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JORNAL

Educação Infantil

Quinta-feira, 13 de Junho de 2013

Edição 88

EDITORIAL - Educação Infantil

Educação Infantil é o assunto abordado na 88ª edição do Jornal do Professor. O tema foi escolhido por 43,03% dos leitores que votaram na enquete em nossa página.

Apresentamos, nesta edição, experiências desenvolvidas por professores dessa primeira etapa da educação básica, de quatro estados brasileiros. Os profissionais atuam na Escola Municipal de Ensino Fundamental Completo Rui Poester Peixoto, de Rio Grande (RS); Escola Municipal de Tempo Integral Professora Ana Lúcia de Oliveira Batista, de Campo Grande (MS); Centro Municipal de Educação Infantil Nilda Vanette, de Serra (ES); e Centro de Educação Infantil Zé Carioca, de Joinville (SC).

A professora Taciana Mirna Sambrano, do Instituto de Educação da Universidade Federal de Mato Grosso, em Cuiabá, participa da seção Entrevista. E a professora Renata Nalim Basilio Tissi, do Centro Integrado de Educação Pública Maria Aparecida Lima Souto Tostes, de Miracema (RJ), está na seção Espaço do Professor.

Ajude-nos a escolher o tema das próximas edições, votando na enquete colocada em nossa página. E aproveite para colaborar enviando sugestões, críticas, textos e músicas!

Seja bem-vindo!

 

Escola gaúcha integra família ao processo de aprendizagem

Alunos, em círculo, pintam planeta

Com 1.001 alunos matriculados, a Escola Municipal de Ensino Fundamental Rui Poester Peixoto, em Rio Grande, a 300 quilômetros de Porto Alegre, valoriza a relação família e escola e incentiva a participação dos pais na educação dos filhos. “Cuidar e educar envolvem estudo, dedicação, cooperação, cumplicidade e, principalmente, amor de todos os responsáveis pelo processo”, diz a diretora, Elizabete Guimarães.

Para que ocorra a aproximação, a família é chamada a participar de diferentes atividades. “Essa presença constante fortalece as relações e estimula os alunos”, avalia Elizabete. Pós-graduada em gestão escolar, com ênfase em orientação, supervisão e administração, ela está há 25 anos no magistério, dois deles na direção.

Ao desenvolver atividades educacionais, a instituição conta sempre com a participação dos familiares dos alunos. Um exemplo é o projeto pedagógico Procurando Nemo, criado pela professora Carla Dias Coutinho para alunos da educação infantil, na faixa etária de cinco anos. Inspirado no filme de animação de mesmo nome, sobre as aventuras de um peixe-palhaço, Marlin, e seu filho, Nemo, o projeto ganhou proporção pelo fato de a maior parte das crianças ter pais pescadores. “Houve grande colaboração entre família e escola”, diz Carla. “As crianças tiveram noções sobre pesca predatória, poluição dos rios e mares e seres que habitam esses locais.”

Atualmente, Carla desenvolve o projeto Nossos Bichinhos de Estimação, sobre a “posse responsável” de animais. A proposta é diminuir o abandono de animais domésticos. “Começamos com a escolha dos bichos prediletos e procuramos figuras em revistas. Os pais ajudam com desenhos e nomes dos animais que têm em casa”, explica a professora.

Para iniciar o projeto, os estudantes pesquisaram as características do gato e participaram de inúmeras outras atividades, que incluíram o relato de uma professora sobre a vida com seus bichos. Os estudantes tiveram também a oportunidade de refletir sobre os maus-tratos sofridos pelos animais.

Carla pretende organizar outras atividades, como um dia para as crianças mostrarem os bichos de estimação aos colegas e visitas a um veterinário e a uma organização não governamental (ONG) que acolha animais abandonados. Campanha contra os maus-tratos também está nos planos.

A professora criou o blog Deixa que Eu te Conto, que permite aos alunos mostrar aos familiares os trabalhos desenvolvidos nas aulas. “Por meio do laboratório de informática da escola ou do meu notebook, em sala de aula, as crianças relembram as atividades desenvolvidas e me auxiliam na escolha das imagens que serão postadas”, explica.

Graduada em psicologia e em pedagogia, com habilitação em educação infantil e pós-graduação em psicopedagogia institucional, Carla acredita que os projetos têm grande retorno. “É preciso tornar a metodologia atraente, mágica, para que as crianças tenham vontade de acordar cedinho e ir para escola e ali desenvolver e construir a própria aprendizagem”, enfatiza.

Independência — Também professora de educação infantil na mesma escola, Rosana Miranda Cabral é defensora da metodologia de projetos. “Com essa pedagogia, a criança vai despertando a autonomia, a independência e descobrindo formas de aprendizagem em que ela mesma seja protagonista desse processo”, afirma.

Pedagoga, com mestrado em educação ambiental, Rosana envolve as famílias dos alunos nos projetos por entender que são parceiras fundamentais. “Considero extremamente importante que o trabalho do professor esteja articulado e receba auxílio e estímulo da família”, diz. No projeto Higiene e Saúde, desenvolvido este ano pela professora, a família participa de todas as etapas e assume protagonismo em ações como a fiscalização da adoção de hábitos saudáveis no cotidiano das crianças.

Em 2012, Rosana desenvolveu o projeto As Diferentes Infâncias e a Sustentabilidade: Cuidando da Vida, da Escola e do Planeta. A ideia surgiu do comentário de um aluno sobre a quantidade de lixo nas ruas próximas à escola. A partir da pergunta norteadora da proposta — que planeta temos, que planeta queremos? —, foi criado um personagem, o Planetinha, que a cada dia visitava a casa de um aluno. Os pais eram encarregados de registrar o que o Planetinha fazia no período em que estava na casa e quais atitudes poderiam ser tomadas em família para contribuir com o meio ambiente.

As atividades foram intensas e variadas. Em um livro coletivo, as crianças registraram momentos significativos do projeto. Rosana resolveu criar também um jornal, O Ruizinho, para divulgar o trabalho. (Fátima Schenini)

Saiba mais no blogue da escola Rui Poester Peixoto e no blogue Deixa que Eu Conto

 

 

Trabalho sobre cidadania une professoras, alunos e famílias

Alunos caminham em direção ao Museu José Antonio Pereira

Projeto desenvolvido por quatro professoras de educação infantil da Escola de Tempo Integral Professora Ana Lúcia de Oliveira Batista, em Campo Grande, acabou por envolver até as famílias dos estudantes. O projeto Minha Cidade – O Ambiente em que Vivo, sobre o processo histórico da capital de Mato Grosso do Sul, foi criado com o objetivo de estimular os alunos a refletir, participar e intervir na melhoria do bairro Paulo Coelho Machado, onde moram.

“Pensamos em trabalhar o processo histórico, que faz parte do currículo, com mudança de comportamento e de pensamento do aluno, numa perspectiva de mudança do meio ambiente”, explica a professora Cristiane Portela Pereira. Ela é uma das criadoras do projeto, com Eva Adriana Gomes, Luciana Paulino e Silvana Júbrica. O trabalho coletivo foi um dos vencedores da sexta edição do prêmio Professores do Brasil, iniciativa do Ministério da Educação.

Segundo Cristiane, a ideia era incentivar os estudantes a conhecer melhor o bairro e a pensar as mudanças necessárias para torná-lo melhor. “Fazer o aluno realmente ser cidadão”, ressalta. Desenvolvido de julho a outubro de 2012, com 100 alunos de quatro turmas de pré-escola, na faixa etária de 4 a 6 anos, o projeto fez surgir diversas situações de aprendizagem. Assim, além das atividades realizadas na sala de aula, os estudantes também participaram de visitas pedagógicas, como ao Museu das Culturas Dom Bosco. Durante a realização da mostra cultural da escola, os alunos tiveram oportunidade de explicar o processo histórico de Campo Grande aos visitantes e de apresentar maquetes sobre o assunto.

“O que me fez acreditar no sucesso do trabalho foram os comentários dos familiares em relação aos conhecimentos construídos durante o processo de estudos dos alunos”, destaca Cristiane. O que mais chamou a atenção das famílias, de acordo com a professora, foi a possibilidade de o bairro ganhar uma praça. O pedido será enviado por carta ao prefeito, com sugestões de melhorias apresentadas pelos estudantes.

Livro — A realização do projeto levou Cristiane a escrever um livro, A Cidade que Nasceu, com linguagem dirigida a crianças, sobre o processo histórico de Campo Grande. As ilustrações da obra foram feitas pelos alunos. “Eles recebiam páginas do livro e criavam as ilustrações conforme o tema trabalhado”, explica a professora. “Ao fim do processo, montamos o livro, e cada aluno levou para casa o seu exemplar.” Agora, ele pretende publicar a obra.

Como a escola não trabalha com propostas individuais, todos os projetos de educação infantil são elaborados em conjunto. As iniciativas são discutidas em encontros semanais das professoras com a coordenadora pedagógica. “O que é combinado coletivamente é executado em sala de aula”, salienta Cristiane.

Este ano, além de dar continuidade ao projeto Minha Cidade, as professoras vão desenvolver outros. O Pequeno Cientista (experiências), Projeto Matematicando (aprendendo com jogos) e Viajando ao Mundo da Literatura Infantil são alguns deles.

Graduada em pedagogia, com pós-graduação em gestão escolar e em coordenação pedagógica, Cristiane está há oito anos no magistério. (Fátima Schenini)

Saiba mais sobre o Prêmio Professores do Brasil

Saiba mais sobre a ETI Professora Ana Lúcia de Oliveira Batista

Escola capixaba atrai os pais para oferecer ensino de qualidade

Crianças e professoras participam de passeata

O Centro Municipal de Educação Infantil Nilda Vanette, no município capixaba de Serra, na região metropolitana de Vitória, empenha-se em proporcionar ensino de qualidade, que prepare os alunos para o ensino fundamental. Fundada há cinco anos, a instituição atende 380 crianças de 11 meses a cinco anos e 11 meses.

"Trazer a família para a escola é nossa meta principal”, diz a diretora, Eliene Azevedo Braga. Eventos culturais, oficinas, seminários, apresentações culturais e passeatas, além de reuniões pedagógicas, são algumas das atividades promovidas pela escola, sempre com a participação dos pais. “A cada ano, sentimos necessidade de ampliar essa participação, fazendo agendamento de famílias para os eventos como garantia de participação de todos de forma bem tranquila e prazerosa", revela.

Pedagoga, pós-graduada em planejamento, há 30 anos no magistério, Eliene atribui a necessidade de agendamento à grande participação das famílias. Só assim todos podem prestigiar os trabalhos desenvolvidos pelas crianças e seus professores.

Integrante do grupo de vencedores da quinta edição do prêmio Professores do Brasil, em 2011, com o projeto Pequenos Artistas, a professora Geanne Duarte Pollini desenvolve, desde abril, o projeto Embarcando nas Aventuras do Pequeno Príncipe. Um dos benefícios do projeto será a criação, na escola, da biblioteca Pequeno Príncipe, em homenagem ao personagem criado pelo escritor francês Antoine de Saint-Exupéry, na famosa obra de mesmo nome, lançada em 1943.

Além de alunos na faixa etária de quatro anos, estudantes com idade de três anos, de outras duas turmas, participam do projeto. Geanne e as demais professoras envolvidas no trabalho procuram atrair a ajuda das famílias e da comunidade em geral para a criação e funcionamento da biblioteca. Nesse sentido, já promoveram uma passeata das crianças.

O projeto conta com atividades variadas, que incluem a receita de uma tradicional sobremesa francesa, o pavê, e a confecção de aviões com garrafas plásticas. A atividade, que antecede a visita dos estudantes ao aeroclube do município vizinho de Vila Velha para conhecer um avião, por dentro e por fora, é justificada pelo fato de Exupéry ter sido aviador. "O projeto desenvolve ações em sala de aula e em locais que têm a ver com o livro", explica Geanne. Pedagoga, com pós-graduação em psicopedagogia, ela está no magistério há 12 anos. (Fátima Schenini)

 

Escola catarinense aposta em práticas criativas de ensino

Alunos fantasiados de animais

O Centro de Educação Infantil Zé Carioca, no município catarinense de Joinville, a 180 quilômetros de Florianópolis, atende 147 alunos na faixa etária de dois anos e meio a cinco anos. Interessada em promover condições que favoreçam o desenvolvimento integral das crianças, a instituição aposta em projetos pedagógicos, em colaboração com as famílias dos alunos.

Este ano, segundo a diretora da escola, pedagoga Maria José da Silva, os projetos visam à criação de espaços que propiciem experiências com a natureza, como o Cantinho Verde e a Minitrilha. O Cantinho Verde terá uma horta vertical e espaços para experiências e manipulação de elementos naturais, como terra e água. A Minitrilha será construída em uma área verde disponível em área acidentada do terreno da escola.

A diretora explica que a escola sempre busca aproximação com os pais. Este ano, a participação dos familiares é incentivada por meio de redes sociais, com a publicação de fotos de atividades das crianças. “A família pode ver e comentar”, justifica Maria José. Há 23 anos no magistério, cinco deles na direção, ela é pós-graduada em educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental.

A professora Cleitimar dos Santos, que atua em turma com crianças de cinco anos, explica que os alunos vão aprender sobre temas como a água e biodiversidade. Entre as atividades previstas está a apresentação de peça de teatro. Ela registra o trabalho pedagógico em fotos, publicadas no blogue da escola e no facebook.

Pedagoga com habilitação em educação infantil e pós-graduação em educação infantil e séries iniciais, há 12 anos no magistério, Cleitimar trabalha frequentemente com projetos. “Percebo que a prática, bem elaborada, resulta em atividades prazerosas e criativas, norteadas pela ludicidade e pelas relações entre as crianças, com experiências significativas em linguagens”, avalia.

Entre os projetos com melhores resultados, ela ressalta o trabalho realizado com crianças de seis anos sobre o sistema monetário. Os estudantes simularam, na sala de aula, as atividades de um mercado. Com uso de calculadoras, eles observavam os preços, somavam as compras e passavam no caixa. “Foi gratificante ver o quanto aprenderam e observar o interesse na aprendizagem", relata a professora.

Prêmio — A pedagoga Eliana Maria Gastaldi, hoje auxiliar de direção, diz que o trabalho mais bem-sucedido em seus 22 anos de magistério foi o projeto Cineastas Mirins. Com ele, Eliana conquistou um lugar entre os vencedores da terceira edição do Prêmio Professores do Brasil, em 2008. “O envolvimento com a tecnologia fascinou as crianças, e o entusiasmo contagiou a todos durante a execução do projeto", revela.

A turma participou de diversas etapas, desde a escolha da história, construção de cenários, definição de figurino e da trilha sonora, ensaios e gravações, até o processo de edição, com auxílio dos pais e de pessoas da comunidade escolar. “Todos interagiram e contribuíram para que a produção fosse concretizada", salienta Eliana.

Na função atual, como coordenadora dos projetos da instituição, a professora coordenou trabalhos com uso de tecnologias. Entre eles, a produção de um dvd, o Curta Zé Carioca, com quatro curtas-metragens, e de outro com clipes musicais, o Zé Carioca Cantando e Dançando a África. “Agora, gravar cenas de histórias, documentários sobre estudos realizados e produzir vídeos faz parte do cotidiano das crianças”, enfatiza Eliana, que tem especialização em psicopedagogia e em educação infantil. (Fátima Schenini)

Acesse o blogue do CEI Zé Carioca

Professora de matemática lança livro infantil

Renata Tissi e sua mãe

A professora Renata Nalim Basílio Tissi, do município fluminense de Miracema, acaba de lançar o livro de literatura infantil A Floresta Encantada. A história, feita para entreter uma pequenina prima, ficou guardada por 11 anos. E agora é apreciada também por sua filhinha de três anos.

“É gratificante sentir que as crianças gostam da história”, diz Renata. É sua primeira obra de literatura e, apesar de não saber se irá continuar na área, ela ressalta que a experiência está sendo muito boa. “Gostaria de escrever algo na área de matemática, mas voltada para a educação infantil ou o ensino fundamental”, adianta.

Professora de ensino médio e fundamental no Centro Integrado de Educação Pública Maria Aparecida Lima Souto Tostes (Ciep 267), ela leciona as disciplinas de matemática, resolução de problemas matemáticos e física. Com licenciatura em matemática pela Universidade Federal Fluminense (UFF), Renata cursa Ciências Biológicas na Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf), por meio do Centro de Educação Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro (Cederj).

“Tem pessoas que acham estranha essa combinação entre matemática, ciências biológicas e literatura infantil, mas para mim é uma aventura”, diz a professora. “Encontro razões para unir as três áreas", finaliza. (Fátima Schenini)

 

Taciana Mirna Sambrano (UFMT): "binômio cuidar-educar precisa ser vivenciado de fato"

Professora Taciana Mirna Sambrano

Coordenadora do Programa de Formação Inicial para Professores em Exercício na Educação Infantil (Proinfantil) do Ministério da Educação em Mato Grosso, Taciana Mirna Sambrano ressalta a importância do programa, que formou cerca de 700 professores no estado de 2009 a 2011. “A primeira etapa da educação básica não pode mais ficar sujeita a pessoas bem intencionadas apenas ou a funcionários que trabalham com crianças como se esse fazer fosse menor”, destaca.

Taciana enfatiza a importância da formação e da capacitação de profissionais para atuação na educação infantil e diz que o binômio cuidar-educar “precisa ser vivenciado de fato no cotidiano das instituições que atendem educacionalmente crianças menores de seis anos”.

Pedagoga, com doutorado em educação escolar, pesquisadora nas áreas de educação infantil e da relação família-escola, Taciana é professora do Departamento de Ensino e Organização Escolar do Instituto de Educação da Universidade Federal de Mato Grosso, câmpus de Cuiabá.

Jornal do Professor — O que é educação infantil e qual importância ela tem?

Taciana Sambrano — Uma das melhores formas de conceituar a educação infantil, sem passar por concepções teóricas, é valer-se do que ficou estabelecido na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, alterada pela Emenda Constitucional nº 53, de 19 de dezembro de2006). O artigo 29 preconiza: “a educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem por finalidade o desenvolvimento integral da criança até cinco anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade”. A partir do exposto, pensar a importância da educação infantil remete à reflexão sobre o caráter educacional da primeira etapa da educação básica para que se possa promover, de fato, o desenvolvimento integral da criança menor de seis anos por meio de práticas didáticas fundamentadas nos princípios éticos, estéticos e políticos, como bem definido pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, promulgadas em 1999, por meio da Resolução nº 1 da Câmara de Educação Básica (CEB) do Conselho Nacional de Educação (CNE).

Nesse sentido, não cabe mais a discussão sobre a dicotomia assistencial versus educacional no âmbito da educação infantil. As pesquisas têm demostrado que a educação para a infância envolve a sistematização dos saberes que serão transmitidos também para as crianças pequenas. Para além de ter se tornado um jargão entre os professores — prática muito comum na educação em geral —, o binômio cuidar-educar (expressões que encerram em si sentidos próprios, mas que de forma alguma podem ser separadas quando se trata da educação infantil, sob pena de se diferenciar atendimentos, faixas etárias das crianças e espaços em que a atuação profissional acontece) precisa ser vivenciado de fato no cotidiano das instituições que atendem educacionalmente crianças menores de seis anos.

Historicamente, o atendimento institucional a crianças pequenas, desde sua gênese, foi pensado a partir de nomenclaturas que assumiam caráter definidor de sua importância e fundamentavam o trabalho efetivado junto às crianças. Ou seja, desde a origem, convivemos com instituições denominadas creches e pré-escolas ou, ainda, hoteizinhos, centros de educação infantil e jardins de infância, entre tantos outros.

Não convém retomar esse amplo debate histórico, sob pena de dizer mais do mesmo. No entanto, parece importante ressaltar a atualidade do debate sobre a nomenclatura das instituições na medida em que, ainda nos tempos atuais, o grande desafio que a educação destinada a crianças menores de seis anos em ambiente coletivo enfrenta é a segmentação de concepções e de trabalho: segmentação da identidade dos profissionais, das políticas sociais destinadas às crianças e às famílias, do atendimento às crianças a partir de determinada faixa etária, segmentação de instituições que funcionam em prédios separados, de período de atendimento, de salário dos profissionais, de formação exigida destes. Enfim, a segmentação de ideias está, infelizmente, arraigada à educação infantil desde sua gênese, e é mister que desafios sejam superados a fim de que se encontre a integração na educação voltada à infância.

Discutindo, ainda que de forma incipiente, os pontos nevrálgicos da educação infantil acima citados, começo pelo primeiro deles, que é a concepção de criança como ser único, indivisível, que não pode ser pensada apenas a partir da lógica do cognitivo e da aprendizagem de conceitos relacionados intrinsecamente à alfabetização no sentido estrito da palavra. Há que se pensar em uma criança que se desenvolve social, cognitiva, física e emocionalmente. Em cada idade do ser humano há uma forma específica por meio da qual se relaciona com o mundo. A criança pequena se relaciona atribuindo significado e sentido ao que vive. Primeiramente, pelo comportamento emocional para, a partir dele, relacionar-se utilizando a linguagem. Mas essa linguagem não é, de início, a oral e a escrita, como tem exigido a instituição de educação infantil, sobretudo a destinada a crianças de quatro e cinco anos. Antes e concomitante a ela, a criança se expressa por meio de muitas e diferentes linguagens, como expressão oral por meio de poemas, músicas, desenho, pintura, teatro de fantoches, colagem, faz-de-conta, construção com retalhos de papel, tecido, madeira, argila, massa de modelar. A necessidade de expressão surge do que as crianças veem, ouvem, vivenciam, descobrem e aprendem na instituição de educação infantil. A criança pequena se expressa, sobretudo, por meio da brincadeira livre e esta precisa se dar em espaços amplos, arejados, com possibilidades de brincadeira com pares de mesma idade ou não, em espaços com areia, água, materiais e brinquedos selecionados por profissionais.

Ao falar de profissionais, entra-se em outro ponto de segmentação. A educação infantil abarca a creche e pré-escola, e essa divisão na legislação é antes de tudo metodológica — significa que existem especificidades de atendimento a crianças menores e maiores de três anos. Mas, sobretudo, significa que não deve haver separação entre crianças de creche, como provenientes de camadas mais pobres da população, e de pré-escolas, para crianças de camadas mais abastadas. Essa divisão por faixa etária não pressupõe atendimento parcial às crianças maiores de três anos, não pressupõe que os profissionais que trabalham nas creches não devam ser formados, que não tenham um trabalho intencional e planejado a ser feito, que mereçam ganhar menos e que não sejam vistos a partir da identidade de professores. Esses são os maiores desafios para a educação infantil que assolam a primeira etapa da educação básica desde sempre e em todo o país — entendimento equivocado de que a atuação profissional junto a crianças menores de seis anos reflete um trabalho menor, mais simples e que, portanto, pode ser feito por pessoas sem formação, em espaços que não refletem a preocupação com a infância, que não integram as faixas etárias até cinco anos, que não enxergam a infância como um momento de formação social e cultural das crianças a partir dos princípios éticos, estéticos e políticos da educação infantil.

Alguns pais não consideram a educação infantil importante e necessária para os filhos, pois acreditam que as crianças só vão à escola para brincar. Quais os principais conteúdos desenvolvidos nessa etapa? Qual a importância das brincadeiras para o desenvolvimento infantil?

— Minha maior preocupação não é o que os pais pensam a respeito da educação infantil, visto que nessa relação eles não são os profissionais responsáveis pela educação infantil institucionalizada, sistematizada, planejada a partir de uma intencionalidade educativa. Eles são os pais que querem, obviamente, que seus filhos sejam os mais bem preparados do contexto em que se inserem. Minha preocupação incide sobre a falta de clareza dos profissionais que atuam nas instituições de educação infantil, pois estes, sim, têm o dever de reconhecer — e atuar a partir dessa premissa — a educação como caráter inalienável da criança e condição para que seu processo de humanização seja pleno, como indica a perspectiva histórico-crítica. A educação infantil implica aprendizagem de conteúdos historicamente sistematizados também. O professor na educação infantil planeja e sistematiza, intencionalmente, o trabalho educativo junto às crianças, pois na instituição de educação infantil — de caráter educacional e que integra o sistema de ensino — não se realiza o mesmo trabalho que qualquer outra instituição social pode fazer. Ou seja, creche ou pré-escola tem o dever de proporcionar e garantir às crianças o que elas não têm em seu cotidiano familiar.

Um professor ciente de que seu trabalho intencional — portanto, profissional — junto às crianças promove o desenvolvimento integral delas é o que se espera e deseja para a educação infantil. A primeira etapa da educação básica não pode mais ficar sujeita a pessoas bem intencionadas apenas, ou a funcionários que trabalham com crianças como se esse fazer fosse menor. Nossas crianças merecem e precisam de profissionais formados e capacitados para atuar nessa etapa da educação. A diferenciação entre o que se faz na educação infantil e nas etapas subsequentes da educação básica incide nos aspectos metodológicos da atuação profissional em respeito às características específicas da faixa etária atendida. Sob esse aspecto reside a importância da brincadeira povoando as instituições de educação infantil, garantindo às crianças o que elas têm de mais específico, singular e complexo: ser crianças (animadas, tagarelas, brincalhonas, solidárias, criativas etc., desde que o contexto e, sobretudo, os adultos que com elas convivem proporcionem a vivência destas potencialidades).

Uma das linhas de pesquisa de sua atuação é a relação família e escola. Qual a importância da participação da família nas instituições de educação infantil?

— Pensar na relação que a família estabelece com a escola é retomar o papel fundamental que as duas instituições desempenham no desenvolvimento das crianças, na medida em que ambas têm tarefas importantes, distintas e complementares, sendo a relação entre elas indispensável, complexa e desafiadora. Por serem espaços privilegiados e únicos, onde a vida cotidiana infantil acontece, espera-se das duas instituições a construção da identidade da criança, da inclusão na sociedade em que vivem, da promoção de vínculos de pertencimento. Ou seja, família e escola são os primeiros mundos da criança e seus primeiros espelhos. No entanto, os papéis não se confundem. Como citado acima, de um lado temos pais com expectativas, afetos e anseios próprios em relação aos filhos; de outro, profissionais que, intencionalmente, são responsáveis por promover o desenvolvimento infantil — complementando e não substituindo — a ação da família. Os papéis não podem ser confundidos, mas há de se pensar que no meio da relação existe a criança, e suas aprendizagens e desenvolvimento não podem ser negligenciados por adultos que ainda não definiram o que cabe a cada um nessa relação.

Por ser considerada a primeira transição da família para o ambiente educacional coletivo, a entrada das crianças na educação infantil tem sido caracterizada como momento de extrema validade para as experiências infantis, merecedor de atenção, participação e envolvimento dos pais, de forma mais presente e acentuada nessa etapa da educação básica do que nas subsequentes. A forma de se efetivar tal envolvimento e participação pressupõe disponibilidade dos envolvidos, conhecimento sobre maneiras de se garantir tal relação e, sobretudo, alinhamento das expectativas que os representantes das instituições têm uns sobre os outros em relação à criança e seu desenvolvimento.

— A senhora coordena o Programa de Formação Inicial para Professores em Exercício na Educação Infantil (Proinfantil) em Mato Grosso. Como está o desenvolvimento no estado?

— O Proinfantil formou em nível médio, entre 2009 a 2011, quase 700 professores da rede pública que já atuavam na educação infantil em Mato Grosso, porém sem formação. Desenvolvido em parceria pela Universidade Federal de Mato Grosso, Ministério da Educação e secretarias estadual e municipais de Educação, o programa esteve presente em 58 municípios mato-grossenses. Sua importância na vida profissional — e pessoal — de todos os envolvidos excede o que se pode mensurar em números de pessoas formadas, bem como excede as metas explicitadas inicialmente pelos planos de trabalho estabelecidos entre as agências parceiras. Na tentativa de apresentar a riqueza conquistada pelo programa no estado, organizou-se um banco de dados coletados junto aos profissionais envolvidos na condução do programa nos 58 municípios alcançados, composto por fotos de todas as instituições em que havia cursistas do programa, além de depoimentos, em vídeo, de mais de 600 profissionais que fizeram o curso de formação inicial

Após a conclusão do Proinfantil e com base nos dados coletados durante a execução, é possível reiterar a necessidade de habilitação e qualificação dos recursos humanos que atuam na educação infantil como condição sine qua non para a melhoria da qualidade da educação e dos cuidados oferecidos em ambiente coletivo e institucional à criança menor de seis anos. É possível afirmar que Mato Grosso, com o Proinfantil, vive um momento de particular importância, capaz de definir os rumos do desenvolvimento pela articulação de diferentes esferas (federal, estadual e municipal) que objetivam a qualificação profissional e a conquista de aspectos de qualidade para a primeira etapa da educação básica. O trabalho realizado pelo Proinfantil coaduna-se com a necessidade de um projeto de educação infantil que privilegie seu papel pedagógico, considerando o que é específico da ação nessa faixa etária.

Acesse as páginas do Instituto de Educação da UFMT e do Proinfantil na internet