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JORNAL
Edição 89 - Química Descomplicada
04/07/2013
 
ou

Márlon Herbert Flora Barbosa Soares (UFG): “Lúdico em educação é alternativa viável e eficiente”

Professor do Instituto de Química da Universidade Federal de Goiás (UFG) e coordenador do Laboratório de Educação Química e Atividades Lúdicas (Lequal), Marlon Herbert Flora Barbosa Soares acredita que o lúdico na sala de aula desperta o interesse dos estudantes. “Aprendemos melhor quando gostamos do que estamos a tentar aprender”, enfatiza.

Licenciado em química, com mestrado e doutorado em química, ele é orientador de alunos de mestrado e doutorado e pesquisador do Núcleo de Pesquisa em Ensino de Ciências (Nupec) da UFG.

Seu grupo de pesquisa estuda todas as nuances relacionadas ao lúdico no ensino de ciências. “Nossos principais resultados mostram que o uso do lúdico em educação é uma alternativa viável e eficiente quando consideramos que nossos jovens precisam de mais ação em sala de aula”, avalia. Soares também coordena o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência do curso de licenciatura em química.

Jornal do Professor — É possível ensinar química de maneira descomplicada? Qual a influência do lúdico na aprendizagem?

Marlon Soares — Há várias maneiras. A primeira delas pressupõe que o profissional saiba química. Uma de nossas grandes preocupações como formadores é o futuro professor, que domina uma ampla base de conhecimentos pedagógicos e curriculares necessários para a prática docente, mas não sabe a química básica, que sai de um curso de química sem o mínimo necessário para exercer a profissão. Assim, se o profissional é plural, ou seja, movimenta seus saberes pedagógicos, curriculares e experienciais com o saber profissional de conteúdo, há uma grande chance de esse professor ser um descomplicador em sala de aula. Um profissional que se movimente entre todos esses saberes pode fazer uma série de proposições experimentais em sala de aula ou em um laboratório, utilizando reagentes alternativos, o que leva a uma experimentação de baixo custo, extremamente lúdica em sala de aula. Daí em diante, podemos citar ainda o uso de atividades relacionadas a gincanas, júris simulados, apresentações teatrais e jogos. Interessante notar que há por trás dessas propostas a ação em sala de aula. O adolescente deve ser retirado de sua atitude passiva em sala de aula para uma atitude de ação, movimento. Assim, um bom professor é o que promove a ação e movimenta todos os saberes docentes aliados a um conhecimento químico necessário para ousar e ensinar adequadamente uma química que seja de fato significativa em sala de aula.

Quanto ao lúdico na aprendizagem, podemos dizer que mexe com estruturas cognitivas antes adormecidas. Inicialmente, o lúdico em sala de aula desperta um interesse praticamente perdido em nossas escolas. Insistimos no termo “desperta”, pois o interesse é intrínseco ao ser humano e não pode ser criado — deve ser despertado. Assim, o primeiro aspecto positivo do lúdico está nesse despertar de características adormecidas nos alunos. Esse interesse, aumentado, propicia motivações diversas de ação em relação aos tópicos e conceitos, o que tem como consequência uma melhoria no aprendizado, considerando-se o fato lúdico de que aprendemos melhor quando gostamos do que estamos a tentar aprender. Como o jogo, o lúdico e tudo mais relacionado a esses termos são características humanas naturais, que nos caracterizam desde as primeiras fases infantis. Fica evidente em alguns aspectos que ensinar pelo lúdico pode trazer resultados satisfatórios a partir do momento que se alia aprendizagem e prazer. É assim na vida. Por que não pode ser assim na escola?

— Uma de suas áreas de pesquisa é sobre o tema Jogos e Atividades Lúdicas Aplicadas ao Ensino de Química. Quais as principais atividades desenvolvidas e os resultados mais importantes já obtidos?

— Nosso grupo de pesquisa estuda todas as nuances relacionadas ao lúdico em ensino de ciências. Temos estudos filosóficos e epistemológicos do uso dos jogos em educação, estudos de aplicações diretas de jogos e atividades lúdicas em sala de aula e, consequentemente, os resultados e análises dessas aplicações. Também estudamos de que forma o jogo pode vir a substituir as avaliações tradicionais na escola, o que nos parece um caminho promissor na aferição da aprendizagem. Nossos principais resultados mostram que o uso do lúdico em educação é uma alternativa viável e eficiente quando consideramos que nossos jovens precisam de mais ação em sala de aula. Já estabelecemos relações de aprendizagem pelo jogo com teorias de aprendizagem piagetiana, vigostkiana e freireana. O valor avaliativo de um jogo é bastante forte, tanto de maneira diagnóstica quanto formativa. Há uma série de outros resultados interessantes que podem ser vistos em dissertações e teses defendidas em nosso grupo de pesquisa.

— Quais as principais atividades desenvolvidas pelo Laboratório de Educação Química e Atividades Lúdicas da UFG, coordenado pelo senhor?

— Além do descrito acima, desenvolvemos uma série de jogos e atividades com professores da rede e orientamos alunos de iniciação científica, mestrado e doutorado em diversas áreas do conhecimento. Temos um grupo sempre presente nas escolas de nível médio, públicas e particulares, com experimentos e jogos, além de orientarmos grupo de alunos do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid). Temos presença forte no Pátio da Ciência da UFG — ambiente lúdico entre o Instituto de Química e o Instituto de Física —, com vários estandes sobre experimentos e demonstrações voltados para alunos de nível fundamental e médio. O laboratório conta com a coordenação também da professora Nyuara Mesquita.

O senhor desenvolve projeto de extensão que envolve a realização de atividades em escolas públicas aos sábados. Em que consiste esse projeto?

— Chamamos o projeto de Os Intocáveis e o Sábado Aberto. Escolhemos algumas escolas públicas, preferencialmente de periferia, e promovemos atividades de extensão, de acordo com o que pretende o professor. Temos palestras, cursos, experimentos alternativos e jogos diversos. Participam do projeto os dois coordenadores do laboratório, um aluno de doutorado, três de mestrado e mais quatro de iniciação científica. Os resultados obtidos estão relacionados à maior presença do aluno e de seus familiares na escola, considerando-se que a comunidade é convidada a comparecer. Além disso, a essa comunidade são ministrados, na escola, cursos sobre fabricação de detergentes alternativos e de sabão líquido. Outro resultado significativo é o índice de aprovação de alunos dessas escolas em vestibulares para o curso de química.

O senhor foi professor de química no ensino médio durante oito anos. Como aproveita essa experiência na formação de novos professores?

— Usamos a experiência de docente em nível médio para ilustrar várias situações possíveis de ocorrer em sala de aula, sejam elas relacionadas a conteúdo, ao relacionamento com o aluno, à estrutura da escola ou ao corpo diretivo e pedagógico, entre outros aspectos. Portanto, fica claro que o sujeito, para ser um bom formador de professores, tem de passar antes pelo nível médio. Precisa ter vivido aquela realidade para poder falar sobre ela. Se vamos ensinar o aluno a fazer um planejamento ou a preparar uma aula experimental para o segundo ano do nível médio, tal aspecto é facilitado se o saber pedagógico presente na disciplina estiver aliado ao próprio saber experiencial de ter vivido exatamente aquela situação. Em síntese: quer ser formador de professor? É importantíssimo que tenha sido professor no nível para o qual você quer formar o professor.

Quando e por que surgiu sua vocação para a área de química?

— Tive uma professora entusiasta da química em meu ensino médio. Por consequência, ela nos deixava também entusiasmados. Ela tinha visão global da química, de sua utilização, de sua caracterização como ciência e de sua importância na sociedade. Por causa dela, procurei ser o melhor professor possível, capaz de mostrar aos alunos a importância e a beleza da química. Tal aspecto mostra a importância do professor, não só de química, na escolha da profissão de nossos jovens.

O senhor teria algum conselho para os professores de química?

— Que estejam, antes de tudo, compromissados com a educação do Brasil. O resto é consequência. Daí, procurar sempre aprender mais, melhorar a prática docente com atividades alternativas, novos desafios. Enfim, fazer a diferença em sala de aula. É sempre isso que os alunos esperam. Para transformar os alunos, temos de nos transformar primeiro. Para formarmos cidadãos, temos de ser cidadãos primeiro. Educar é transformar. Transformar é educar. E, finalmente, façam porque gostam. Não façam nada que não seja satisfatório. Se não gostam do que fazem, não façam. Há sempre alternativas.

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