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JORNAL

Ações de Sustentabilidade

Sexta-feira, 4 de Maio de 2012

Edição 71

EDITORIAL - Ações de Sustentabilidade

Em sua 71ª edição, o Jornal do Professor apresenta o tema Ações de Sustentabilidade. O assunto foi o escolhido por 47,46% dos leitores que votaram na enquete colocada em nossa página.

Nesta edição, apresentamos as experiências desenvolvidas nas escolas estaduais Historiador Rubens de Mendonça e Padre Ernesto Camilo Barreto, em Cuiabá (MT); Escola Municipal Filomena Cúrcio Cabral, em Vera Cruz (RN); Escola Municipal Professora Ana Guedes Vieira, em Contagem (MG); e na UMEF José Siqueira Santa Clara, em Ataíde (ES).

Nossa entrevistada é a educadora ambiental Julia Tomchinsky, coordenadora do Programa Município que Educa, do Instituto Paulo Freire. E a professora Renata Rodrigues de Matos Oliveira, das escolas Vereador José Ferreira Aguiar e Professor Hilton Rocha, em Contagem (MG), é a participante da seção Espaço do Professor.

Ajude-nos a escolher o tema das próximas edições, votando na enquete colocada em nossa página. E aproveite para colaborar enviando sugestões, críticas, textos e músicas!

Seja bem-vindo!

Escolas de Cuiabá desenvolvem ações de consciência ambiental

Alunos mostram vassouras feitas com garrafas plásticas

Desde que participou de um curso de capacitação de professores mediadores em educação ambiental, promovido pela Secretaria de Educação de Mato Grosso, em 2005, Sérgio Chaves não parou mais de idealizar ações. Em todas elas, o objetivo é estimular a preocupação com o meio ambiente entre alunos, professores e pessoas da comunidade.

Professor de educação física da rede estadual de ensino em Cuiabá, Sérgio começou o trabalho ambiental na Escola Estadual Historiador Rubens de Mendonça, que tinha como maiores problemas o excesso de lixo e a depredação do patrimônio. “Após um ano de projeto efetivo, as depredações acabaram e passou a sobrar dinheiro para investimento, por exemplo, em equipamento de multimídia e ar condicionado”, diz.

As iniciativas foram aumentando a cada ano. Ao constatar que o projeto era sério e dava visibilidade à escola, os demais professores passaram a se envolver e a ajudar nas atividades. A autoestima ficou visível na comunidade escolar. “Quando verificamos os resultados de um trabalho coletivo que dá certo, o moral fica elevado”, diz Sérgio. “E nos sentimos capazes de realizar.”

Uma das primeiras atividades foi a coleta de garrafas plásticas e latas de alumínio. Bem-sucedida, a iniciativa passou a ser adotada também na Escola Estadual Padre Ernesto Camilo Barreto, onde Sérgio trabalha atualmente. O trabalho é organizado em forma de gincana, com dias e horas estipulados para a coleta. Os resultados obtidos são descritos em um quadro informativo, após a contagem do material, feita com a ajuda dos professores.

As turmas que se destacam têm direito a participar de passeios ou aulas de campo. O material coletado é vendido pelos alunos. A verba acumulada é administrada por uma comissão de estudantes e gasta somente pelos alunos. “A escola não tem ingerência sobre o dinheiro”, explica o professor.

Oficina — Outra atividade é a oficina de reaproveitamento. “Ao fazer artesanato com resíduos sólidos estamos diminuindo o lixo no meio ambiente, transformando-o em objetos úteis e artísticos, de forma criativa e divertida”, assegura Sérgio. Individualmente ou em pequenos grupos, os professores são incentivados a desenvolver oficina com os estudantes, que juntam antecipadamente o material a ser usado. Posteriormente, os trabalhos produzidos são expostos à comunidade e até mesmo comercializados.

Um exemplo é a oficina de vassouras feitas com garrafas plásticas. Ela foi criada por dois professores da Escola Rubens de Mendonça a partir de informações obtidas na internet. Uma vassoura é feita com 17 garrafas plásticas cortadas em tiras, sem necessidade de máquinas ou equipamentos sofisticados. Após a colocação de um cabo, preso com arames e pregos, a vassoura está pronta. Ela é apreciada pelas mães dos alunos. “São muito úteis e resistentes”, salienta o professor.

Sérgio também organiza palestras, conferências e campanhas educativas. No ano passado, para as comemorações do Dia da Árvore, em 21 de setembro, ele promoveu o plantio de ipês, espécies nativas da região, em todo o quarteirão que circunda a escola em que leciona. A atividade foi realizada em forma de mutirão, por professores e alunos, durante evento festivo, que teve a apresentação da fanfarra da unidade de ensino.

Ainda para este ano, está prevista a criação da Comissão pelo Meio Ambiente e Qualidade de Vida (Com-Vida), composta por alunos, professores, e funcionários da escola, além de representantes da comunidade. De acordo com o professor, embora cada pessoa tenha o próprio conceito ou visão sobre determinado assunto, as ações dentro e fora da escola devem ser unificadas, em benefício da sustentabilidade no planeta. “Consequentemente, teremos uma melhor qualidade de vida para nós e para os nossos descendentes.” (Fátima Schenini)

Escola mineira promove ações para beneficiar a comunidade

Estudantes na horta

Tão logo assumiu a direção da Escola Municipal Professora Ana Guedes Vieira, no município mineiro de Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte, Sandra Condé Corgozinho decidiu pôr em prática uma proposta pedagógica que privilegiasse os eixos temáticos mais emergentes na comunidade. Como a escola fica em uma área de preservação ambiental, na região de Vargem das Flores, um dos eixos escolhidos foi meio ambiente e desenvolvimento sustentável.

Entre as iniciativas está a implantação dos grupos de estudo, socialização e planejamento (Gesp). Eles proporcionam espaço para o estudo de áreas específicas de interesse de alunos e professores e o desenvolvimento crítico do conteúdo, com o estímulo do saber e o diálogo entre eixos temáticos e componentes curriculares. “Assim, há um grupo de educadores que planejam e executam ações que promovem a sustentabilidade ambiental”, explica Sandra. Ela considera os resultados significativos. “A comunidade escolar está mais informada, conscientizada, engajada e aberta a novas propostas que promovam o desenvolvimento sustentável”, revela. Formada em letras, com cursos de especialização e aperfeiçoamento nas áreas de docência superior, gestão escolar e inclusão, Sandra atua em escolas de ensino fundamental da rede municipal de ensino há 29 anos.

Assim que ingressou na escola, a professora de artes Marta Trindade Cézar passou a fazer parte do Gesp Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. Ela tem interesse no tema desde que era aluna do curso de licenciatura em desenho e artes plásticas. Segundo Marta, quase todas as disciplinas práticas enfatizam a importância de usar materiais recicláveis e respeitar o meio ambiente. Mas ela passou a ler mais e a se interessar efetivamente pelo assunto ao fazer pesquisa para a criação de um cenário, na disciplina de teatro. “Passei a defender a reciclagem, o não desperdício e a preservação da natureza”, revela a professora, que também exerce a função de articuladora comunitária do programa Mais Educação. “Desde então, tento participar de formações e eventos relacionados às questões ambientais.”

Entre as atividades desenvolvidas na escola, nessa área, Marta destaca a irrigação da horta com aspersores feitos com garrafas plásticas, o minhocário e a captação da água da chuva e seu armazenamento em reservatório, além do monitoramento de nascente de água. A confecção de sacolas ecológicas e embalagens para presentes, de bijuterias e brinquedos feitos com materiais recicláveis, a realização de mutirões de limpeza na escola, trabalhos artísticos com elementos da natureza como matéria-prima estão entre outras iniciativas desenvolvidas na instituição de ensino.

“Essas ações não são individuais; são o esforço coletivo de uma equipe que está sempre em busca de ideias capazes de contribuir para formar cidadãos engajados na defesa do meio ambiente”, destaca Marta. Entre os principais resultados obtidos ela cita o aumento do interesse dos alunos e a credibilidade que o trabalho da escola encontra por parte de outras instituições. A professora constata que a unidade de ensino está cada dia mais engajada em trabalhos de sustentabilidade.

Plantio — Outro professor que participa do Gesp sobre meio ambiente é Geraldo Magela Ferreira Campos. Graduado em educação artística, com especialização em arte na educação, ele dá aulas de artes no ensino fundamental e médio. Geraldo participou do plantio de 50 árvores em área da escola na qual as salas ficavam expostas ao sol durante longo período, causando desconforto a alunos e professores. A ação teve a participação de estudantes, pais, professores e membros da comunidade.

Segundo Geraldo, o cuidado com as árvores fez surgir a ideia de cultivar uma horta. “Isso demandou adubação, pois o solo era pobre”, lembrou. “Surgiu, então, o compostário, que fornece adubo à horta e às árvores.” A compostagem é feita a partir de cascas de frutas e legumes usados no preparo da merenda, restos de podas das árvores, folhas secas e doações de serragem e esterco.

O professor conta que os estudantes ficaram empolgados ao perceber que três árvores próximas à área adubada tinham crescimento mais vigoroso que as demais. Eles também constataram que parte das árvores crescia em ritmo lento por falta de água. Tiveram então a ideia de captar água da chuva para irrigação da horta. Para isso, criaram um sistema feito com garrafas plásticas. “O resultado é que, a partir de uma iniciativa simples, a escola tem hoje um sistema complexo de plantio, no qual as árvores convivem, em harmonia, com hortaliças e leguminosas”, destaca.

Na irrigação e na adubação são usados recursos que não geram impacto ou desperdício. “Como uma coisa puxa outra, agora temos também um galinheiro anexo a este espaço e, para um futuro próximo, muitos projetos e sonhos”, afirma o professor. (Fátima Schenini)

Confira a página da escola na internet

Confira o blog da escola

Escola potiguar combate pragas em horta com inseticida natural

Professora e alunos na horta

Estudantes, professores e proprietários de indústrias de fabricação de farinha de mandioca do município de Vera Cruz, Rio Grande do Norte, vão produzir, juntos, um inseticida natural, a ser usado no combate a pragas no viveiro de plantas frutíferas e na horta da Escola Municipal Filomena Cúrcio Cabral. O inseticida é preparado a partir da manipueira, resíduo da mandioca na fabricação da farinha.

A diretora da instituição, a pedagoga Luciana Gomes da Silva Ferreira, considera a ação sustentável importante para a escola e seu entorno, pelo impacto ambiental positivo e por resultar em vantagens para a economia da comunidade. Além disso, a prática é de baixo custo, fácil aplicação e pode ser adotada em outros locais. A escola está localizada no sítio Santa Cruz, na zona rural de Vera Cruz, a 70 quilômetros de Natal.

Diretora há seis anos, Luciana tem 18 de magistério. Ela já lecionou a turmas de educação de jovens e adultos em outra instituição de ensino e a turmas da educação infantil na atual escola. Segundo ela, a manipueira é um líquido amarelado, resultante da prensagem da mandioca. O líquido é depositado em reservatórios e, após período de repouso e manipulação, é aplicado nas folhas e na terra para combater as pragas.

A diretora revela que desde 2005 a escola desenvolve projetos de preservação do meio ambiente, de saúde e de alimentação. Entre eles, o projeto denominado Sustentabilidade, uma Ação Educativa com Práticas Reais, que inclui a criação e manutenção de horta comunitária, com envolvimento de alunos e funcionários. Os produtos da horta são aproveitados para a merenda escolar. A unidade de ensino mantém ainda um viveiro de plantas frutíferas. As mudas são distribuídas entre os estudantes e demais integrantes da comunidade escolar. (Ana Júlia Silva de Souza)

Iniciativa de escola capixaba promove consciência ambiental

Diversas fotos mostram alunos preparando alimentos e plantando

A Unidade Municipal de Ensino Fundamental José Siqueira Santa Clara, em Vila Velha, Espírito Santo, desenvolve projetos sociais e de conscientização ambiental desde 2009. Com as iniciativas, conseguiu reduzir o consumo de água e energia e a quantidade de lixo produzida na escola, que tem 410 alunos do primeiro ao quinto ano.

“Com pequenos gestos na escola e em casa podemos fazer muito para ter um ambiente escolar e familiar mais agradável”, diz a diretora, Letícia Araújo Schmid. Entre as iniciativas, ela cita o aproveitamento de cascas e talos de alimentos em novas receitas e a coleta de óleo usado para a produção de sabão. Além disso, foram feitas visitas ao bairro de Ataíde, onde a escola está localizada, para observar a quantidade e a área de despejo do lixo.

“Aproveitamos para sensibilizar os moradores sobre o consumo excessivo e a produção desnecessária de lixo”, destaca a diretora. Segundo ela, o objetivo das ações é chamar a atenção de estudantes, pais e comunidade para os problemas sociais e ambientais do dia a dia. Pedagoga com habilitação em gestão escolar e pós-graduação em psicopedagogia, 24 anos de magistério, Letícia está na direção da unidade desde 2006.

Nos turnos matutino e vespertino, a professora Rogéria Araújo Rodrigues inclui ações sustentáveis nas atividades diárias em sala de aula. Ela passa orientações sobre separação do lixo e reaproveitamento de alimentos e materiais descartáveis. As atividades são implantadas de forma a atrair o interesse dos estudantes, que confeccionam enfeites, mandalas, pufes e brinquedos com diferentes materiais, como garrafas plásticas e CDs usados.

“Os resultados são sempre satisfatórios”, avalia Rogéria. Ela constata que a consciência obtida pelos alunos em relação à preservação ambiental produz mudanças positivas também nos próprios lares. “Eles fazem em casa o que aprendem na escola, e os pais ficam satisfeitos com a redução nas contas de água e de energia”, salienta.

Segundo a professora, para reduzir o consumo de copos descartáveis, os estudantes são orientados a usar garrafinhas. “Para reforçar, a escola fornece aos alunos garrafinhas personalizadas, com o nome da instituição.”

Com 24 anos de magistério, Rogéria é pedagoga, com pós-graduação em psicopedagogia e especialização em educação especial. (Fátima Schenini)

Professora compartilha experiência de implantação de laboratório de ensino de matemática em MG

Alunos, em mesas, particicipam de atividades

A professora Renata Rodrigues de Matos Oliveira compartilha com os leitores do Jornal do Professor algumas informações sobre o projeto para a implantação do primeiro laboratório de ensino de matemática da Rede Municipal de Ensino de Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte (MG). Renata desenvolveu o projeto em 2010, na Escola Vereador Jose Ferreira Aguiar, em conjunto com a professora Fernanda Rodrigues Alves Costa.

Formada em matemática, Renata tem especialização em matemática aplicada e em ciências por investigação. Com oito anos de magistério, leciona nas escolas José Ferreira Aguiar e Professor Hilton Rocha. A professora Fernanda está no magistério há dez anos. Também formada em matemática, é aluna do mestrado em matemática na Universidade Federal de São João Del-Rei.

De acordo com Renata, o projeto foi desenvolvido devido ao baixo índice dos estudantes nas provas sistêmicas e nas escolares, bem como pelo desinteresse apresentado pelos alunos em relação à disciplina matemática. Ela explica que o laboratório de matemática proporciona aos estudantes um ambiente favorável para construção de conceitos, procedimentos e habilidades matemáticas; estimula a criatividade, além de incentivar alunos e professores a participar de eventos para troca de experiências e aprimoramento dos princípios e concepções da educação matemática.

O projeto foi inserido na Proposta Político Pedagógica da escola e a carga horária de matemática foi ampliada de três para quatro aulas, sendo uma partilhada com ciência, possibilitando o atendimento quinzenal no laboratório. O local dispõe de um quadro de informes e curiosidades, sólidos geométricos em acrílico, armários e prateleiras para jogos, materiais didáticos e instrumentos de medição, além de computador, impressora, scanner, TV, DVD, retroprojetor e mesas redondas. São atendidos, atualmente, 730 estudante diretamente no laboratório e 200 indiretamente.

Com a implantação dessa proposta de trabalho foi possível perceber alguns avanços, dentre eles: organização de oficinas de confecção de jogos com material alternativo (participação de pais, ex-alunos e voluntários); rede de trocas entre professores; participação e premiação na Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (Obmep) e na feira municipal de ciências e tecnologia.

Julia Tomchinsky: educar para a sustentabilidade é desafio das escolas

Foto de Julia Tomchinsky

Coordenadora do programa Município que Educa, no Instituto Paulo Freire, a educadora ambiental Julia Tomchinsky tem experiência na elaboração, desenvolvimento e acompanhamento de projetos de educação para a sustentabilidade. Com mestrado em educação pela Universidade de São Paulo, tem bacharelado e licenciatura em geografia pela mesma instituição.

Em entrevista ao Jornal do Professor, Julia Tomchinsky diz que a responsabilidade de educar para a sustentabilidade é um desafio das escolas neste século XXI. Segundo ela, a partir do surgimento do conceito escola sustentável, diversas iniciativas têm surgido em diferentes países – Escolas Verdes, Escolas Ambientais e Escolas de Desenvolvimento Sustentável, entre outras experiências, têm demonstrado que a escola pode ser sustentável. Entretanto, salienta, uma escola sustentável exige a reorientação curricular em vista de práticas pedagógicas que eduquem para a sustentabilidade e promovam a cidadania ambiental.

Jornal do Professor – O que é ser sustentável?

Julia Tomchinsky – O termo sustentabilidade é frequentemente associado ao desenvolvimento sustentável, mas é muito mais amplo do que a relação entre as dimensões econômica, social e ambiental. Enquanto o desenvolvimento sustentável diz respeito ao modo como a sociedade produz e reproduz a existência humana, o modo de vida sustentável refere-se, sobretudo, à opção de vida dos sujeitos.

Ser sustentável é entender que a sobrevivência do planeta depende de uma consciência de pertencimento e uma capacidade de escolher o que é melhor em termos individuais (pessoais) e coletivos (públicos).

Ser sustentável é reagir perante a pobreza, o analfabetismo, as guerras étnicas, a discriminação, o preconceito, a ganância, o consumismo, o tráfico, a corrupção e tudo mais que tira a vida das pessoas e do planeta.

Ser sustentável é buscar uma cultura da justipaz (a paz como fruto da justiça).

Ser sustentável depende da maneira como cada ser humano tem os seus direitos assegurados para que possa contribuir na construção de sociedades socialmente mais justas e ecologicamente mais equilibradas.

A sustentabilidade expressa um conjunto de princípios, valores, atitudes e comportamentos que demonstram uma nova percepção que compreende a Terra como um organismo vivo do qual os seres humanos são parte.

JP – A escola pode ser sustentável?

JT – A responsabilidade de educar para a sustentabilidade é desafio das escolas neste século XXI. A sociedade se transformava a passos largos e é ilusório acreditar que a escola no formato que se apresentava, baseado em uma racionalidade instrumental quer reproduz de princípios predatórios e valores insustentáveis, seja capaz de preparar alguém para enfrentar a complexidade da vida.

Neste cenário, nasce o conceito de escola sustentável e iniciativas em diferentes países, tais como Eco-Escolas, Escolas Verdes, Escolas Ambientais, Escolas de Desenvolvimento Sustentável, Escolas Cidadãs, etc. Cada experiência, ao seu modo, tem demonstrado que a escola pode ser sustentável quando questiona o modelo de sociedade atual e promove modos de vida mais sustentáveis. Não basta se concentrar em questões de ecoeficiência – tais como uso de fontes renováveis de energia, minimização de resíduos, bioconstrução, etc. Para além de adaptações de infraestrutura, uma escola sustentável exige a reorientação curricular em vista de práticas pedagógicas que eduquem para a sustentabilidade e promovam a cidadania ambiental a medida que os educandos aprendem a cuidar de si próprios e dos outros, para então cuidarem de um ambiente comum e do planeta.

JP – As escolas devem realizar ações de sustentabilidade? Por quê?

JT – Em todo o planeta foram multiplicadas práticas alienadas e alienantes de interação da humanidade com o ambiente vivido, de descaso com as gerações passadas, presentes e futuras. Perante a impossibilidade de reversão dos danos causados e para sobreviver, a humanidade precisa aprender a transformar a base de sua sustentação de modo sustentável e com equidade social.

Mesmo com a crescente consciência planetária, ainda são muito tímidas as mudanças no modelo educacional. No Brasil, pode-se afirmar que Paulo Freire foi um dos primeiros educadores a denunciar e a demonstrar consistentemente o caráter discriminatório e opressor do sistema escolar brasileiro, a sua verdadeira intenção de se destinar apenas a uma elite.

Hoje a sociedade se caracteriza pela circulação de inúmeras identidades e diversidades, o que exige a formação de sujeitos ativos com consciência de pertencimento e com potencial para transformar o meio em que vivem em favor da sustentabilidade. A construção dessa nova forma de existência no planeta implica aprendizado sobre o lugar onde se vive – escola, bairro, casa, cidade – e sobre como é possível transformá-lo num lugar de vida comunitária em que criação da “vida que se vive” é construída solidária e democraticamente.

Há de se criar um entendimento comum sobre a necessidade de se ressignificar as instituições escolares e de se adotar uma nova forma de governabilidade dos sistemas de ensino, fundamentada na ação comunicativa, na gestão democrática, na autonomia, na participação, na ética da sustentabilidade e na diversidade cultural.

JP – Que tipos de ações de sustentabilidade podem ser realizados pelas escolas?

JT – Ao reorientar o currículo, a comunidade escolar como um todo tem a oportunidade de refletir sobre suas práticas, resgatar, reafirmar, atualizar e vivenciar novos valores na relação com outras pessoas e com o planeta. Esse movimento de ação-reflexão-ação pode ser ampliado nas diferentes áreas do conhecimento. A questão que se coloca é: como os conteúdos desenvolvidos na matemática, português, ciências, história, geografia podem dialogar para despertar nos estudantes, a consciência de que suas vidas não estão separadas do sentido do próprio planeta?

O desafio é superar práticas que burocratizam ou fragmentam a formação para a consciência planetária. Não se pode educar para uma cultura da sustentabilidade reservando dias, horários e disciplinas específicas para este fim, ou por meio de pacotes pedagógicos prontos. É preciso superar a visão de currículo enclausurado nas disciplinas e eleger eixos temáticos e temas geradores que ofereçam ferramentas para a construção de um futuro sustentável.

Quando o currículo é organizado a partir de atividades e projetos que articulam os interesses das turmas, a prática pedagógica oferece vivências sintonizadas com a curiosidade do grupo e contextualizadas com a realidade socioambiental local. Ao interagir, interpretar e se relacionar com uma situação atribuindo-lhe sentido, os alunos passam a perceber o elo entre o que se aprende e a maneira como se sente no mundo

No lugar das diferentes áreas do conhecimento, o currículo da escola sustentável pode ser organizado em campos transversais:

a) Campo da ecopercepção: a educação dos sentidos promove uma forma elaborada de perceber a complexidade do mundo, permitindo a expressão através das diferentes linguagens que podem traduzir as relações estabelecidas entre as pessoas - elas e o ambiente. Envolve todo o universo lúdico do faz de conta, dos jogos, das brincadeiras e vivências nas mais diferentes formas de expressão (oral e escrita, matemática, plástica, musical, corporal, tecnológica, midiática).

b) Campo da participação socioambiental: a educação política e ética prevê, provoca e viabiliza o encontro entre diferentes sujeitos que compartilham espaços e tempos, permitindo formar uma referência para além do seu próprio bem-estar. Envolve as experiências de fala e de escuta, decisão coletiva, de autonomia, de democracia e de participação, considerando o educando um sujeito de desejos e capaz de contribuir para a gestão sustentável dos ambientes em que circula.

c) Campo da ecologia dos saberes: a educação do pensamento valoriza as explicações e interpretações do mundo, inclusive os saberes populares e das diferentes culturas. Envolve as experiências de interesse em conhecer locais e histórias distantes no tempo e no espaço, de compreensão da diversidade étnica e racial, social, geográfica, histórica e ambiental.

d) Campo da ciência ambiental: a educação propicia experiências e observações por meio da ciência, que possibilitam uma aproximação do conhecimento científico e o questionamento do senso comum. Envolve diferentes dimensões do processo de construção do conhecimento: a observação, a investigação, a comparação, a análise, a discussão, a elaboração de explicações sobre as coisas observadas com relatos, registros e conceitos criados pelas próprias crianças.

Esses campos de vivência se inter-relacionam, favorecendo um trabalho integrado e orgânico que respeita a autoria dos professores e a identidade das turmas.

JP – Os gestores escolares podem obter bons resultados colocando em prática ações sustentáveis?

JT - Assumida de forma transdisciplinar, a reorientação curricular das escolas sustentáveis supera a fragmentação dos conteúdos entre as diferentes áreas do conhecimento e viabiliza ações sustentáveis localizadas. Além disso, não busca somente aumentar o conhecimento do estudante, mas desenvolver a mudança de hábitos, atitudes, práticas sociais e competências para a participação ativa na gestão ambiental do seu território. Para alcançarmos sociedades sustentáveis é fundamental optar por práticas pedagógicas que diminuem a distância entre o pensar e o fazer, de modo a acolher o sentir no processo de intervenção no mundo.

Ao reorientar o currículo, outros ecos ressoam e capacidades transdisciplinares são desenvolvidas: sentir, intuir, vibrar, imaginar, inventar, criar e recriar; relacionar e interconectar-se, auto-organizar-se; informar-se, comunicar-se, expressar-se; localizar, buscar causas e prever consequências; criticar, avaliar, sistematizar, tomar decisões, corresponsabilizar-se; ver nascer, tomar vida, crescer os sonhos, os projetos; celebrar a criatividade e a capacidade humana de se reinventar.

JP – De que maneira os professores e gestores podem se preparar para a realização de ações desse tipo?

JT – No Brasil, existem dois documentos de referência elaborados pela sociedade civil que podem fundamentar a práxis pedagógica dos educadores e gestores em ações de sustentabilidade. Conhecê-los é um primeiro passo:

O primeiro é a Carta da Terra, uma declaração de princípios éticos e valores fundamentais para a construção de uma sociedade global justa, sustentável e pacífica. Resultado de uma década de diálogo intercultural em torno de objetivos comuns e valores compartilhados, esse documento internacional busca inspirar todos os povos a assumirem um novo sentido de interdependência e responsabilidade compartilhada, voltado ao bem-estar de toda a família humana, da grande comunidade da vida e das futuras gerações. A Carta desafia a humanidade a examinar seus valores e a escolher um melhor caminho.

O segundo é o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global. De caráter não oficial, ele foi celebrado em 1992 por diversas organizações da sociedade civil, na ocasião do Fórum Internacional das ONGs e dos Movimentos Sociais, que ocorreu no Rio de Janeiro em paralelo à Eco-92. Elaborado durante um ano de trabalho internacional, o Tratado contou com a participação de educadores de crianças, jovens e adultos de oito regiões do mundo (América Latina, América do Norte, Caribe, Europa, Ásia, Estados Árabes, África, Pacífico do Sul). Além de apoiar a ação educativa, o Tratado inspirou a criação de Organizações da Sociedade Civil e de Redes de Educação Ambiental.

Ambos os documentos oferecerem elementos e indicadores para avaliarmos nossa prática pedagógica e identificar o que precisa ser transformado na perspectiva da educação para a sustentabilidade. Mais do que identificar desafios, este exercício permite visualizar possibilidades dentro e fora das escolas, tendo a clareza de onde quer se chegar. A partir daí, professores e gestores podem articular a comunidade escolar para a leitura do mundo em que vivem, identificando o que é de fato significativo e tem potencial pode se tornar tema gerador do Projeto Eco-Político-Pedagógico (PEPP) da escola. O PEPP pode ser inicialmente entendido como um processo de mudança fundamentado nas experiências do passado e nas vivências do presente, que sinalizam novos caminhos, possibilidades e propostas de ação educacional visando ao futuro sustentável. Durante a elaboração do PEPP, necessariamente coletiva, dialógica e democrática, são estabelecidos princípios, diretrizes e propostas de ação para ressignificar as atividades desenvolvidas na escola e demais potencialidades educacionais presentes na comunidade. Sua dimensão eco-político-pedagógica é caracterizada pelo envolvimento dos diversos sujeitos que se perceberam intrinsecamente conectados entre si, com a escola, com a comunidade, com o local, com a região e com o planeta que compartilham.

JP – Como atrair pais, responsáveis e a comunidade em geral para a realização de ações de sustentabilidade?

JT – A escola sustentável se caracteriza por um projeto ecopedagógico que se abre em uma espiral de parcerias com a comunidade em ações de sensibilização, de pertencimento, de corresponsabilização e de intervenção organizada.

O diálogo permanente com a família e a comunidade exige a abertura para que conheçam a rotina escolar, se sintam acolhidos e participem ativamente das decisões. Reuniões, assembleias, encontros, feiras, mostras, exposições, festivais, oficinas são ocasiões estratégicas para disseminar valores e atitudes em prol de uma vida mais sustentável. Constituem-se como oportunidade de integrar culturas e histórias de vida por meio de vivências que problematizam a realidade e articulam ações de sustentabilidade.

Outra forma de envolver a comunidade é motivá-la a participar ativamente na gestão democrática nos colegiados escolares, que podem contribuir para o planejamento da vida escolar e a avaliação institucional. Quando conta com o olhar e as considerações de todos os sujeitos que a constitui (crianças, gestores, professores, familiares, funcionários), a escola tem mais elementos para contribuir para a qualidade de vida da população.

Ainda, há a possibilidade de ampliar espaços de aprendizagem integral quando a escola se articula às oportunidades de educação para a sustentabilidade que existem no seu entorno (potencialidades individuais, instituições, espaços públicos e privados, fontes de informação).

À medida que a comunidade estabelece relações horizontais, democráticas, de confiança, de troca de informações, de colaboração, são estreitados os vínculos entre o ambiente escolar, o local, a região e o planeta.

JP – Quais os países que se destacam na realização de ações de sustentabilidade nas escolas? E de que forma?

JT – De maneira geral, as experiências dos países do Norte tendem a se concentrar em questões de ecoeficiência e, raramente, tocam em questões de justiça socioambiental ou se traduzem em políticas públicas.

No Brasil, este tipo de reflexão tem avançado significativamente. No Plano Nacional sobre Mudança do Clima está prevista a criação de espaços educadores sustentáveis nas escolas e universidades brasileiras, uma estratégia para o enfrentamento das mudanças globais. Este documento conceitua os espaços educadores sustentáveis como aqueles com intencionalidade pedagógica de ser uma referência concreta de sustentabilidade socioambiental.

Em 2010, o MEC aprovou o Programa Mais Educação e, entre os princípios da Educação Integral, definiu o incentivo à criação de espaços educadores sustentáveis com a readequação dos prédios escolares (incluindo a acessibilidade), a reorientação dos mecanismos de gestão escolar, a ampliação de formação de professores, a inserção das temáticas de sustentabilidade ambiental nos currículos. Como desdobramento, a Coordenação Geral de Educação Ambiental do MEC lançou o Projeto Escolas Sustentáveis.

Além disso, ocorrem experiências de escolas sustentáveis desvinculadas de políticas públicas em todo o planeta há tempos. A maioria desenvolve modos de vida mais sustentáveis no seu cotidiano a partir do diálogo entre diferentes saberes e conhecimentos (científicos e populares). O desafio é ampliar essa realidade para além das escolas e introduzi-las nas políticas públicas.