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JORNAL

Criatividade na Sala de Aula

Terça-feira, 14 de Fevereiro de 2012

Edição 67

EDITORIAL - Criatividade na Sala de Aula

Por decisão de 73,49% dos leitores que votaram em nossa página, Criatividade na Sala de Aula é o tema da 67ª edição do Jornal do Professor.

Para tratar deste assunto, procuramos professores e escolas que estejam realizando trabalhos diferentes e criativos na área da educação. Assim, apresentamos o professor André Magri Ribeiro de Melo, da Escola Municipal Adalberto Nobre de Siqueira, em Ipanguaçu (RN); a professora Ana Lúcia Pintro, que leciona em duas escolas de Santa Catarina, uma em Criciúma e outra em Cocal do Sul; o professor César Rodrigues, de Cubatão (SP); e o professor Braz Rodrigues Nogueira, diretor da Escola Municipal de Ensino Fundamental Presidente Campos Salles, em São Paulo, capital.

Nesta edição, temos duas entrevistas: uma com a professora Luciane Weber Baia Hees, do Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp), campus Engenheiro Coelho; a outra com a professora da Universidade de Brasília (UnB), Mônica Souza Neves Pereira.

E na Seção Espaço do Professor, a participante é a professora Ângela de Lourdes Rezende e Araújo, integrante do grupo de vencedores da 5ª edição do Prêmio Professores do Brasil. Ela leciona no Centro Municipal de Educação Infantil de Goiânia (GO).

Ajude-nos a escolher o tema das próximas edições, votando na enquete colocada em nossa página. E aproveite para colaborar enviando sugestões, críticas, textos e músicas!

Seja bem-vindo!

Professor desenvolve projetos criativos em escola potiguar

Professor André e um grupo de alunos, na biblioteca

Os projetos criados por um professor de apenas 20 anos contribuíram para a premiação de sua escola em diferentes ocasiões. Estudante de letras, André Magri Ribeiro de Melo dá aulas de língua portuguesa e literatura na Escola Municipal Adalberto Nobre de Siqueira, em Ipanguaçu, município potiguar a 200 quilômetros de Natal. Na mesma instituição, localizada no assentamento Tabuleiro Alto, área rural do município, ele iniciou a carreira de professor, há quatro anos.

A primeira iniciativa premiada de André foi o projeto Literatura de Terror: uma Visita à Elegante Essência do Medo. A experiência conquistou o primeiro lugar do prêmio Construindo a Nação, edição 2010, no ensino fundamental. Em 2011, o projeto Identidade e Voz do Povo Nordestino na Literatura Regionalista proporcionou à escola o primeiro lugar na mesma premiação. Com esse projeto, a instituição também foi vencedora do Selo Escola Solidária (2011) e conquistou o segundo lugar no Prêmio Educador Nota 10, da Fundação Victor Civita (2011).

Na visão desse jovem educador, o uso de meios alternativos de ensino, como músicas, filmes e desenhos animados, mostra ao estudante diferentes formas de estudar e analisar a língua materna que não sejam apenas o livro didático e o quadro com giz. “Se o aluno sentir prazer em estar na sala de aula e na escola, renderá bem mais, e seu aprendizado sofrerá evolução significativa”, afirma André. Em todo os projetos que desenvolve, ele conta sempre com a parceria dos professores de língua inglesa e ensino da arte.

Seus planos para 2012 incluem uma grande viagem pela história da literatura brasileira com o projeto De Caminha a Lobato: A Evolução da Literatura Brasileira. “Os alunos serão apresentados aos diferentes momentos de construção da nossa literatura e conhecerão as influências recebidas, bem como as relações das obras escritas com os momentos históricos que nosso país vivia a cada surgimento de um novo olhar sobre a palavra”, revela.

A viagem pelas letras terá início com a leitura de uma versão infantil da Carta de Pero Vaz de Caminha (sexto e sétimo anos) e trechos do texto original (oitavo e nono). Terá continuidade com a passagem pelas escolas da literatura brasileira, como o Romantismo e o Modernismo, até chegar às obras de Monteiro Lobato. “Um batalhão de personagens, histórias e emoções pretende bater à porta da escola e das famílias de Tabuleiro Alto”, adianta André.

Ele assegura que os alunos lerão todas as obras indicadas, integralmente. Embora o acervo da biblioteca da escola seja pequeno, os estudantes contam com a ajuda da família para a aquisição de obras, com doações e visitas a bibliotecas municipais. “Entendemos que a leitura dos textos integrais garante maior compreensão do aluno e o insere mais ainda no mundo letrado e literário”, diz o professor. (Fátima Schenini)

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Projetos literários contribuem para ampliar conhecimentos

Escola paulistana inova com aula em salões e criatividade

Estudantes e professores durante aula em salão da escola

Com criatividade e ousadia, práticas de ensino obsoletas são superadas, acredita o professor Braz Rodrigues Nogueira, diretor da Escola Municipal de Ensino Fundamental Presidente Campos Salles, de São Paulo, capital. As salas de aula convencionais da escola, no bairro de Heliópolis, em antiga favela da zona sudeste da cidade, cederam espaço a grandes salões. Neles, professores polivalentes orientam os alunos em todas as disciplinas. Cada salão recebe três professores e cerca de 100 estudantes.

Os roteiros de estudo para os alunos são elaborados pelos professores, que interagem na execução desse trabalho. “Conhecer o que o colega está propondo para os alunos evita a fragmentação do conhecimento”, avalia o diretor. Para executar as atividades previstas no roteiro, os estudantes reúnem-se em grupos de no máximo quatro pessoas. Cada grupo tem autonomia para escolher com o que trabalhar ou estudar diariamente, entre as diferentes propostas para um período de 15 dias. A aprendizagem ocorre pela interação, integração e socialização dos estudantes. As dúvidas são esclarecidas entre os colegas ou por um dos professores.

De acordo com Braz Nogueira, responsável pelas inovações, para superar as práticas pedagógicas inadequadas que predominam na escola em geral — como a que vê o aluno como uma miniatura do adulto, um ser incompleto — seria necessário reorganizar o espaço escolar, torná-lo condizente com a concepção da criança como um ser integral, capaz de tomar decisões, organizar-se individual e coletivamente para aprender a viver e ser portadora de conhecimento. As inovações, de acordo com o diretor, fizeram surgir uma nova ética de convivência, baseada nos princípios de autonomia, responsabilidade e solidariedade, e novos dispositivos de participação. “Instalou-se na escola um movimento de superação do individualismo, do adultocentrismo e da fragmentação do conhecimento”, explica.

Braz Nogueira afirma que as salas de aula tradicionais não conseguem formar alunos prontos para o exercício da cidadania. Em sua avaliação, essa forma de organização do espaço privilegia o individualismo, dificulta a interação e o diálogo, o que torna o aluno passivo. “A sala de aula tradicional não possibilita o desenvolvimento de práticas pedagógicas com base nas concepções de que a criança é um ser integral e competente”, assegura.

Interação — Segundo a professora Adriana Chow Haidar, que leciona na primeira série do ensino fundamental, a maior vantagem da troca das salas de aula convencionais pelos salões é a interação entre os professores e a intensa troca de ideias no manejo das disciplinas. “Forma-se uma equipe muito preocupada com a aprendizagem de qualidade”, diz a professora, pós-graduada em práticas pedagógicas na educação básica. “O peso é dividido com os colegas de trabalho.”

Como atitudes criativas adotadas para melhorar a aprendizagem dos estudantes, Adriana relata que os professores formam grupos de avanço, que oferecem atendimento individualizado aos alunos com mais dificuldades. Também são organizadas rodas de conversação diárias. Nelas, os alunos abordam assuntos relativos tanto à vida escolar quanto à pessoal.

A Escola Campos Salles tem, matriculados, 420 alunos no nível 1 (primeira à quarta série), 420 no nível 2 (quinta à oitava) e 280 na educação de jovens e adultos. (Ana Júlia Silva de Souza)

Professora adota e compartilha aulas criativas de matemática

Fotos de alunos da Escola Demétrio Bettiol no computador

Professora de matemática há 18 anos, Ana Lúcia Pintro considera o magistério uma missão, não um trabalho. Por isso, procura ler, estudar, pesquisar e descobrir novos caminhos capazes de melhorar a educação. “Preciso sentir que estou evoluindo como profissional e como gente”, diz Ana Lúcia, que leciona em nove turmas do sexto ao nono ano na Escola de Ensino Fundamental Demétrio Bettiol, em Cocal do Sul, Santa Catarina, e na Escola Municipal de Ensino Fundamental Padre José Francisco Bertero, em Criciúma, no mesmo estado.

Segundo a professora, uma aula criativa pode aumentar a concentração dos alunos e, assim, contribuir para a aprendizagem, mas aulas inovadoras de matemática exigem metodologia e recursos diversificados. Ela destaca como outro ponto importante para a elaboração de aulas o conhecimento da disciplina. “É preciso estudar muito bem os conceitos para poder planejar aulas criativas.”

Para apresentar as atividades a outros professores, Ana Lúcia criou e mantém vários blogs. “Sinto necessidade de compartilhar o que sei. Quero ajudar os colegas que não têm tempo ou conhecimento para realizar um trabalho diferente.”

Com licenciatura plena em matemática, licenciatura curta em biologia e especialização em educação matemática, ela diz gostar de história e de português e que sempre gostou de aprender. “Escrevi 173 crônicas entre 2003 e 2006”, revela. Em 2007 e 2008, dedicou-se à produção de “baralhinhos didáticos”, com a participação dos alunos na elaboração e digitalização dos jogos. “Como gastei muito tempo na produção do material, resolvi compartilhá-lo na internet para que outros professores pudessem aproveitar”, explica.

Recursos – Em 2009, ela passou a elaborar atividades usando o software gratuito GeoGebra. Desenvolvido para ensino e aprendizagem da matemática do nível básico até o universitário, a ferramenta inclui, em um mesmo ambiente, recursos de diferentes áreas, como álgebra, geometria e estatística. Por meio do software, a professora constatou ser possível desenvolver pelo menos 15 das 37 competências destacadas na Prova Brasil, avaliação desenvolvida pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) do Ministério da Educação. “Percebo que os alunos têm aprendido muitos conceitos matemáticos enquanto se familiarizam com as ferramentas do GeoGebra, da mesma maneira que, um dia, aprenderam a caminhar, a falar, a tomar banho”, analisa.

De acordo com Ana Lúcia, os estudantes demonstram interesse pelas aulas realizadas na sala de tecnologias educacionais. O conteúdo desenvolvido em sala de aula pode ser complementado de forma eficiente. “As aulas não são tão lúdicas quanto pode parecer”, revela. É necessário que os estudantes se concentrem na leitura dos passos exigidos no desenvolvimento das atividades. Também precisam de concentração no manuseio do computador, ao usar as ferramentas. “Os alunos precisam fazer cálculos e observar relações para responder os exercícios solicitados após a construção das figuras”, salienta. Ana Lúcia já criou 50 atividades para utilização do GeoGebra, postadas no blog Os Alunos que Exploravam. (Fátima Schenini e Ana Júlia Silva e Souza)

Confira os blogs da professora Ana Lúcia Pintro

Os alunos que calculavam

Os alunos que jogavam

Os alunos que exploravam

Atividades hot potatoes

Projeto Cocrimat

Professor usa o samba como trabalho interdisciplinar

Professor toca violão para alunos na sala de aula

Um professor de Cubatão, São Paulo, contraria a velha máxima de que samba não se aprende na escola. Com estudantes da rede pública do município da Baixada Santista, ele desenvolve o projeto interdisciplinar Escola com Samba, atividade bem recebida pelos alunos envolvidos. Participam do trabalho estudantes na faixa etária de oito a dez anos, matriculados nas séries iniciais do ensino fundamental.

Na visão de Antonio Cesar Lins Rodrigues, professor de cultura popular nas unidades municipais de ensino Espírito Santo e Antonio Ortega Domingues, o samba tem uma característica, a “propriedade-elo”, por ele considerada mais do que necessária à interligação dos conhecimentos. “O samba, com a sua riqueza semântica, sócio-histórica e esteticorreivindicatória, é um campo do saber que se entremeia na seara disciplinar”, destaca Antonio Cesar, que também coordena a área de educação para a diversidade no Centro de Apoio Pedagógico e Formação Continuada do município e trabalha no projeto Crescer, que atende estudantes de todas as escolas de Cubatão no turno oposto aos das aulas regulares.

O trabalho do professor começa com a seleção das músicas a serem apresentadas aos estudantes. Geralmente, aquelas que fazem parte da história do samba, de autoria de compositores da velha guarda. “As crianças têm contato com as obras desses compositores e trazem suas experiências com o samba como sugestões. Todas são acatadas e, a partir delas, fazemos o nosso planejamento”, explica.

Os alunos escutam as músicas na sala de aula e discutem, em conjunto, o significado das letras. “Discutimos juntos a etimologia das palavras, procurando perceber todas as mensagens sugeridas pelas músicas”, esclarece o professor. Segundo ele, a proposta é que todos aprendam a tocar algum instrumento musical. “Contudo, as crianças aprendem a assimilar a divisão rítmica do samba, de importância vital para se entender a dinâmica musical do ritmo”, destaca.

Antonio Cesar aborda, inicialmente, questões relativas à percepção e ao reconhecimento do samba enquanto manifestação cultural genuinamente brasileira. O próximo passo é a letra da música, as palavras e a interpretação das mesmas. Como exemplo, fala do trabalho que realizou com a música Doce na Feira, de Jair do Cavaquinho. “Ao interpretarmos a letra da música, percebemos o tom sexista presente em algumas partes, o que nos levou a questionar o papel da mulher na sociedade machista”, salienta. O contexto histórico da narrativa proposta pela música também foi analisado, assim como suas implicações regionais. “No caso, foram analisados os porquês das propostas textuais daquela obra musical, a partir da realidade sócio-histórica do compositor, regionalidade etc.”, afirma.

Animação — Os estudantes resolveram criar um clipe musical a partir das experiências vivenciadas em visitas coletivas a uma feira, durante o desenrolar do projeto. Isso resultou em uma animação, com recursos como photoshop e flash, a partir de desenhos elaborados pelos estudantes para retratar o ambiente da feira, em analogia com o ambiente proposto pela música. “É a aplicação das tecnologias da informação e da comunicação (TICs)”, ressalta o professor.

Com licenciatura plena em pedagogia e em educação física, 27 anos de magistério, Antonio Cesar começou a desenvolver projeto de introdução da cultura popular no currículo escolar no fim de 2008. O objetivo era conquistar espaço permanente para as culturas populares — no caso específico do Escola com Samba, para a cultura negra. O propósito do professor é permitir que as culturas populares apareçam na escola não apenas em datas comemorativas e folclóricas e que passem a ser consideradas conhecimento popular legitimado.

Com mestrado em educação, especialização em mídias na educação e em escolarização e diversidade, Antonio Cesar conclui curso de doutorado em educação na Universidade de São Paulo (USP). Sua tese trata do tema Corpos e Culturas Invisibilizados na Escola. (Fátima Schenini)

Projetos literários contribuem para ampliar conhecimentos

Professor André e grupo de alunos

Projetos desenvolvidos pelo professor de língua portuguesa André Magri Ribeiro de Melo, da Escola Municipal Adalberto Nobre de Siqueira, em Ipanguaçu (RN), ajudaram a ampliar os conhecimentos dos estudantes matriculados em turmas do sexto ao nono ano do ensino fundamental.

No projeto Literatura de Terror: uma Visita à Elegante Essência do Medo, desenvolvido no segundo semestre de 2010, cada turma trabalhou com diferentes gêneros de obras literárias, desde histórias em quadrinhos até contos de mistério. Após leitura e discussão em sala de aula, os alunos estudaram os autores e seus estilos. As conclusões foram apresentadas no 1º Letras em Conferência, debate realizado na escola entre os representantes de cada sala. Oficinas e sessões de cinema com apresentação de filmes de mistério fizeram parte das atividades.

O projeto Identidade e Voz do Povo Nordestino na Literatura Regionalista trata de questões típicas do Nordeste. O professor procurou desenvolver diferentes atividades, que incluíram análise de letras de canções; exibição de filmes, documentários e vídeos; organização de saraus de poesia e encenação de trechos de grandes clássicos da literatura regional. O projeto foi concluído com a Semana de Línguas, destinada a apresentar as atividades realizadas na escola às famílias, a outras escolas e a instituições.

“Os alunos passaram a ver a língua portuguesa como organismo vivo, quebrando a ideia de que estudar português é estudar regras gramaticais e só”, revela André. “Eles puderam compreender a língua em sua plenitude, estudando as mais belas manifestações que ela pode assumir: canções, livros, filmes, desenhos animados, obras de arte tipicamente lingüísticas.”

De acordo com o professor, os alunos com dificuldades relacionadas à escrita e à interpretação de textos passaram a ter mais habilidade para escrever e superaram problemas comuns, anteriormente, como argumentação pouco fundamentada e uso de clichês ou obviedades.

Segundo André, outro resultado do projeto foi a criação do jornal comunitário Folha de Tabuleiro. Alunos e outros interessados escrevem, semanalmente, sobre literatura, música e filmes e sobre a relação de tudo isso com a vida de cada um. Na visão do professor, o projeto valorizou o conceito de solidariedade no espaço escolar e na comunidade, que passou a ser uma máxima a ser seguida, independentemente de qualquer outra. “Sem a solidariedade e o espírito voluntário de todos os envolvidos no projeto não teríamos atingido nenhum resultado profícuo”, ressalta. (Fátima Schenini)

Mônica Souza Neves-Pereira (UnB): inserir a criatividade na escola é fundamental

Mônica Souza Neves-Pereira

Professora do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB), Mônica Souza Neves-Pereira atua no Departamento de Psicologia Escolar e do Desenvolvimento (PED). Pedagoga, fez mestrado e doutorado em psicologia na Universidade de Brasília, onde abordou o tema Criatividade.

Consultora em órgãos governamentais nas áreas de educação e psicologia, também participa de dois grupos de pesquisa do CNPq, desenvolvendo projetos nas áreas de desenvolvimento humano, criatividade e educação.

Em entrevista ao Jornal do Professor, a professora Mônica ressalta que um professor criativo não irá, necessariamente, promover um ensino criativo. “Um professor, para ser criativo, necessita de formação consistente, orientação pedagógica de qualidade e ambiente favorável”, defende.

Para ela, inserir a criatividade na escola é fundamental para valorizar o elemento humano. E é uma ferramenta poderosa, que deveria ser valorizada em todos os contextos, para além do educacional.

Jornal do Professor – Quais as principais características de um professor criativo?

Mônica Souza Neves-Pereira – Em primeiro lugar, considero importante definir criatividade. Criatividade é a emergência de algo novo, original e útil. Criatividade está circunscrita ao tempo histórico e aos valores culturais. O que é criativo em uma cultura pode não ser na outra. Há vários graus de criatividade, que vão desde a solução de problemas cotidianos até os grandes feitos dos gênios humanos.

Um professor criativo tem as mesmas características de qualquer outra pessoa criativa, como por exemplo: uma estrutura personológica orientada para o novo, para a descoberta, para o desconhecido, curiosidade, interesses diversos, originalidade, habilidade em solucionar problemas, olhar diferenciado sob o mundo e seus fenômenos, dentre outras. Mas é importante destacar que um professor criativo não necessariamente promoverá ensino criativo. Ser criativo é um diferencial que, certamente, favorece a promoção de ensino criativo, mas não garante. Ensinar é um ofício, um fazer intencional que exige preparo. Ensinar de modo criativo exige preparo duplo: no ofício docente e no entendimento dos fatores que promovem a criatividade. Há um equívoco enorme em relação ao fazer docente. A sociedade entende a docência como vocação, como algo a ser feito por pessoas com “jeito para ensinar” e não é nada disso. Ser professor é ser um profissional. É necessário muito preparo, apropriação teórica, metodológica e experiência. Em relação à criatividade, é a mesma coisa.

JP – De que maneira o professor pode estimular a criatividade entre os alunos?

MSNP – Eu posso fazer uma lista de práticas educacionais que favorecerem a criatividade, como por exemplo:

a) Planeje as aulas e as atividades docentes por meio de atividades que estimulem a imaginação do aluno;

b) Estruture as atividades realizadas em sala de aula de modo a explorar as habilidades e talentos dos alunos;

c) Estimule a participação do aluno em todas as atividades, garantindo um clima de respeito às diferenças e aproveitamento do erro como matéria-prima do crescimento;

d) Planeje exercícios e avaliações diferentes, onde o aluno busque informações extras e seja incentivado a pesquisar, a inserir seus próprios saberes na tarefa;

e) Aceite as contribuições de cada aluno sem julgamentos e críticas. Aprenda a valorizar as idéias de cada criança, em sala de aula;

f) Crie espaço para que seus alunos falem sobre seus sentimentos, com confiança, sem medo de julgamentos ou avaliações. Valorize o clima emocional da sua sala de aula. Procure torná-lo confortável e receptivo;

g) Ensaie todas as maneiras de dar uma aula e dê cada aula de um jeito diferente, envolvendo os alunos a participarem ativamente de cada momento;

h) Ouse, tenha coragem de propor coisas novas em sala de aula;

i) Inclua a diversão em sala de aula, despertando o prazer pelo aprendizado, pela descoberta, pelo novo.

Porém, estas sugestões tendem a ser esquecidas ao longo do tempo. Um professor, para ser criativo, necessita de formação consistente, orientação pedagógica de qualidade e ambiente favorável. A criatividade ter que ser vivida pelo sujeito e não sugerida por meio de exercícios ocasionais.

JP – Nesse sentido, algumas práticas pedagógicas possibilitam melhores resultados do que outras?

MSNP – Sim, como dito na pergunta anterior, sugerir práticas voltadas para o fomento da criatividade vai tornar a aula, no mínimo, mais divertida e original. Há formas de trabalhar neste sentido, mas é importante ter em mente que estas práticas terão resultado enquanto o estímulo for mantido. Ao longo do tempo, elas tendem a diminuir e desaparecer.

JP – Quais as principais barreiras para a criatividade na sala de aula?

MSNP – A principal barreira, a meu ver, é a estrutura do sistema educacional que mina a motivação do professor e do aluno. O ensino, como nós o conhecemos, tende a eliminar a confiança e a autoestima do aluno, uma vez que suas possibilidades de fracasso são consideráveis. Mas, há outras barreiras, como por exemplo:

· Medo do ridículo e da crítica;

· Julgar, ao invés de gerar ideias;

· Autoconceito negativo;

· Desconhecimento de seu próprio potencial;

· Apatia;

· Sentimento de inferioridade e menos valia;

· Medo de arriscar;

· Necessidade de aceitação pelo grupo;

· Expectativas com relação ao papel sexual (coisas de menino X coisas de meninas);

· Consideração da fantasia e imaginação como perda de tempo;

· Pressão por divergir das normas e ser diferente;

· Medo do fracasso;

· Dificuldade em reestruturar um problema, vendo-o sob outro ponto de vista ou enfoque;

· Inabilidade para observar e isolar aspectos diversos de um problema;

· Dificuldade em reformular um julgamento formado a respeito de algo.

JP – Aulas mais criativas possibilitam melhores resultados na aprendizagem?

MSNP – Há vários estudos que mostram uma relação direta entre ensino criativo e desempenho escolar de qualidade. Para além da promoção de ótimos resultados na aprendizagem, inserir a criatividade na escola é fundamental para valorizar o elemento humano, o grande capital de que dispomos e o único capaz de criar o novo. Criatividade é tecnologia de ponta, como já disse, é a única possibilidade que temos de responder às vicissitudes da existência. É uma ferramenta poderosa que deveria ser valorizada em todos os contextos, para além do educacional. Acho a postura de desconsideração da criatividade e do talento, seja em que âmbito for, algo pouco inteligente.

JP – Existe alguma relação entre criatividade e quociente de inteligência, ou seja: alunos mais criativos apresentam maior QI?

MSNP – A relação criatividade e inteligência é controversa. Os estudos mostram uma relação não correspondente. Em pessoas muito inteligentes, nem sempre encontramos criatividade, mas, em pessoas criativas, sempre encontramos muita inteligência. O ensino criativo, portanto, não só promove a aprendizagem e a criatividade do aluno como favorece seus processos de construção do conhecimento. Só há vantagens em inserir a criatividade no contexto educacional.

Projeto que resgata antigas brincadeiras dá prêmio à professora de Goiânia

Ângela na entrega do Prêmio Professores do Brasil

Professora no Centro Municipal de Educação Infantil Colemar Natal e Silva, em Goiânia, há cinco anos, Ângela de Lourdes Rezende e Araújo integra o grupo de vencedores da quinta edição do Prêmio Professores do Brasil. Ela concorreu com o projeto Brincadeiras de Crianças e as Possibilidades de Integração com a Família. Desenvolvido inicialmente com 20 alunos da educação infantil, na faixa etária de cinco anos, o trabalho, voltado para o resgate de antigas brincadeiras, atraiu as famílias para a escola.

Moradora de Hidrolândia, a 30 quilômetros da capital, Ângela leciona desde os 16 anos, quando concluiu o curso de nível médio de magistério. Naquela época, descobriu a paixão pelo ensino. Mesmo lecionando em escolas públicas, onde às vezes faltam recursos para efetivar determinadas propostas de trabalho, ela garante que o mais importante não lhe falta: “Entusiasmo, criatividade, predisposição interna para a mudança, bem como o desejo de cativar as crianças e criar propostas inovadoras, que tornem as aulas mais criativas e façam a diferença na vida dos educandos”.

Formada em pedagogia, com especialização em planejamento educacional e psicopedagogia, ela acredita que o trabalho do educador produz a diferença quando ele gosta do que faz e busca uma formação continuada. “É preciso valorizar muito o professor”, salienta.

Na opinião de Ângela, o magistério é uma profissão capaz de formar pessoas que veem e compreendem a realidade, atuando nessa realidade como elemento de mudança e transformação. “Enquanto educa, o professor forma mentalidades que podem exercer a cidadania e lutar por uma sociedade mais justa e igualitária”, ressalta.

A professora revela que seu trabalho é todo subsidiado por projetos, originados principalmente dos interesses e necessidades do grupo de alunos. “Ao trabalhar com projetos, tornamos nosso currículo mais dinâmico, rico e significativo”, diz. Para ela, os projetos também permitem que a interdisciplinaridade ocorra de forma natural, além de instigar o interesse das crianças e o engajamento da família nas propostas de trabalho. Possibilitam ainda o entrelaçamento dos conhecimentos científicos e não científicos e permitem que as crianças se considerem integrantes do processo. “Aos poucos, elas vão se apropriando de nossa cultura e construindo seus conhecimentos”, enfatiza.

Resgate — O projeto premiado resgatou brincadeiras do tempo em que os pais dos estudantes eram crianças, de modo a ampliar o repertório de atividades lúdicas no cotidiano dos alunos. Procurou, também, integrar o estudo da vida e da obra de Cândido Portinari (1903-1962), com suas brincadeiras populares infantis. Uma parceria com a Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) de Goiânia valorizou também a prática da inclusão. Outra preocupação do projeto foi a de desenvolver experiências significativas por meio de múltiplas linguagens para incentivar a interação entre as crianças e promover a aprendizagem.

De acordo com Ângela, foi possível observar, na prática, que o resgate de brincadeiras mais antigas aproximou os pais da escola, abriu espaço para a criatividade e tornou as crianças mais amigas umas das outras. Contribuiu ainda para a valorização de brincadeiras que estavam esquecidas. “Notamos que o projeto permitiu uma prática mais reflexiva, que valorizou o conhecimento de mundo das crianças, de forma que esse conhecimento fosse vivido, sentido, percebido e explorado por meio de situações diversas”, argumenta a professora. Ela conclui que o trabalho permitiu o entrelaçamento entre o brincar, o cuidar e o educar, ao reconhecer a criança como sujeito de direitos com poder de imaginação, fantasia e criatividade. (Fátima Schenini)

Acesse os projetos vencedores do Prêmio Professores do Brasil 2011

Luciane Weber Baia Hees (Unasp): uma aula criativa motiva o aluno

Professora Luciane Weber Baia Hees, da Unasp

A Professora Luciane Weber Baia Hees, do Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp), campus Engenheiro Coelho, coordena atividades de estágio do curso de pedagogia. Pedagoga, com especialização em supervisão escolar e docência universitária e mestrado em educação, é doutoranda em psicologia da educação na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP).

Para ela, que já exerceu funções de coordenadora pedagógica, administradora escolar e orientadora educacional na educação básica, uma aula criativa motiva o aluno a desejar e buscar o aprendizado.

Ela diz que os elementos que fazem uma aula criativa são muitos, mas a base de tudo é o professor. “Um professor criativo é aquele que faz uso de diferentes estratégias para que, através de sua relação com o aluno, ele fique motivado a aprender”, salienta.

Jornal do Professor – Quais os elementos que fazem com que uma sala de aula possa ser chamada de criativa? O que é um professor criativo?

Luciane Weber Baia Hees – Preliminarmente vamos estabelecer que consideramos uma aula criativa o resultado da relação entre o aluno e um professor dedicado e apaixonado por tudo que faz. É aquela aula que leva o aluno à dizer: Eu quero aprender isto que o professor está falando ou mostrando! Ou seja, aquela aula que motiva o aluno a buscar a compreender e a descobrir o que está sendo proposto. Aquela aula que desperta a vontade de descobrir, aprender e fazer. Uma aula que tem o objetivo de alcançar cada um dos alunos em seus diferentes estilos de aprender.

São muitos os elementos que fazem com que uma sala de aula possa ser criativa, mas a base de tudo isto é o professor. O professor, em uma aula criativa, deve considerar o aluno como ponto central, não o conteúdo, pois se o professor focar suas aulas no conteúdo irá ter como resultado alunos passivos que irão ouvir e reproduzir. No contexto da sala de aula criativa o assunto e o professor se dirigem no sentido de ficar à disposição da aprendizagem do aluno e consequentemente o aluno vai se tornar envolvido, interessado e motivado.

Outros elementos para uma sala de aula criativa são:

· Considerar o aluno ponto principal

· Buscar atividades que saiam da rotina

· Utilizar materiais que chamem a atenção do aluno

· Motivação para o aprendizado através de uma aula significativa

· Tornar o aprendizado um momento feliz e divertido

· Respeitar o estilo de aprendizagem de cada aluno

· Usar música, jogos educativos, jornais, revistas, acontecimentos atuais e atividades lúdicas em suas aulas.

· Sair da sala de aula para aprender, utilizando todo o ambiente escolar.

· Valorizar a opinião dos seus alunos sobre as suas aulas.

· Refletir sobre como foi sua aula todos os dias, o que deu certo, o que foi bom ou não e o que eu poderia ter feito melhor para que o meu aluno realmente aprendesse.

Muitos acreditam que uma sala de aula criativa é aquela com muitos recursos visuais ou tecnológicos, mas não é isto que vai tornar uma sala de aula criativa. Isto sem dúvida ajuda, mas são apenas recursos. O que realmente importa é o que o professor vai fazer com isto. Portanto, um professor criativo é aquele que faz uso de diferentes estratégias para que através de sua relação com o aluno ele fique motivado a aprender.

JP – De que forma uma aula criativa pode colaborar para o aprendizado?

LWBH – Uma aula criativa vai motivar o aluno, e um aluno motivado vai desejar e buscar aprender. Segundo a professora Maria Luiza Kraemer, o professor que adota em sua metodologia um instrumento criativo para desenvolver os seus conteúdos estará criando, automaticamente, um agente motivador que fará com que a aprendizagem seja conduzida e encarada como uma meta a ser conquistada na busca de um prêmio, o aprendizado. Ao preparar uma aula, o professor deve refletir no sentido de durante sua aula proporcionar uma aprendizagem que seja realmente significativa para o aluno.

JP – É possível desenvolver a criatividade dos alunos? De que maneira?

LWBH – Sim, é neste contexto que o professor deve criar situações que levem o aluno a propor soluções e ideias para melhorar o aprendizado em sala de aula. Observamos que muitas vezes os métodos utilizados em sala de aula favorecem o educador e sua rotina. Na maioria das vezes são utilizados por uma acomodação. O professor já tem aquela aula pronta, aquela atividade que já usou outras vezes, então por que preparar outra? A resposta é simples - por que os alunos são outros.

JP – Como usar a criatividade na avaliação? É possível?

LWBH – Existem tantas formas de avaliar e muitas vezes nos deparamos apenas com a mais tradicional e digamos que é a mais fácil para o professor corrigir e mensurar. Não sou contra a prova, mas ela tem o seu lugar dentro do processo de ensino/aprendizagem. Defendo veementemente que o professor deve utilizar pelo menos três instrumentos de avaliação diferentes em cada processo. Ele precisa ser CRIATIVO na avaliação também para atingir aos diferentes estilos de aprendizagem. Tem aluno que sempre vai ter resultados negativos em provas escritas, ou por que fica nervoso, ou por que não escreve bem, etc. Não vou discutir este aspecto aqui, porque não é esta a pergunta, mas a criatividade na avaliação vai ser uma consequência de uma aula criativa.

JP – Você procura transmitir a seus alunos de Pedagogia a importância de ser um professor criativo? Como isso ocorre?

LWBH – Além de inserir em meus conteúdos nas aulas de prática de ensino discussões sobre a sala de aula criativa, busco também aplicar, em minhas próprias aulas, aspectos de uma aula criativa como: relacionar o conteúdo às experiências dos meus alunos, alterar o formato das carteiras dos alunos antes deles chegarem para as aulas, começar a aula com situações reais vividas pelos próprios alunos buscando envolvê-los em todo o processo, ensinar objetivando uma mudança de postura real por parte do aluno frente aquele conhecimento, ensinar de uma forma agradável, feliz, fazer com que meu aluno de graduação, mesmo sendo adulto se sinta valorizado no contexto social e pessoal também e fazer com ele seja capaz de ensinar os outros. Tudo isto, e muitos outros elementos, só se tornarão reais na prática do professor se ele permitir apaixonar-se pela arte e pelo prazer de ensinar e aprender.