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JORNAL
Edição 116 - Produção de Textos na Escola
10/08/2015
 
ou

Telma Ferraz Leal (UFPE): “É preciso desenvolver atividades de escrita; podemos ter bons leitores que tenham dificuldades para escrever"

É preciso garantir que os estudantes escrevam mais, com finalidades e interlocutores variados

É preciso garantir que os estudantes escrevam mais, com finalidades e interlocutores variados

Autor:Arquivo pessoal


Professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Telma Ferraz Leal atua no Departamento de Métodos e Técnicas de Ensino do Centro de Educação, na graduação e na pós-graduação. Além de lecionar, ela desenvolve pesquisas sobre prática pedagógica, produção de textos, leitura, alfabetização e oralidade.

Com graduação em psicologia, doutorado e mestrado em psicologia cognitiva, Telma coordena o Centro de Estudos em Educação e Linguagem (Ceel), que desenvolve atividades de formação de professores, produção e análise de materiais didáticos (livros e jogos) e de propostas curriculares.

Em entrevista ao Jornal do Professor, a professora diz que a leitura é essencial para a produção de bons textos, mas não é suficiente. “É preciso desenvolver atividades de escrita”, diz. “Podemos ter bons leitores que tenham dificuldades de escrita.” (Fátima Schenini)

Jornal do Professor De que forma os professores do ensino fundamental e médio podem ajudar os alunos a produzir bons textos? Quais os principais passos para isso?

Telma Ferraz Leal – O ensino de produção de textos precisa ser concebido como um momento em que os estudantes possam interagir por meio da escrita, agindo no e sobre o mundo. Desse modo, um primeiro passo a ser pensado tem relação com o tipo de situação de escrita. É muito importante que sejam pensadas atividades nas quais finalidades claras e relevantes sejam indicadas e combinadas com a turma. Os estudantes precisam saber com qual objetivo estão escrevendo, quem vai ler o texto, em que suporte o texto será inserido, em que espaços ele circulará. Além disso, é importante assegurar trabalhos prévios para que o estudante possa refletir sobre qual gênero será referência para a escrita e os motivos para tal escolha e sobre como se organizam, via de regra, os exemplares desse gênero. É necessário também que sejam realizadas atividades para aprofundamento das temáticas sobre as quais os alunos vão escrever. Por exemplo, se a proposta for de produção de um artigo de opinião para um jornal local, é preciso que os estudantes tenham argumentos para falar sobre o tema, e isso exige informações e reflexões. Se forem escrever uma carta de leitor comentando uma reportagem, precisam ter lido a reportagem e outros materiais que tratem do mesmo assunto para que possam defender seus pontos de vista. Enfim, dependendo da proposta de escrita, é importante ter atividades prévias para aprofundamento sobre o gênero e sobre o tema. É preciso também garantir orientações sobre como planejar os textos e como revisá-los.

Promover concursos de textos pode contribuir para despertar o interesse dos alunos?

– Ter finalidades de escrita, em que os alunos queiram agir socialmente, é o principal elemento para ajuda-los a desenvolver estratégias discursivas variadas, capazes de provocar diferentes efeitos de sentido. Os concursos promovem a escrita com finalidades claras, mas terminam configurando-se como momentos em que a competitividade é assumida como valor central. Temos de pensar na escola como um espaço em que outros valores sejam tomados como mais importantes, como a solidariedade, os cuidados com a natureza, o combate aos preconceitos, dentre outros. Os propósitos de escrita em que os estudantes possam se engajar em projetos coletivos com tais finalidades poderiam ser mais enfatizados do que os que promovem a busca por ser o melhor, o que chega primeiro.

Qual a importância da leitura para uma boa escrita? Como estimular a leitura entre os estudantes?

– A leitura é essencial. A formação de leitores precisa ser um eixo transversal do trabalho que agregue os diferentes componentes curriculares. Por meio da leitura e dos debates sobre o que se lê, os estudantes podem agregar conhecimentos não só sobre as estratégias usadas na sociedade para interagir em diferentes espaços, por meio de diferentes gêneros, como também sobre os temas dos textos. No entanto, é importante que se tenha clareza de que isso não é suficiente. É preciso desenvolver atividades de escrita. Podemos ter bons leitores que tenham dificuldades de escrita.

De maneira geral, os professores da educação básica estão preparados para ajudar os alunos a escrever bem?

– Não podemos falar de modo homogêneo sobre os professores, nem sobre os estudantes. Temos professores que desenvolvem práticas muito boas de escrita e outros que têm dificuldades. Temos alunos que escrevem com relativa facilidade e outros que têm muitas dificuldades. O importante é discutir sobre o currículo escolar e sobre o papel que a escrita assume nesse currículo. Tradicionalmente, no Brasil, temos sobrecarregado os currículos com muitos conteúdos e conceitos, de modo que o tempo pedagógico fica fragmentado. Temos também problemas sérios com o regime de trabalho dos professores, que muitas vezes não garante um tempo para o planejamento das situações didáticas. O ensino de produção de textos, que toma como referência a interação entre os estudantes e outros atores sociais, exige planejamento e pesquisa pelos professores. E nem sempre eles têm tais condições de trabalho. Por fim, o tempo escolar brasileiro é muito curto. Os estudantes ficam pouco tempo na escola. A jornada escolar é baixa, e o ensino de produção de textos exige que o professor desenvolva boas atividades, mas exige também frequência de escrita. É preciso garantir que os estudantes escrevam mais e com finalidades variadas para interlocutores variados. Um currículo fragmentado, com jornada escolar pequena, dificulta o trabalho. Por fim, é necessário que se garanta formação docente continuada. Os professores precisam se engajar em ações de formação continuada. Ter espaço para discutir, socializar e aprofundar estudos é uma das formas de melhorar a qualidade da educação.

O que é possível fazer para tornar os professores mais bem capacitados nessa área? Qual o papel das instituições de educação superior nesse sentido?

– É preciso melhorar o currículo da formação inicial para garantir tempo maior para o estudo sobre os fundamentos do ensino da língua portuguesa e também garantir ações de formação continuada que sejam de fato continuadas. Ou seja, ações que não sejam interrompidas a cada troca de equipes gestoras nas instâncias governamentais.

A senhora coordena o Centro de Estudos em Educação e Linguagem da UFPE. Qual o trabalho ali realizado? Quais os principais resultados já obtidos?

– No Ceel, desenvolvemos ações de pesquisa sobre educação e linguagem, ações de produção de material para formação de professores e para atividades com os estudantes. Contribuímos com o Ministério da Educação e redes de ensino na concepção e implantação de programas de formação de professores e avaliação de materiais didáticos e de avaliações. Desse modo, participamos da equipe que concebeu o programa Pró-Letramento e o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa. Temos trabalhado em diferentes edições do Programa Nacional do Livro Didático, das obras complementares. Criamos os jogos de alfabetização, distribuídos pelo MEC no âmbito do Pnaic, e acabamos de criar um conjunto de jogos para alfabetização incluindo as crianças com deficiência. Contribuímos em discussões sobre a Provinha Brasil e a Avaliação Nacional da Alfabetização, dentre outras ações. Com muitas outras universidades, temos visto que há melhorias significativas nos resultados da educação, mas ainda há muito o que melhorar, e estamos comprometidos com ações que tenham princípios voltados para a educação pública de qualidade para uma sociedade mais justa, mais democrática, mais solidária.

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