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JORNAL
Edição 35 - Escolas Multisseriadas
01/03/2010
 
ou

Escolas multisseriadas contribuem para a afirmação das identidades culturais locais

Salomão Hage coordena o Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação do Campo na Amazônia (Geperuaz).

Salomão Hage coordena o Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação do Campo na Amazônia (Geperuaz).

Autor:Arquivo pessoal


Doutor em educação, com graduação em agronomia e em pedagogia, Salomão Mufarrej Hage é professor do Instituto de Ciências da Educação da Universidade Federal do Pará. Membro da coordenação do Fórum Paraense de Educação do Campo, participa da Rede Universitas: produção científica sobre educação superior no Brasil, integra também o Observatório da Educação Superior no Campo, que envolve diversas universidades brasileiras. Consultor Internacional pelas Nações Unidas na Guiné Bissau, ele coordena a elaboração e implementação do Programa de Formação de Educadores daquele país.

Em entrevista ao Jornal do Professor, Salomão Hage fala sobre as escolas multisseriadas presentes nas áreas rurais de nosso país. Para ele, que é coordenador do Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação do Campo na Amazônia (Geperuaz), a existência da escola multisseriada em uma comunidade contribui para evitar o êxodo de estudantes, fortalecendo as identidades culturais locais, a permanência da população no meio rural e o desenvolvimento da própria comunidade.

Jornal do Professor - O que são escolas multisseriadas?

Salomão Hage – São escolas onde um professor atua em múltiplas séries, concomitantemente, reunindo em algumas situações estudantes da pré-escola e dos anos iniciais do ensino fundamental em uma mesma sala de aula. Em geral são escolas localizadas nas pequenas comunidades rurais, muito afastadas das sedes dos municípios, onde a população a ser atendida não é suficiente para formar uma turma por série. São escolas que possuem infraestrutura precária e funcionam, em muitas situações, sem prédio próprio, na casa de um morador local ou em salões de festas, barracões, igrejas, etc. Grande parte dos professores dessas escolas são temporários e há, portanto, uma grande rotatividade de docentes atuando nas mesmas. Além das atividades docentes, o professor nessas escolas cuida da merenda, da limpeza, das atividades administrativas, e de muitas outras atividades na comunidade.

JP – Quais as vantagens e desvantagens desse tipo de ensino, tanto para alunos quanto para professores?

SH – Quando a escola está presente na comunidade, os estudantes podem acessá-la com mais tranquilidade e a comunidade pode interagir com ela de forma mais efetiva. Em grande parte das pequenas comunidades rurais, a escola é o único espaço em que o estado se faz presente junto à população, atendendo aos direitos de cidadania já assegurados nos dispositivos legais em vigência. A existência da escola na comunidade possibilita à população local acessar os conhecimentos acumulados pela sociedade em seu próprio lugar de origem, contribuindo para a afirmação das identidades culturais locais, para a permanência da população no meio rural e para o desenvolvimento da própria comunidade. Por outro lado, o ensino e a aprendizagem nessas escolas são pouco produtivos, pois os professores enfrentam muitas dificuldades em face do isolamento que vivenciam e do pouco preparo para lidar com a heterogeneidade de idades, séries, ritmos de aprendizagem, entre outras que se fazem presentes de forma mais explícita em uma turma multisseriada.

JP – Qual sua opinião sobre o programa Escola Ativa do Ministério da Educação?

SH – O programa Escola Ativa é hoje a única política pública voltada para as escolas multisseriadas no país. Há outras experiências que vêm sendo desenvolvidas por grupos e organizações não governamentais, mas que têm pouca expressão e abrangência em termos do universo de escolas existentes no país, que atualmente totalizam 49.305 escolas e atendem um total de 1.214.800 estudantes, segundo o Censo Escolar do INEP, de 2009.

O Escola Ativa tem a vantagem de investir na formação dos formadores e educadores que atuam juntos às escolas multisseriadas e ao mesmo tempo disponibiliza material didático e pedagógico às turmas para apoiar os docentes no processo de ensino aprendizagem. Além disso, envolve as universidades no processo de formação dos formadores e docentes, apoiando as secretarias municipais e estaduais de educação no acompanhamento das atividades pedagógicas junto às escolas. As restrições ao programa advêm do fato de fortalecer o ensino seriado e disciplinar nas escolas, na medida em que o material didático pedagógico foi construído nessa perspectiva e de estimular o desenvolvimento de uma única proposta pedagógica, curricular e metodológica para todo o país, desconsiderando a heterogeneidade e a pluralidade identitária que configura as populações do meio rural no país.

JP – Para o senhor, qual a melhor solução para ampliar o atendimento aos estudantes da área rural?

SH – Elaborar e efetivar políticas e práticas educacionais envolvendo o poder público, a universidade e as organizações e movimentos sociais do campo. É preciso “empoderar” os sujeitos e as populações do campo e ao mesmo tempo ampliar a garantia do direito à educação e o controle social das políticas educacionais. Isso precisa ser efetivado com os sujeitos do campo e suas organizações e não para eles. Todos têm o que dizer e contribuir: professores, gestores, estudantes, pais, lideranças da comunidade e os movimentos sociais. Essas políticas e práticas devem afirmar a intermulticulturalidade existente no meio rural brasileiro, considerando os conflitos e as tensões existentes entre os grupos e populações rurais e a convivialidade entre as mesmas.

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