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DIARIO
Edición 17 - Dislexia: como trabalhar com ela?
09/04/2009
 
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Dislexia é quadro raro, com causas diversas

Autor:Fernanda Gomes


Doutora em neurociências e livre-docente em neurologia infantil, a psicóloga Sylvia Maria Ciasca é professora associada da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), onde coordena o Laboratório de Distúrbios e Dificuldades da Aprendizagem e Transtornos da Atenção (Disapre), do Departamento de Neurologia da Faculdade de Ciências Médicas.

Tem experiência na área de medicina, com ênfase em neuropsicologia, atuando principalmente nos seguintes temas: funções corticais superiores, distúrbios da aprendizagem, transtornos da atenção.

Em entrevista ao Jornal do Professor, Sylvia Maria Ciasca fala da dislexia, abordando suas causas, características, e formas de tratamento, entre outros temas.

Jornal do Professor - O que é a dislexia?

Sylvia Maria Ciasca - A dislexia, segundo DSM-IV(1995), caracteriza-se como um transtorno específico no aprendizado da leitura, com rendimento escolar que se situa inferior ao esperado em relação à idade cronológica, ao potencial intelectual e à escolaridade do indivíduo. Portanto a dislexia é uma alteração específica no processo de aquisição e desenvolvimento da leitura, que conduz a falha no processamento da informação recebida quer de forma visual ou auditiva. Esta alteração não é considerada como lesional, mas sim como uma disfunção característica do neurodesenvolvimento. Atualmente uma das definições mais significativas de dislexia foi proposta por Shastry (2007), que se refere ao problema ou dificuldade de leitura como inabilidade específica da leitura: é um transtorno em que as crianças com inteligência e habilidades sensoriais normais mostram déficits de aprendizagem para a leitura. Evidências comprovam sua origem biológica e a preponderância de distúrbios fonológicos. É sem duvida o transtorno da aprendizagem mais estudado na infância”.

Ao se definir dislexia, deve-se primeiro diferenciar:

Transtornos secundários de leitura, onde se evidencia uma causa direta;

Atraso simples em leitura, quando a criança lê de forma deficitária, porém compatível com sua capacidade intelectual e cognitiva;

Dificuldade de aprender a ler, com manifestação de vários déficits como cognitivo, perceptual, sócio-cultural, que conduzem a falha no processo de aprendizagem.

A dislexia apesar de muito falada, é um distúrbio especifico da aprendizagem, considerada de origem neurobiológica e genética, portanto um quadro raro, cuja incidência varia de 5 a 8% das crianças que apresentam dificuldade para aprender e que depende da população avaliada e dos fatores envolvidos nesta avaliação.

JP - Por que ocorre?

SMC – As causas da dislexia são diversas e envolvem múltiplos fatores como: a) diferenças na atividade cerebral, ou seja, o cérebro dos disléxicos mostra áreas que são menos ativadas ou ativadas de forma diferente em determinadas tarefas envolvendo o hemisfério dominante; b) processamento auditivo e visual, o cérebro processa rápida e sucessivamente sons e imagens com funcionalidade diferente nos disléxicos; c) erros de migração neuronal, causados por fatores nutricionais, isquêmicos, medicamentosos, virais, etc ; d) fatores genéticos, ligados a alterações cromossômicas específicas; e) falha no processamento temporal.

As causas da dislexia também estão associadas a alguns fatores de risco como: histórico familial, atraso no desenvolvimento e aquisição da fala, prematuridade e baixo peso ao nascer (inferior a 1500 g).

Os limites entre a dislexia e a normalidade são muito imprecisos. Costuma-se dizer que ambos são pontos de um mesmo contínuo, que iniciaria com a aquisição da leitura normal e terminaria na dislexia em seus diversos graus e subtipos.

Junto ao quadro da dislexia, cabe ressaltar a existência de comorbidades, ou seja sempre temos associado ao problema da leitura, outro problema como o da escrita, do cálculo matemático ou mesmo da atenção e do ambiente interferindo em conjunto, portanto podemos considerar as formas puras como sendo quase uma exceção à regra, tornando o processo diagnóstico difícil e mais inter e multidisciplinar.

JP - Quais as características apresentadas pelas pessoas que têm dislexia?

SMC - A dislexia é caracterizada por uma leitura lentificada, imaturidade fonológica, dificuldade para realizar rimas, confusões têmporo-espaciais, dificuldade em relação a esquema corporal e lateralidade, dificuldade em realizar provas de consciência fonológica, dificuldade para aprender a correspondência letra-som, entre outras que se apresentam de diferentes formas como: confusão de letras com pequenas diferenças na grafia (e – c, i – j, u – v) e confusão entre letras com diferente orientação espacial (b – d, b – p, d – p), inversões, substituições de letras e símbolos numéricos, adição, subtração, repetição de sílabas, palavras e frases, leitura e escrita em espelho, e dificuldade na decodificação.

Porém, cabe ressaltar que estas características devem ser avaliadas, levando-se em consideração o estágio do desenvolvimento da criança, o seu nível de aquisições e, principalmente, as oportunidades que esta criança tem de aprender adequadamente.

Aprender é um processo individual e único, cada pessoa aprende de uma forma, uns com maior rapidez, outros com menor esforço, mas sempre a aprendizagem se faz, principalmente, se coexistirem fatores como: estimulação adequada+motivação+ambiente interno e externo que a propicie.

JP - Como conviver com isso?

SMC – Conviver com a dislexia é sem dúvida difícil, principalmente em uma sociedade que cobra a todo o momento, e onde o fato de não ler ou ler de forma inadequada prejudica muito a criança, a família e a escola.

É preciso inserir, adaptar, programar e intervir de modo adequado para que a criança ou o adulto disléxico possa buscar novos caminhos de aprendizagem.

Mas também é preciso repensar, não só em termos dos distúrbios de aprendizagem, que como a dislexia, tem uma característica neurobiológica e funcional. E como conviver com um número cada vez maior de crianças com dificuldades escolares, cujo fator causal não é orgânico, mas sim pedagógico ligado a inadequações escolares das mais diferentes ordens?

Coloco este repensar como fator fundamental para todos nós da área da saúde e da educação. Como ponto significativo para união de forças, que pensem na criança com dificuldade ou distúrbio de aprender como estímulo da solução de problemas.

JP – Há algum tratamento? Existe algum medicamento ou exercício que pode ser feito para melhorar as condições do cérebro, nesse caso?

SMC – Não existe uma fórmula milagrosa que cure a dislexia, ou um medicamento que solucione todos os problemas porque, cabe dizer, uma vez disléxico sempre disléxico. Mas existem “tratamentos” ou o que chamamos de programas interventivos que apresentam grandes resultados e implicam em trabalho árduo tanto para a criança, como para escola e família.

Através de diferentes técnicas e abordagens, é possível “ensinar” o cérebro a desenvolver outras rotas ou caminhos de processamento da leitura, diferente do usual e comum para maioria das pessoas.

A partir do momento que se ensina e treina a pessoa, existe uma significativa melhora na velocidade de processamento da informação, compreensão da linguagem escrita e falada. Para tanto, é necessário primeiro se identificar a principal dificuldade, determinadas quais habilidades envolvidas estão realmente comprometidas, selecionar e observar a resposta desejada, medir desempenho obtido e compará-lo sempre que possível. Mas principalmente é necessário saber que a criança chega à escola ou ao tratamento, com uma história anterior de aprendizagem, que precisa ser aproveitada para que ela possa projetar este conteúdo no presente, e só assim será possível prever o futuro em relação ao seu desempenho acadêmico e a própria vida.

JP – Que diferença existe entre a dislexia e o déficit de atenção, por exemplo?

SMC – Existem diferenças significativas entre um e outro, infelizmente as pessoas referem-se como se os dois fossem sinônimos.

O Transtorno da Atenção e Hiperatividade (TDAH) é um distúrbio biológico, caracterizado por hiperatividade, impulsividade e distrabilidade. Suas principais causas são: falha nos neurotransmissores usados pelo cérebro para o controle do comportamento; diminuição no metabolismo glicose no sistema nervoso central; fatores genéticos e ambientais; e fatores cognitivos, aprendizagem, motor.

A incidência de TDAH – 3 a 5% da população na idade escolar, maior incidência de meninos, de 5 a 25% das crianças com TDAH tem distúrbio da aprendizagem, e os sintomas de ambos vão persistir na adolescência e na vida adulta

De forma geral, devemos diferenciar os distúrbios da aprendizagem e os transtornos de atenção com disfunções, cujos sintomas podem coexistir e, portanto são considerados comorbidos. Ambos requerem especial atenção dos professores e pais, na tentativa de procurar auxílio e soluções que efetivamente minimizem o problema.

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