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JORNAL

Recreio Criativo

Segunda-feira, 8 de Fevereiro de 2010

Edição 34

EDITORIAL - Recreio Criativo

O tema da 34ª edição do Jornal do Professor é Recreio Criativo. O assunto foi escolhido por 52,44% dos leitores que votaram na enquete colocada em nossa página.

Nesta edição, você vai conhecer alguns exemplos de recreios desenvolvidos em escolas de diferentes estados brasileiros: o Recreio Musical, que ocorre em Jaboatão dos Guararapes (PE) e em Coronel Fabriciano (MG); o Recreio com Afeto, de Aracaju (SE); e o Recreio Criativo, de Rio Verde (GO). Também vai conhecer experiências de recreios desenvolvidas no Rio de Janeiro (RJ) e em Venâncio Aires (RS).

Vai saber qual é a importância do período do recreio, para estudantes e professores e quais as principais atividades que dele fazem parte, com a professora Cristiane Vianna Guzzoni, da Universidade Metodista, que em sua tese de mestrado abordou o tema A dimensão simbólica do recreio na escola de 1º grau.

A entrevistada desta edição é a professora e pesquisadora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Christiane Luce Gomes. Para ela, o recreio escolar deve fundamentar-se no lazer, e deve ser concebido, valorizado e reconhecido como campo fértil para a vivência de atividades culturais lúdicas.

Ajude-nos a escolher o tema das próximas edições, votando na enquete colocada em nossa página. E aproveite para colaborar enviando sugestões, críticas, textos e músicas!

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Recreio criativo promove alegria e diversão, com responsabilidade

Alunos brincam no pátio da Escola Clodoveu Leão

O desejo de fazer com que os alunos parassem de correr na hora do recreio, aprendessem a respeitar os colegas e a brincar de maneira educativa e cultural, aliando momentos de alegria, prazer e diversão com respeito e responsabilidade, levou uma professora do interior de Goiás a implantar o projeto Recreio Criativo. Executado no segundo semestre de 2009, sempre às sextas-feiras, o projeto provocou melhorias no comportamento dos alunos.

“Meu objetivo era fazer com que as crianças valorizassem o recreio como um momento de lazer e não de correria, brigas, indisciplina e desrespeito, onde ninguém tinha sossego. E a mudança foi extraordinária, como um passe de mágica”, lembra a professora Simone Divina da Rocha, da Escola Municipal de Ensino Fundamental Clodoveu Leão de Almeida, no município de Rio Verde (GO).

De acordo com Simone, 13 anos de magistério, 11 dos quais na zona rural, com esse projeto, além de oferecer aos estudantes momentos de lazer, ela quis valorizar os talentos artísticos, resgatar antigas brincadeiras e inseri-las no cotidiano das crianças, e despertar nos alunos o interesse pela cultura e o respeito ao próximo. Formada em pedagogia, com pós-graduação em metodologia de história e geografia, Simone dava aulas, no ano passado, para alunos do 4º ano do ensino fundamental, pela manhã, e para alunos da educação infantil, no período da tarde.

Em sua avaliação, o projeto superou as expectativas e, a participação dos estudantes, no decorrer das atividades propostas, foi muito produtiva. “Não esperava que fosse despertar tanto interesse nos alunos”, salienta. Ela conta que quando começou a executar o projeto houve muita euforia. Pensou, então, que tudo não passava de empolgação com a novidade e que logo passaria. “Foi engano meu, pois foi aí que o projeto deslanchou, envolvendo todos na escola: alunos, professores, funcionários e pais”.

Simone explica que cada sexta-feira era um momento diferente, com atividades variadas que incluíram desfile de fantasias e brincadeiras diversas. Para participar do projeto era necessário obedecer a algumas regras: ter bom comportamento na sala de aula, fazer todas as tarefas e não brigar. “Adivinha quem participava? Todos”, destaca a professora, que tem absoluta certeza de que todos os estudantes adoraram o projeto. “Quando anunciei que seria o último, foi aquele silêncio. Ah, não, tia...”

A professora tem novos planos para 2010, que incluem o ensino da linguagem de sinais (Libras) às crianças “para que elas cresçam aprendendo a respeitar as diferenças”. Mesmo assim, ela não afasta a possibilidade de prosseguir com o projeto Recreio Criativo, de forma inovadora, com novas atividades, mas com o mesmo objetivo.

(Fátima Schenini)

Alunos mostram seu talento em recreio musical

Estudantes se apresentam em conjunto musical.

O sucesso obtido em novembro de 2009 com a realização do Recreio Musical no Colégio Atual, em Piedade, no município pernambucano de Jaboatão dos Guararapes, na região metropolitana de Recife, levou a instituição a dar prosseguimento à atividade. Assim, em 2010, ela será realizada na última sexta-feira de cada mês. A primeira edição deste ano está marcada para o dia 12 de fevereiro.

“As atrações serão um grupo de maracatu de uma das comunidades próximas ao colégio e o coral de alunos da própria escola, que vai apresentar músicas carnavalescas”, conta o maestro Ivan José da Silva, educador musical no Colégio Atual. Formado pelo Conservatório Pernambucano de Música e licenciado em música pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), ele ajuda a coordenar o projeto do Recreio Musical: faz a seleção dos inscritos, desenvolve novos talentos e incentiva a participação dos estudantes.

De acordo com o professor, qualquer aluno do colégio que tenha alguma habilidade artística, goste de cantar ou toque algum instrumento, por exemplo, pode participar. Basta entrar em contato com as coordenações e agendar um dia para o ensaio. “A receptividade dos alunos com a criação do Recreio Musical foi a melhor possível. Vários talentos foram revelados e temos uma grande lista de alunos querendo agendar um horário para ensaiar e fazer sua apresentação”, adianta Ivan da Silva.

Segundo a diretora da instituição, Ana Elizabeth Calabria, o que levou à criação do Recreio Musical foi a necessidade de transformar o recreio em um momento criativo, aproveitando para mostrar e desenvolver os talentos e habilidades dos alunos da instituição, que atende cerca de 800 alunos desde o ensino infantil até o pré-vestibular. “Nossa escola entende ser preciso sempre preparar os jovens para a vida, sabendo que os desafios são constantes e que o equilíbrio é fundamental para superá-los”, diz Ana Elizabeth, que é formada em psicologia, com especialização em administração e planejamento educacional. Há 17 anos no Colégio Atual, ela já trabalhou no Serviço de Orientação Educacional (SOE), na Coordenação do Ensino Fundamental e na Supervisão Pedagógica. Em sua visão, é necessário fazer cada aluno se apaixonar pela escola, não a limitando a aulas e provas. “O mundo vai exigir muito mais que isso”, acredita.

Descoberta de Talentos – O Recreio Musical também é atração no Colégio Padre de Man, no município mineiro de Coronel Fabriciano, a cerca de 200 Km de Belo Horizonte. Promovido uma vez por mês, desde 2006, o projeto incentiva o desenvolvimento artístico e a descoberta de talentos. Os estudantes têm oportunidade de se apresentar, tocando ou cantando músicas de diferentes estilos que incluem samba, pagode, sertanejo, ou rock. Quem quiser mostrar seu talento, basta procurar a coordenação para se inscrever.

“Para se apresentar no evento, os alunos se organizam, ensaiam, há um movimento externo para que o momento possa acontecer de forma a impressionar os colegas, embora o tempo de apresentação seja somente no horário do recreio”, diz a coordenadora pedagógica da instituição, Rosângela Segundo Avelino, 26 anos de magistério, 19 dos quais no Colégio Padre de Man, que tem aproximadamente mil alunos matriculados, do nível fundamental ao médio e técnico.

“O Recreio Musical é um momento de descontração e de valorizar o que cada aluno sabe fazer”, salienta Rosângela Avelino, que é formada em letras e em orientação pedagógica. Para ela, o movimento cultural desperta nos alunos o gosto pela arte. Como exemplo, cita o caso de um aluno do curso de informática selecionado para trabalhar na peça teatral Mulheres em Crise, que tem participado da Campanha de Popularização do Teatro, em Belo Horizonte.

(Fátima Schenini)

Recreio com afeto estimula cooperação e solidariedade

Alunos sentados no chão, participam de jogo com carrinhos.

A adoção de uma nova dinâmica na hora do recreio do Colégio Jardins, em Aracaju (SE), resultou em mudanças positivas nas atitudes e comportamentos dos alunos, tanto na escola quanto em casa. Os resultados apareceram depois que a instituição, que atende cerca de mil alunos da educação infantil ao ensino médio, passou a desenvolver o projeto Recreio com Afeto.

O projeto foi criado em 2007, pelas pedagogas Thais da Costa Lima e Denise Rocha, com base em um projeto anterior, denominado Reconstruindo o Recreio. Ao analisarem os resultados obtidos nesse antigo projeto, elas chegaram à conclusão de que seria interessante ampliar a ideia, uma vez que as crianças de hoje não dispõem mais do espaço da rua para brincar e fazer novos amigos e permanecem mais tempo dentro de casa, assistindo televisão ou jogando vídeo game.

Por meio do Recreio com Afeto, o Colégio Jardins disponibiliza diferentes brinquedos e jogos para os estudantes do 1º ao 5 ano do ensino fundamental, nos turnos matutino e vespertino: peteca, perna de pau, futebol de prego, futebol de botão, casa de madeira, bola de gude, tamanco chinês, jogo da velha, carrinhos, e pista de trânsito são alguns deles. Os próprios alunos ficam responsáveis por todo o andamento do recreio e são encarregados de colocar os brinquedos no pátio e também em guardá-los.

De acordo com a diretora, Maria Venízia Gonzaga Moreira, o Recreio com Afeto traz as crianças para um convívio social mais amplo, que tem os valores como base para sua formação, com destaque especial para a cooperação e a solidariedade.

Para a diretora, o cuidado está em tudo: na forma de arrumar os brinquedos; no falar com os colegas; na importância de cada um fazer o melhor para o outro; no ensinar e no aprender. Ela explica que os nomes dos interessados em participar das tarefas são registrados em uma planilha. “Procuramos motivar a todos para que seja gerado o interesse de compartilhar com responsabilidade desse fantástico momento”, adianta.

Na opinião da professora Edjane, do 2º ano do ensino fundamental, as crianças agora chegam mais calmas em sala de aula depois do recreio. Também “estão mais solidárias, se organizam, e cuidam melhor dos seus materiais”, salienta. Segundo Sueli, mãe da aluna Juliana, do 5º ano do fundamental, sua filha chega em casa muito animada e comenta sobre o recreio. “Percebo que ela está mais responsável, mais organizada e mais tranquila. Este recreio com afeto está contribuindo para mudanças positivas”, acredita.

(Fátima Schenini)

Recreio deve ser momento de convivência

Foto ilustrativa de alunos na hora do recreio.

Algo que serve para divertir; brincadeira; divertimento; folguedo; espaço de tempo concedido às crianças para seus brinquedos nos intervalos das aulas ou do estudo. Estes são alguns dos significados da palavra recreio, segundo o dicionário Houaiss. O assunto, que não costumava despertar atenção nas escolas, a não ser no sentido de se observar comportamentos indesejados para evitar brigas, passou a despertar o interesse e os estudos de pesquisadores.

Este é o caso da professora Cristiane Vianna Guzzoni, do curso de educação física da Universidade Metodista de São Paulo. Em sua tese de mestrado na Universidade de Campinas, em 1998, ela abordou o tema A dimensão simbólica do recreio na escola de 1º grau: uma análise a partir das práticas cotidianas. Em seu trabalho, a professora estuda o recreio e o significado cultural das atividades vivenciadas nesse período, tanto pelos alunos quanto pelas demais pessoas que integram a escola. Ao observar recreios e entrevistar diferentes personagens, como alunos, professores, funcionários e diretores, em duas escolas, verificou que os diversos significados atribuídos ao recreio relacionam-se a atividades como: brincadeiras, lanche, liberdade e até mesmo brigas.

Com essa pesquisa, Cristiane, que é formada em educação física e tem 19 anos de experiência no magistério, da educação infantil ao ensino superior, pretendia atribuir um significado para o recreio na escola de ensino fundamental de 1º ao 5º ano (1ª à 4ª série). Ela verificou, no entanto, que tal objetivo era impossível, pois as pessoas possuem diferentes maneiras de ver as coisas e interpretá-las. “A pesquisa demonstrou que crianças e adultos possuem concepções diferentes sobre o recreio, e isto irá interferir enormemente nos significados que ambos irão atribuir a este período do cotidiano escolar”, salienta.

Para ela , o recreio é importante e fundamental em todos os níveis de ensino, inclusive para os professores. “O importante é não entender o recreio apenas como um momento para suprir necessidades básicas - comer, ir ao banheiro etc. O recreio é importante porque tenho que ter um momento onde possa con-viver”, acredita. Cristiane diz que tem verificado, em algumas escolas, a restrição do espaço físico para as vivências de recreio, o que tem provocado a realização de recreios separados: cada turma sai para o recreio, lancha e retorna para a sala sem o contato com outras salas. “Esse parece ser, para mim, um grande equívoco das escolas, que em função da ‘organização’ impedem que as crianças estabeleçam a convivência”, argumenta a professora. “Mais do que indicar atividades para os períodos de recreio, as escolas devem garantir a possibilidade das crianças vivenciarem este espaço com qualidade”, defende.

Em sua opinião, o fato de a escola oferecer alguma possibilidade de vivência durante o recreio poderá ser positivo, desde que o aluno não seja obrigado ou dirigido para a atividade. “Qualquer possibilidade que o aluno tenha de exercitar sua criatividade, de demonstrar suas potencialidades e de vivenciar o convívio com o outro é positiva, desde que seja por opção”, enfatiza. De acordo com Cristiane, é um equívoco pensar que quem oferece a criatividade é a escola, pois sua pesquisa demonstrou que por mais árido que fosse o espaço da escola, as crianças sempre tinham uma saída criativa. ”Muitas vezes as pedras, as folhas de árvores e até os pilares do pátio eram usados como elementos nas brincadeiras”, ressalta.

Em sua visão, pensar em recreios criativos deve remeter à possibilidade das crianças exercitarem sua criatividade nas mais diferentes situações. Nesse sentido, explica que o oferecimento de instrumentos, elementos e propostas pode colaborar muito para que essa vivência seja lúdica e criativa. Porém, argumenta: “nada será mais significativo do que oferecer a possibilidade dos alunos optarem e, principalmente, terem espaço físico e liberdade para propor suas ações. Sem esquecer, é claro, que o não fazer deve ser uma das escolhas possíveis”.

(Fátima Schenini)

Criatividade na hora do recreio traz bons resultados

Alunos brincam e conversam em salão

A realização de atividades recreativas na hora do recreio, como pular corda, amarelinha, jogos com bola e jogos de mesa, trouxeram mais calma ao período de intervalo entre as aulas na Escola Estadual Wolfram Metzler, localizada no município gaúcho de Venâncio Aires, a 130 Km de Porto Alegre. Além disso, os estudantes agora exercitam a socialização e utilizam as regras de convivência.

Os resultados foram observados pela orientadora educacional, Luciane da Cunha Mylius, que também é vice-diretora do colégio. Segundo Luciane, como o pátio da escola é muito grande, havia muitas correrias e confusões durante o recreio. Decidiram, então, direcionar algumas atividades a fim de manter as crianças envolvidas. “Sempre que possível, as atividades são desenvolvidas diariamente, com a participação dos alunos da educação infantil e das séries iniciais”, relata. O acompanhamento do recreio é feito pela vice-diretora, com a colaboração de funcionárias da escola. “Os professores não participam. Achamos importante que eles tenham um horário para descanso no recreio”, explica Luciane.

Na Zona Norte do Rio de Janeiro (RJ), um piquenique na própria escola, na hora do recreio, é uma das atividades que faz a alegria da criançada da educação infantil do Ciep Rubens Gomes. De acordo com a professora Janaína Peçanha da Silveira, a atividade é adotada na Semana da Alimentação Saudável, que ocorre em março. Há 15 anos no magistério, Janaína trabalha há sete no Ciep, que atende 1.300 alunos da educação infantil ao 5º ano do ensino fundamental e alunos da Educação de Jovens e Adultos.

Durante a Semana da Alimentação Saudável, as crianças ampliam seus conhecimentos de higiene e manuseio de alimentos, aprendem a apreciar o sabor de legumes, verduras e frutas, bem como a saber a importância que eles têm para a saúde. Janaína conta que as professoras aproveitam para promover um piquenique com todas as turmas da educação infantil, com vitamina e salada de frutas. Cada aluno tem liberdade de escolher a fruta que vai trazer, a partir de uma lista de sugestões apresentada pela professora. A salada é preparada em conjunto por professores, estudantes, e responsáveis. E todos participam, mesmo que não tenham levado sua contribuição. “A partir das frutas, aproveitamos para trabalhar vários conteúdos, como cores, sabores, formatos e quantidades”, destaca Janaína.

(Fátima Schenini)

Professor de Cuiabá escreve artigo sobre inovações tecnológicas

Jéferson Arruda

Com 28 anos de magistério, o professor Jéferson da Silva Arruda exerce suas atividades na Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Rodolfo Augusto Trechaud e Curvo, em Cuiabá, capital de Mato Grosso. Ele tem licenciatura curta em ciências e licenciatura plena em biologia e leciona ciências no ensino fundamental e biologia no ensino médio e na Educação de Jovens e Adultos (EJA).

Reproduzimos, abaixo, o artigo encaminhado pelo professor Jéferson ao Jornal do Professor, sobre as inovações tecnológicas na educação.

 

Inovações tecnológicas na educação

Jéferson Arruda

A introdução de novas tecnologias na educação nos possibilita inovações, a exemplo do bloco de passos e, mais do que isso, possibilita até escrevermos uma partitura com a marcação de todos os passos e compassos, de forma que outras pessoas possam fazer a leitura visual e auditiva e compreender com clareza a proposta. Como diz Lucas Ciavatta, o autor de Saltos no Tempo, “esta é uma obra aberta, ainda em composição.”

Experiências dessa natureza nos remetem à reflexão sobre a criatividade e como utilizar esses equipamentos que nos são colocados à disposição na escola, de como criar ou inovar formas de interagir com alunos, visando sempre a melhoria da transmissão de conteúdo ou, pelo menos, despertar a curiosidade dos nossos aprendizes para a utilização dessas ferramentas tecnológicas que lhes são disponibilizadas pela escola.

Quero acreditar que as diversas ferramentas colocadas a nossa disposição podem provocar resultados positivos de aprendizagem e experiências com os mais variados níveis de compreensão e interesse por ambas as partes (professor/aluno). A aprendizagem será uma consequência, na medida em que houver motivação, pré-disposição e um ambiente favorável para ocorrer a aprendizagem.

As condições objetivas para que tudo isso aconteça, dentro dessa nova proposta didático-pedagógica, dependerá de mudanças de postura e conduta tanto dos profissionais da educação quanto por parte da administração pública.

Christiane Gomes (UFMG): recreio é campo fértil para a vivência de atividades culturais lúdicas

Professora Christianne Gomes, da UFMG

Professora e pesquisadora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Christianne Luce Gomes é graduada em educação física, com doutorado em educação e tem vários livros e artigos publicados sobre a temática do lazer.

Ela é coordenadora pedagógica do Centro de Estudos de Lazer e Recreação (Celar) e líder dos grupos de pesquisa Otium - Lazer, Brasil & América Latina e Lazer, Cultura e Educação (Lace). Coordena, ainda, no período 2009-2011, o GTT Lazer do Congresso Brasileiro de Ciências do Esporte do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte (Conbrace/CBCE), associado à Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). E integra a comissão responsável pela elaboração do projeto de criação do curso de licenciatura em educação física: esporte, lazer e meio ambiente na América Latina, da Universidade Federal de Integração Latino-americana (Unila).

Em entrevista ao Jornal do Professor, ela ressalta que o recreio escolar deve fundamentar-se no lazer, que é uma necessidade humana importante em qualquer idade, e deve ser concebido, valorizado e reconhecido como campo fértil para a vivência de atividades culturais lúdicas. Em sua opinião, a escola pode sugerir e estimular algumas atividades para a hora do recreio, mas a comunidade escolar deve ter liberdade para optar ou não pela participação ou assistência. O recreio “representa um convite para viver o momento presente, interagir com pessoas e grupos, explorar o tempo/espaço, construir experiências significativas para quem as vivencia e para incluir a ludicidade no dia a dia”, acredita.

Jornal do Professor - O recreio escolar é importante? Por quê?

Christianne Gomes – Sim, é fundamental. Vários argumentos podem ser utilizados para justificar essa afirmativa, sendo que o mais comum é aquele que diz que o recreio escolar é importante por ser um intervalo necessário para aliviar as tensões e compensar o desgaste do trabalho escolar, fazendo com que estudantes e professores tenham mais condições de suportar o estresse da sala de aula. Esta justificativa esvazia o significado do recreio e deveria ser repensada. Ela se fundamenta no pressuposto de que o trabalho produtivo é um valor supremo e absoluto e que toda a vida humana deve se resumir a ele, pensamento do qual discordo e que infelizmente predomina em sociedades desiguais e excludentes como a brasileira.

O trabalho é importante enquanto possibilidade de realização humana e certamente seu valor deve ser reconhecido, mas, uma vida dotada de sentido e de qualidade precisa englobar outras atividades comumente negligenciadas na sociedade atual como a cultura, o lazer e a família. Ao invés de ser visto como momento de reposição de energia, o recreio escolar precisa ser concebido, valorizado e reconhecido como campo fértil para a vivência de atividades culturais lúdicas.

JP – Em sua opinião, existe alguma faixa etária na qual o recreio seja mais importante?

CG – Muitas pessoas acreditam que recreio é importante apenas para as crianças, principalmente para as pequenas, opinião da qual não compartilho. Sendo o lazer uma necessidade humana e uma possibilidade de produção de cultura, pessoas de todas as faixas etárias podem e devem vivenciá-lo, aprendendo a valorizá-lo e a desfrutá-lo de maneira crítica e criativa.

JP – As escolas devem sugerir ou incentivar algumas atividades na hora do recreio, em detrimento de outras? Por quê?

CG – Como do meu ponto de vista o recreio escolar deve fundamentar-se no lazer, uma de suas condições básicas é o respeito pela possibilidade de escolha. Quando uma escola pretende construir novas estratégias no sentido de ressignificar o recreio, pode sugerir e estimular algumas atividades, mas, precisa respeitar o princípio da “adesão espontânea” por parte da comunidade escolar. Assim, cada pessoa pode optar pela participação, pela assistência (que também é uma forma de participar) ou até mesmo pela não participação, caso prefira se envolver com alguma outra coisa ou simplesmente não fazer nada por um momento. Ou seja, participa quem estiver interessado e receptivo a novas propostas, sejam estudantes, professores, dirigentes e funcionários, o que pode estimular novas formas de convivência e da constituição de laços positivos entre os componentes da comunidade escolar.

JP – Como as escolas podem contribuir para a realização de recreios mais criativos? Algumas instituições promovem diferentes atividades na hora do recreio, como jogos e apresentações que estimulam o talento dos alunos.

CG – A escola precisa, inicialmente, pesquisar os interesses culturais lúdicos da comunidade escolar procurando envolver pessoas de todos os seus segmentos. No processo de identificação de interesses poderão ocorrer surpresas que, a princípio, podem não ser vistas como “recomendáveis” para um contexto educativo. Em geral, as preferências de um determinado grupo estão relacionadas com os valores que circulam no meio em que ele vive e com os conteúdos culturais ali vivenciados. Não há dúvidas de que as pessoas aprendem muito ao participar de uma festa, cantar ou escutar uma música, dançar uma coreografia ou simplesmente ver TV. Contudo, lamentavelmente, tudo isso pode estar vulnerável à chamada indústria cultural do entretenimento, que na maioria das vezes estimula a passividade e o consumismo destituídos de crítica ou reflexão.

Esses conteúdos não devem ser negados, pois, são os “saberes” que eles trazem de seus contextos, que apreciam e com os quais se identificam naquele momento. O desafio é superar preconceitos e aceitá-los dentro da escola como pontos de partida para o aprendizado criativo, para estimular o pensar crítico e para ampliar o acervo cultural do grupo – que, em contrapartida, precisa estar aberto para conhecer outras possibilidades e diversificar o seu leque de experiências.

Há um velho ditado que diz que “gosto não se discute”. Claro que se discute, porque o gosto é conformado segundo determinados interesses e muitas vezes esta manipulação não está clara para todos, perpetuando assim relações de dominação, discriminações, consumismo e alienação. A regra é simples: Se nunca fui ao teatro e não sei o que isso significa como posso gostar deste conteúdo cultural? Suponhamos que eu tenha assistido a uma comédia e passe a gostar deste tipo de produção. Mas, teatro se resume à comédia? E quando esta é baseada em clichês comprometidos com o riso fácil que reforça estereótipos, discriminações e exclusões? O que penso de tudo isso? À medida que aumenta o nosso grau de compreensão são reduzidas as chances de sermos manipulados.

Enquanto educadores, precisamos nos comprometer com a educação crítica para a autonomia, e ela também deve ser construída por meio do lazer e da vivência de manifestações culturais, tais como o jogo, a brincadeira, a festa, o passeio, a viagem, o esporte, as formas de artes (pintura, escultura, literatura, dança, teatro, música, cinema, etc), entre várias outras possibilidades. Inclui, ainda, o ócio, uma vez que esta e outras manifestações culturais podem constituir, em nosso meio social, interessantes experiências de lazer e muitas delas podem ser vividas inclusive no recreio escolar.

JP - Há relatos de casos de violência e de bullying na hora do recreio. O que é possível fazer para evitar esse procedimento?

CG – É preciso que educadores, estudantes e familiares tomem consciência de que bullying é sério e corresponde a atitudes agressivas, repetitivas e intencionais que não devem ser mascaradas ou confundidas com “brincadeira”. Comportamentos agressivos geram vítimas e são pautados na violência física e/ou simbólica, estimulando a intolerância e a delinquência. Por isso precisam ser fortemente combatidos, especialmente nas instituições escolares, onde as vítimas são agredidas nos momentos em que se encontram mais vulneráveis e desprotegidas: nos intervalos entre as aulas, nos banheiros, na entrada/saída da escola e também no recreio. Do meu ponto de vista, evitar o bullying na escola é imprescindível e exige esforços coletivos. Educadores, familiares e estudantes precisam ter conhecimentos mais aprofundados sobre o tema para identificá-lo imediatamente e estar preparados para auxiliar aqueles que necessitam. As vítimas de bullying precisam ser orientadas a buscar ajuda na certeza de que serão ouvidas, compreendidas e amparadas, tendo garantido o seu direito de desfrutar de um ambiente solidário e seguro. Aqueles que presenciam abusos não devem se omitir por medo e insegurança, deixando de serem cúmplices da situação e os agressores devem ser responsabilizados e encaminhados a profissionais. Apesar da responsabilização do agressor ser inevitável, ao invés de investir em punições o caminho mais construtivo fundamenta-se na prevenção e na compreensão do problema com mais profundidade. Assim, torna-se imprescindível educar, orientar, estabelecer limites e exercitar o diálogo. A discussão do tema por meio de filmes, textos, matérias jornalísticas e outras estratégias de intervenção fundamentadas na ludicidade podem ser incluídas tanto nas atividades educacionais diárias e como nas atividades extras. A afetividade, a emoção, o respeito, a dignidade e a tolerância precisam ser trabalhados cotidianamente e pequenos cuidados podem ser muito eficazes para reduzir os perigos da violência dentro e fora dos muros escolares.

JP – Você acredita que as escolas e a sociedade, em geral, já despertaram para a importância do lazer? De que forma? Em caso negativo, o que seria necessário para isso?

CG – Em parte, porque a temática do lazer ainda é considerada “nova”, causa estranheza e gera muitas contradições, pois, fomos educados para valorizar o trabalho e a produtividade. Sobre este aspecto vale lembrar que, a contragosto de crianças e adolescentes, em nossa sociedade sacrifica-se a infância e a juventude em nome de uma suposta “preparação para o futuro”; na fase adulta e na maturidade vive-se uma rotina extremamente desgastante porque a regra de ouro é “não perder tempo, pois tempo é dinheiro”; e chega-se a uma velhice totalmente sem sentido porque a pessoa foi educada apenas para trabalhar e, uma vez ausente do processo produtivo, não é raro sentir-se inútil e desprovida de qualquer valor. É assim que a tão sonhada aposentadoria pode tornar-se um pesadelo, principalmente em sociedades como a nossa, marcadas por inúmeras formas de exclusão. Precisamos romper com este ciclo e a educação adquire papel fundamental neste processo ao preparar os estudantes para desenvolverem não somente o seu potencial cognitivo, mas também o potencial lúdico, o afetivo, o gestual, o social, o político, o cultural, o ecológico e tantos outros que vêm sendo negligenciados dentro e fora das escolas. Nossa existência precisa ser enriquecida com o lazer e com as inúmeras formas de sociabilidade e de desenvolvimento pessoal e social. O recreio escolar pode ampliar oportunidades para isso, representando um convite para viver o momento presente, para interagir com pessoas e grupos, explorar o tempo/espaço, construir experiências significativas para quem as vivencia e para incluir a ludicidade no dia a dia. Isso é essencial para todos nós.