância, lhe dá argumentos na busca pelos seus direitos, desenvolve sua cidadania plena; enfim, a leitura cura a mediocridade.”

Professor concursado há mais de 20 anos, Dijaik atua na biblioteca desde 2012. Imbuído da necessidade de “plantar” uma cultura do livro em Tefé, para que ela prolifere e se torne presente na vida da população, ele criou, em 2014, o projeto Plantando Leitura, Colhendo Conhecimento, que ficou entre os finalistas da oitava edição do Prêmio Viva Leitura, na categoria 1, Biblioteca Viva. A premiação é promovida pelos ministérios da Educação e da Cultura, em parceria com a Organização dos Estados Ibero-Americanos para Educação, Ciência e Cultura (OEI), com o objetivo de estimular, fomentar e reconhecer boas práticas de leitura provenientes de todo o Brasil.

O projeto do professor Dijaik é desenvolvido até hoje, com ações variadas, que incluem crianças, jovens e adultos. Uma delas é o Clube de Leitura, com reuniões em dois sábados por mês, na própria biblioteca, para discutir a importância de ler e para realizar ações que promovam o gosto pela leitura. Outra ação é a Visitando a Biblioteca, iniciativa que promove visitas de estudantes das redes pública e particular de ensino, às sextas-feiras, de manhã e à tarde. Nos dois últimos anos, mais de cinco mil estudantes visitaram a biblioteca e foram feitos mais de 10 mil empréstimos de livros e documentos.

A comemoração do aniversário da biblioteca, em 13 de junho, é outra atividade do projeto. “Durante a semana do aniversário, realizamos ações de mediação de leitura em escolas e na própria biblioteca, com estudantes convidados; servimos lanches e bolo”, diz Dijaik.

Entre outras ações do projeto estão o Sarau Literário, ocasião na qual poetas da cidade e jovens do Clube da Leitura recitam textos próprios e poesias dos grandes clássicos da literatura, e a implantação do Natal da Leitura, com campanha para arrecadação e doação de livros infanto-juvenis a crianças de comunidades carentes. “Estamos com a ideia de começar a campanha a partir de setembro e buscar parcerias fora do município, pois nosso povo não tem livros para doar todo ano”, diz o professor.

Missão — Acessível apenas por transporte aéreo ou fluvial, Tefé não conta com teatro, cinema ou centros culturais. Daí a enorme importância das ações desenvolvidas pela biblioteca. “Nossa missão é tornar a biblioteca pública um centro local de informação, que permita o pronto acesso dos usuários a todo tipo de conhecimento, independentemente da idade, raça, sexo, cor, religião, nacionalidade, língua ou status social”, salienta o coordenador. “Fazer as pessoas gostarem de ler não é fácil, mas estamos realizando essas ações, mostrando que todos podem ter um livro na mão, basta querer, e nós estamos tentando mostrar esse caminho, tentando criar uma cultura do livro, até então inexistente.”

A biblioteca conseguiu cerca de 400 novos livros para o acervo em 2014 e de 200 em 2015, por meio de doações de usuários e permutas com escolas e outras bibliotecas. “Hoje, já há uma cobrança por mais ações e vários pedidos por livros novos”, afirma o professor. “Nosso público tem aumentado diariamente e nosso acervo não acompanha essa demanda.”

Segundo Dijaik, há a necessidade de um local maior para atender mais turmas de alunos, além de novos equipamentos. (Fátima Schenini)

Acesse o Facebook da Biblioteca Pública Municipal Protásio Lopes Pessoa

A música é um dos melhores estímulos para a mente, diz professora do DF

Professora Andrea e alunos na sala de aula

Professora de música há 11 anos, Andrea Rodrigues Fernandes França D’Andria acredita que o ensino musical possibilita o trabalho das emoções, o desenvolvimento da sensibilidade e da percepção auditiva, além de estimular a sociabilidade, o raciocínio, a concentração e a memória. “A música ativa várias áreas do cérebro quase que simultaneamente e, por isso, é um dos melhores estímulos para a mente”, diz a professora, que leciona no Centro de Ensino do Serviço Social da Indústria (Sesi), em Taguatinga, região administrativa do Distrito Federal.

Andrea dá aulas de flauta doce, canto coral e musicalização infantil a estudantes do ensino fundamental, com idades de 6 a 12 anos, que participam do turno integral. “Nosso desafio é fazer com que esse grupo heterogêneo seja capaz de transformar um trabalho de equipe em harmonia, em música, respeitando o que cada um traz dentro de si”, explica. Ela revela que o trabalho é desenvolvido de forma lúdica, com jogos e brincadeiras musicais, a fim de conjugar teoria e prática, de forma simultânea.

Andrea parte do princípio de que a música não seleciona, inclui. “A música tem pluralidade, une diversos estilos, abrange não só o tocar e o ritmo, mas a expressão corporal, a dança, o canto”, destaca. Isso, segundo ela, permite que os alunos se encontrem, mesmo aqueles que pensam não ter uma vocação para a música. “A forma pela qual abordamos o ensino da música vai além do componente curricular”, explica. “Busca-se que a música seja algo do cotidiano do aluno, que ele perceba no dia a dia o contexto da música, em atitudes simples como assoviar, ouvir uma canção, dançar ou bater o pé.”

Segundo a professora, o aluno deve perceber que a música entremeia seu cotidiano e que é uma companheira de viagem nessa vida.

Andrea também participa do projeto Doce Som, desenvolvido no Serviço Social da Indústria (Sesi) há três anos, em atendimento à proposta da diretora da escola, Luci Costa, de realização de um trabalho com a flauta doce. O projeto, que despertou o interesse dos alunos e das famílias, deu origem ao Grupo Doce Som (orquestra de flauta doce), que participa de apresentações na escola e fora dela. Por sugestão dos alunos foi criado ainda o Coral Doce Som. “Com tais eventos, os alunos sentem-se valorizados, com vontade de aprender músicas novas e de evoluir, deixando os pais orgulhosos”, destaca a professora.

Na escola há diversos instrumentos musicais, como violinos, violoncelos, trompas, violas, teclados, violões, guitarras e pianos, usados tanto nas aulas de Andrea quanto nas dos professores de outras modalidades musicais. Quanto à flauta doce, cada aluno adquire a própria, por questões de saúde e higiene e por se tratar de instrumento de baixo custo.

Sustentabilidade — Andrea ensina os alunos de musicalização infantil a criar instrumentos a partir do reaproveitamento de materiais. “É uma oportunidade de mostrar ao estudante a sustentabilidade, reaproveitando materiais que ele descartaria na hora do lanche, como uma garrafinha, um potinho de iogurte, por exemplo.”

De acordo com a professora, a música contribui para o autoconhecimento do aluno, pois ele tem de superar as próprias limitações, e estimula a generosidade, pois ele faz parte de um grupo — para que a equipe se destaque, ninguém pode aparecer individualmente. Outro benefício do ensino de música, segundo ela, é a contribuição para que o estudante mantenha a concentração. “Ele aprende a respeitar as diferenças porque são vários instrumentos, e cada um tem um timbre e hora certa para tocar.”

Andrea também participa de trabalho voluntário de música da Igreja Cristã Maranata, o projeto Aprendiz Júnior, realizado no Brasil, na Venezuela, em Angola e em Moçambique. “Por meio de capacitação presencial e via internet, ensinamos monitores, que se dividem em cada igreja e ensaiam com as crianças”, revela. “Nossa alegria com esse trabalho é resgatar famílias destruídas, pessoas e crianças depressivas”, diz. “Através do tocar, elas resgatam a alegria nos corações.”

A professora destaca que a música, no contexto evangélico, é uma das formas de expressar a espiritualidade. “De motivar e entender o mundo em que vivemos, a descortinar um mundo que nós não enxergamos, um mundo que o homem precisa conhecer para que a vida tenha um sentido”, afirma.

Com graduação em pedagogia e pós–graduação em educação musical, além de diversos cursos de formação profissional na área da música, Andrea faz o curso de licenciatura em música. (Fátima Schenini)

Saiba mais sobre o Centro Educacional Sesi em Taguatinga

Suzana Vargas: “Um cidadão bem estimulado nunca mais abandona o hábito da leitura depois de o adquirir”

Suzana Vargas

Professora de literatura por mais de 30 anos em instituições de educação básica e superior, poeta, autora de literatura infantil e ensaísta, com vários títulos publicados, Suzana Bisch Kfuri (Suzana Vargas) dedica-se ao trabalho com oficinas de poesia e de leitura em universidades e entidades culturais de todo o Brasil. Desde 1996, ela coordena o projeto Estação das Letras, no Rio de Janeiro, espaço alternativo por ela idealizado, dedicado exclusivamente à leitura e à escrita.

Com graduação em letras e mestrado em teoria literária, Suzana atuou como pesquisadora da Fundação Biblioteca Nacional e editou, de 1991 a 2004, com outros escritores, a revista Poesia Sempre. Também foi editora da revista Buriti, publicação da mesma entidade na Casa da Leitura do Programa Nacional de Incentivo à Leitura (Proler).

Em entrevista ao Jornal do Professor, Suzana diz que a leitura pode alargar nossa compreensão e nos ajudar a viver melhor. Para que as pessoas leiam mais, a leitura deve estar identificada com prazer, lazer e conhecimento. Ela afirma que os professores têm papel fundamental para incentivar o gosto pela leitura entre os estudantes, mas o estímulo da família e dos parentes também é importante. “Aprendemos por osmose, por imitação em todos os setores. Se vejo pessoas lendo, vou, naturalmente, valorizar os livros”, destaca.

Para Suzana, um cidadão bem estimulado “nunca mais abandona o hábito da leitura depois que o adquire.” (Fátima Schenini)

Jornal do ProfessorA senhora é professora de literatura em diferentes níveis de ensino há mais de 30 anos. Por que a leitura é importante na vida das pessoas?

Suzana Vargas – A leitura nos ajuda a viver melhor porque viver exige de nós um exercício constante de compreensão. Compreender as razões que existem para determinados fatos, situações e estados de alma nos torna mais felizes. A falta de entendimento das coisas é que nos infelicita. Nesse aspecto, a leitura abre para nós um campo muito amplo, que vai do psíquico ao político, só para citar alguns dos terrenos que exigem compreensão, sensibilidade e certa dose de realismo e de percepção das coisas. E não falo aqui apenas da leitura literária. Toda a leitura pode alargar nossa compreensão. Tenho uma história pessoal que se construiu através dela. Tudo a que consegui chegar a ser ou resolver foi a leitura que me deu, no terreno profissional, no emocional e pessoal. São incontáveis as situações em que descobri essa estratégia de vida. Daí minha fé nesse caminho para a compreensão do mundo, que descobri muito cedo. Trabalho para levar essa boa nova a todos. As vantagens da leitura não se limitam apenas ao acúmulo de conhecimentos, mas ao modo como essas informações vão se somar e transformar nossa percepção da realidade, permitindo-nos sair da passividade e passar a uma ação mais organizada e consciente. Esse é um assunto muito vasto, que me permitiria estender por muitas páginas.

Em palestras com estudantes, brincando, mas a sério, costumo falar que ler é bom para namorar. Com isso, quero dizer que ler nos torna mais bonitos porque mais interessantes. Uma pessoa interessante é alguém que tem o que contar, tem opinião, sensibilidade e poder de análise ou síntese. E isso, por si só, a torna mais bela, de convívio fácil porque tem a mente ágil, produtiva.

Algumas pessoas dizem que gostam de ler; outras dizem que não. É possível estimular o gosto pela leitura em qualquer pessoa? Qual o papel da família?

– Acho que toda pessoa que está exposta à leitura e percebe suas vantagens pode ser conquistada para os livros. Depende do modo como os estímulos chegam até ela. Um bom professor leitor pode fazer milagres, mas o estímulo da família e dos parentes também tem seu papel. Ter livros em casa ao alcance e à vista é muito importante. Regrar um pouco o uso da internet e da TV também facilita. Não vai aí crítica negativa a esses importantes mecanismos de leitura, hoje mais do que nunca. Aprendemos por osmose, por imitação em todos os setores. Se vejo pessoas lendo, vou, naturalmente, valorizar os livros. E são muitas as formas de estímulo, mas acredito que a da sala de aula seja fundamental, pois é na escola que as crianças passam a maior parte do tempo. Claro que os estímulos variam e dependem da faixa etária.

De que maneira os professores podem incentivar o gosto pela leitura entre os estudantes?

– Os professores são fundamentais. Eles precisam gostar de ler (é inacreditável o número de professores que não leem, não gostam ou leem pouco). A leitura precisa ser um valor em si para o mestre. Um professor apaixonado sempre vai encontrar caminhos interessantes e prazerosos para transformar os livros ou os momentos dedicados à leitura em momentos de descoberta da vida e do mundo. E vai utilizar todas as matérias, seja matemática, ciências, história ou língua portuguesa, para, de algum modo, descobrir com e para seus alunos essa fonte de informação. Um bom livro pode servir para motivar uma série de atividades, tarefas e exercícios em outras áreas que não somente língua portuguesa ou literatura. Uma boa história pode ser recontada de muitas maneiras – através de desenhos, quadrinhos, fotos, recortes. Um poema serve para cantar, inventar músicas, desenhar, dizer em voz alta, dançar... A internet pode ser usada para nos contar ou recriar detalhes de épocas passadas, como moedas, indumentárias, vocabulários etc. Vivemos um momento especialmente rico em informações que devem ser aproveitadas para mostrar que a literatura e a leitura são uma importante fonte de reflexão.

A realização de eventos, como feiras de livros, pode contribuir para disseminar o interesse pela leitura?

– Os eventos e feiras literárias são importantes, na medida em que noticiam a existência do livro como um produto, veiculam os títulos e autores na mídia. Através deles é possível um contato direto com os escritores. Mas esses eventos não formam leitores. Existem duas instâncias importantes para o livro: a escolar e familiar, na qual a formação é indispensável e conta muito através de atividades e do contato direto com a leitura; e a midiática, que tem efeito psicológico importante, pois conta com a natureza mais, digamos, festiva do objeto livro. Sem falar na comunhão com outros leitores e na possibilidade real de aquisição das obras colocadas à venda.

O ideal seria – como venho advogando – a criação de uma cadeira de leitura nas escolas, que acompanhasse os estudantes do fundamental ao nível universitário. Mas essa ação teria de se transformar em projeto de lei e tem muitas especificidades. Um dia – se alguém quiser me ouvir –, posso detalhar.

A senhora idealizou e coordenou, durante 13 anos, o projeto Rodas de Leitura, desenvolvido em parceria com o Centro Cultural Banco do Brasil. Qual seu objetivo ao idealizar o referido projeto? De que forma eventos como esse podem contribuir para que a população leia mais?

– Foi um projeto pioneiro nessa área, pois colocou a leitura fora do âmbito escolar. O projeto Rodas de Leitura demonstrou que literatura pode ser uma atividade de lazer equiparada a outras atividades de um centro cultural, tais como cinema, teatro, exposição etc. Aliás, esses era um dos objetivos do projeto: mostrar, na prática, que ler um bom romance e ver um bom filme são atividades igualmente gratificantes e prazerosas. Na verdade, coloquei em prática algo que já desenvolvia nas minhas aulas de literatura desde a década de 80, quando comecei a dar aulas em vários níveis, entre eles o universitário. A esse respeito, defendi uma tese de mestrado em 1988, no livro Leitura: uma Aprendizagem de Prazer (Ed. José Olympio). O projeto foi retomado depois, em 2010, na Fundação Biblioteca Nacional, sob os auspícios do [instituto] Oi Futuro. Mas, depois de 13 anos, o Brasil inteiro já estava falando e realizando rodas de leitura. Hoje, falamos nelas como se fala em rodas de samba, o que me enche de alegria. Existem algumas teses sobre esse projeto que me alegram igualmente. E nunca abandonei essa prática, que desenvolvo até hoje em todos os programas que coordeno. Atividade de leitura sem livros ou sem ler não existe.

Para que a população leia mais é necessário que a leitura esteja identificada com prazer, lazer e conhecimento.

A senhora idealizou e coordena, há 20 anos, o projeto Estação das Letras, espaço alternativo dedicado unicamente à leitura e à escrita. O que a levou a criar esse espaço? Que atividades são promovidas no local?

– Criei a Estação das Letras movida por dois desejos. O primeiro, de estender as oficinas de criação literária, que desenvolvia desde 1982, às pessoas que escreviam e não tinham como ser orientadas para dar continuidade à vocação. Para isso, aliei-me aos melhores profissionais, entre escritores e professores de literatura. Com eles, com seu apoio, desenvolvi esse espaço único no país. O segundo desejo, que se mistura com o anterior, visa à formação de leitores, já que por trás de um grande escritor existe sempre um leitor maior ainda. À medida que o tempo foi passando, ambos os projetos se aproximaram muito, e a Estação das Letras ampliou bastante seu leque de ofertas, chegando aos cursos profissionalizantes do mercado editorial para além da leitura e da escrita. Afora as oficinas de leitura e escrita, mantemos grupos de leitores, que se reúnem semanalmente, e eventos mensais gratuitos diversos ligados à leitura de livros. Sem nunca perder o foco, a Estação é uma verdadeira usina...

A senhora acredita que a realização de prêmios como o Viva Leitura podem contribuir para disseminar a importância da leitura?

– Acredito e muito. Prêmios como esse são muito estimulantes para quem desenvolve projetos nessa área, tanto para entidades públicas quanto privadas, além das pessoas físicas contempladas. E a maior virtude: abrangem o território nacional como um todo.

Costuma-se ouvir que o preço dos livros é um empecilho para que mais pessoas leiam. Qual sua opinião sobre isso?

– Muitas vezes, o preço dos livros funciona como impeditivo mesmo. Mas outras tantas, não. O que acontece no nosso país é que ainda não temos uma população de leitores consumidores de livros. Temos uma grande quantidade de analfabetos funcionais e uma massa que transitou da cultura oral para a audiovisual sem passar pelo livro. Leitura é hábito, e hábito se adquire na frequência com que somos apresentados aos produtos. Na verdade, adquire-se o hábito na escola. Um cidadão que valoriza os livros, de verdade, não hesitará em pagar R$ 40 ou mais por seu objeto de desejo. Não é o quanto custa um hambúrguer hoje em dia?

Outra afirmação que se escuta é de que a vida moderna, com facilidades como a internet, tem colaborado para diminuir o hábito da leitura entre a população. Isso é fato ou é mito?

– Pode ser fato, mas tem muito de mito. Claro que somos assediados por imagens e pelas facilidades da internet, mas creio que elas podem e devem ser bem utilizadas em proveito da leitura. Mudaram os suportes, mas não mudou a leitura. Hoje, inclusive, lê-se e escreve-se infinitamente mais do que antes. Vou repetir: um cidadão bem estimulado nunca mais abandona o hábito da leitura depois que o adquire.