Portal do Governo Brasileiro
Início do Conteúdo
DIARIO
Edición 109 - Prêmio Vivaleitura-7ª Edição
12/01/2015
 
o

Ana Maria Sá de Carvalho (UFC): “A leitura abre as portas para a inclusão social”

Segundo Ana Maria, por trás da aparente simplicidade da leitura existe uma extrema complexidade

Segundo Ana Maria, por trás da aparente simplicidade da leitura existe uma extrema complexidade

Autor:Arquivo pessoal


Com doutorado em educação, mestrado em ciência da informação e graduação em biblioteconomia e documentação, Ana Maria Sá de Carvalho atua, principalmente, nas áreas de educação e formação do leitor, políticas de leitura e administração e dinamização de bibliotecas escolares, públicas e comunitárias. Pesquisadora, desenvolve pesquisas relacionadas à busca de espaços de leitura na internet para a formação de leitores críticos, criativos e participativos. Aposentada da Universidade Federal do Ceará (UFC), mantém vínculo com a instituição por meio da coordenação de projetos de extensão como professora voluntária.

Segundo Ana Maria, por trás da aparente simplicidade da leitura existe uma extrema complexidade, pois ela demanda sensibilidade, espírito atento, crítico e observador, além de escuta atenta e presente. “A leitura abre as portas para a inclusão social na contemporaneidade, apelidada de sociedade da informação, cujos suportes informacionais exigem o conhecimento dos códigos linguísticos e tecnológicos”.

Jornal do ProfessorQual é a importância da leitura na vida das pessoas?

Ana Maria Sá de Carvalho — A leitura nos parece um ato simples, devido à aproximação com o mundo dos signos no dia a dia, com o mundo palpável, visível, que não se apresenta de imediato diante dos nossos olhos. Demanda sensibilidade, espírito atento, crítico e observador. Escuta atenta e presente. Ou seja, por trás da sua aparente simplicidade existe uma extrema complexidade. Leitura é, portanto, o compartilhamento de emoções, que demanda busca por respostas para nossas inquietações. Entretanto, decodificação advinda de um olhar ingênuo, acrítico, isento de sentido e significado não é leitura, pois não alcança a inteireza do mundo. Leitura é reconhecer-se no outro e, com ele, poder multiplicar ideias, saberes, construir uma realidade plena de cuidados diante dos encontros e desencontros da vida. Não podemos esquecer, portanto, que a leitura abre as portas para a inclusão social na contemporaneidade, apelidada de sociedade da informação, cujos suportes informacionais exigem o conhecimento dos códigos linguísticos e tecnológicos.

Crianças e adolescentes, de maneira geral, não se interessam pela leitura. De que maneira as escolas podem incentivar o hábito da leitura entre os estudantes? Nesse aspecto, qual o papel das bibliotecas escolares? Elas podem ser transformadas em espaços de incentivo à leitura? De que forma?

— Discordamos do termo “hábito”. O ato de ler excede, em muito, o que comporta, em termos de sentidos e significados, a palavra hábito. No ato de ler estão imbricados nossos sentidos, intelecto e emoção. Então, não podemos reduzir a leitura somente a hábito. Voltando à questão específica, nossa experiência em bibliotecas escolar e comunitária visualiza uma imensa atração das crianças por livros infantojuvenis. Ao chegarem à biblioteca, eles deslumbram-se folheando os livros e os trocam por outro com muita frequência. Mas, na maioria das vezes, detêm-se numa leitura mais extensa e intensa que mexa mais com suas potencialidades em termos de curiosidade, criatividade, emoção e afetividade.

Com relação aos adolescentes, a leitura dos títulos nas estantes atrai esse público com muita frequência. Se estiverem acompanhados de colegas, chamam logo a atenção dos amigos quando se apresenta alguma familiaridade com os títulos. É nesse momento que o bibliotecário deve ficar antenado nas ações desses visitantes, iniciar o diálogo na tentativa de despertar o sentimento de empatia com os usuários, compreendendo assim seus interesses. O retorno vem rápido, pois geralmente eles selecionam os livros que desejam levar de empréstimo para casa.

A hora da devolução é mais um momento para interagir com o leitor, ao conversar sobre as leituras realizadas e apoiá-los na próxima seleção. Narrações de histórias não podem faltar para as crianças, assim como para os adolescentes. Logicamente, para estes a temática muda. Poesias e histórias de amor são sempre bem-vindas. É fundamental abrir um espaço para debates, deixar falar sobre o que têm vontade de verbalizar.

Temos, portanto, uma massa com um fermento pronto para aumentar o interesse pela leitura. Faltam, portanto, acervo e espaço condizentes com as demandas. Ou seja, bibliotecas, bibliotecários e professores, verdadeiramente, mediadores da leitura.

Estudos em nível internacional têm comprovado que as melhores escolas são aquelas que têm biblioteca, com bibliotecário em tempo integral. Entendemos que a biblioteca apoia não somente o aluno, mas o corpo docente e contribui para a constante aprendizagem.

Os educadores precisam exigir das secretarias de educação que a Lei nº 12.244, de 24 de maio de 2010, que dispõe sobre a universalização das bibliotecas escolares, seja respeitada. Entramos em 2015 com sérios problemas de leitura nas escolas. Sobretudo, com a escassez ou deficiência de bibliotecas escolares. Acreditamos que esse é um problema nacional. Em Fortaleza, visitamos algumas escolas com bibliotecas fechadas (final de 2014) porque, por orientação da Secretaria Municipal de Educação, os professores responsáveis por elas teriam que retornar às salas de aula.

Lembramos, porém, que a Resolução CFB nº 119, de 15 de julho de 2011, que dispõe sobre os parâmetros para bibliotecas escolares, com base no Grupo de Estudos em Biblioteca Escolar da Universidade Federal de Minas Gerais (Gebe/UFMG), deve ser conhecida por toda a equipe escolar.

Como os professores podem estimular a leitura entre seus alunos?

— Em uma pesquisa que realizamos em 2010, em Fortaleza, referente às práticas leitoras dos professores nas escolas, os docentes declararam ressentimento pela falta de investimento em mediação de leitura na formação universitária. Isso resulta numa prática intuitiva, que não traz um retorno coerente com os esforços e dedicação desses docentes. A primeira ação nesse sentido seria um investimento da escola em teorias e práticas de leitura. Uma biblioteca bem estruturada, com acervo condizente com o número de alunos, com bibliotecário e mediadores da leitura, é condicio sine qua non para o desenvolvimento da leitura nas escolas.

Muitos acreditam que as novas tecnologias aceleraram o desinteresse pela leitura. Outros entendem que elas podem contribuir para incentivá-la. Qual é a sua opinião?

— Considerando que as novas tecnologias já estão inseridas socialmente, torna-se de fundamental importância que os professores, sabendo usá-las, a tratem como aliada no desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem, que tem como ferramenta primordial a leitura.

Costuma-se dizer, também, que o alto custo dos livros contribui para afastar as pessoas da leitura. O que pensa a respeito disso?

— O problema maior é a falta de bibliotecas escolares e públicas com acervo condizente com seu público, bibliotecários e professores competentes e uma equipe preparada para mediar a leitura e formar leitores. Lembramos que dar acesso à informação para a população está na Constituição do Brasil, e isso inclui biblioteca e internet.

Qual sua opinião sobre programas e prêmios que visam a estimular a leitura, tais como o Prêmio Vivaleitura? Eles podem contribuir para aumentar o interesse?

— Sem ser contra a premiação de ações que visam a estimular a leitura, pensamos que há uma necessidade imensa de maiores investimentos numa política de Estado, não política de governo. Assim como em mediadores de leitura, em acervos e espaços físicos e valorização do bibliotecário. Que as leis sejam cumpridas e respeitadas, como a Lei 12.244/2010, que torna obrigatória a existência de biblioteca em cada escola, e a Lei nº 4.084, de 30 de junho de 1962, que dispõe sobre a profissão do bibliotecário e regula seu exercício.

De que forma as instituições de educação superior, especialmente as que se dedicam a cursos voltados para a formação de professores, podem contribuir para aumentar o interesse pela leitura?

— Preocupando-se mais com uma formação teórico-prática da leitura, mais condizente com a atualidade. Por exemplo, o estudo da visão sociointeracionista, apresentado por Vygostsky e Backtin; da Teoria da Complexidade, de Edgar Morin; da Teoria da Recepção, dentre outras, igualmente relevantes.

Considerando a notoriedade das novas tecnologias na atualidade os futuros docentes não podem desconhecer o pensamento de Pierre Levy, afeto à cultura virtual contemporânea. Nessa área, destacamos, no Brasil, André Lemos, da Universidade Federal da Bahia, com a teoria Ator-Rede e Cibercultura.

Esse seria, realçando também a formação do professor-leitor — aquele que se torna leitor, na sua trajetória acadêmica —, outro relevante papel das instituições de nível superior na sociedade hodierna. O ser humano, segundo Paulo Freire, está sempre formando-se e transformando-se. Esse movimento, portanto, será natural quando, no exercício das suas lides de educador, o professor formar e transformar o educando em leitor consciente, firme no seu propósito de alcançar a cidadania plena, bem como contribuir de modo efetivo para transformar, realmente, o Brasil, em uma nação–país leitora. Cultura, educação e desenvolvimento sustentável constituem, certamente, a tríade a comandar e fazer do Brasil um lugar cujo respeito humano esteja presente não só na letra das leis que o regem, mas vivido e sentido no cotidiano de cada brasileiro. Não estamos, aqui a sacralizar o ato de ler, mas nele reconhecer um dos canais mais viáveis para promover um outro olhar para o Brasil, diante dos seus, bem como diante das nações que hoje compõem e conformam o mundo.

ENCUESTA

Ajude-nos a escolher o tema da próxima edição do Jornal do Professor. É só clicar em uma das opções abaixo!

Fim do Conteúdo
INFORMAR ERRORES
¿Encontraste algún error? Descríbelo aquí y colabora para que las informaciones del Portal estén siempre correctas.
CONTACTO
Deja tu mensaje al Portal. Dudas, críticas y sugerencias siempre son bienvenidas.