22/04/2014
Eliana Dias e Lazuita Goretti de Oliveira
Modalidade / Nível de Ensino | Componente Curricular | Tema |
---|---|---|
Ensino Fundamental Final | Língua Portuguesa | Análise linguística: organização estrutural dos enunciados |
Ensino Fundamental Final | Língua Portuguesa | Análise linguística: processos de construção de significação |
Ensino Fundamental Final | Língua Portuguesa | Língua oral e escrita: prática de produção de textos orais e escritos |
Estratégias:
Recursos:
Antes de começar o trabalho efetivo com o gênero crônica, o professor discutirá com os alunos a respeito do que eles, geralmente, sentem medo. Isso porque o tema da primeira crônica com a qual eles terão contato será uma crônica, intitulada “A mulher sem medo”, de Moacyr Scliar.
Disponível em: <http://1.bp.blogspot.com/-4daeaZ7wxv0/Tt91_TQszUI/AAAAAAAAASs/L5GahkKLfcg/s1600/Fear.jpg>. Acesso em: 24 mar. 2014.
Após uma pequena discussão, durante a qual o professor perguntará aos alunos o que os fazem sentir medo e por que eles têm medo de determinado objeto, situação ou animal, o professor entregará a eles o texto abaixo. Os alunos poderão ser agrupados em duplas para responder ao questionário sobre o texto.
A mulher sem medo
Moacyr Scliar
Meter medo na mulher transformou-se para ele em questão de honra. Tinha de vê-la pálida, trêmula |
Cientistas americanos estudam o caso de uma mulher portadora de uma rara condição, em resultado da qual ela não tem medo de nada.
Folha.com, 17 de dezembro de 2010
Ele não sabia o que o esperava quando, levado mais pela curiosidade do que pela paixão, começou a namorar a mulher sem medo. Na verdade havia aí também um elemento interesseiro; tinha um projeto secreto, que era o de escrever um livro chamado "A Vida com a Mulher sem Medo", uma obra que, imaginava, poderia fazer enorme sucesso, trazendo-lhe fama e fortuna. Mas ele não tinha a menor ideia do que viria a acontecer.
Dominador, o homem queria ser o rei da casa. Suas ordens deveriam ser rigorosamente obedecidas pela mulher. Mas como impor sua vontade? Como muitos ele recorria a ameaças: quero o café servido às nove horas da manhã, senão... E aí vinham as advertências: senão eu grito com você, senão eu bato em você, senão eu deixo você sem comida.
Acontece que a mulher simplesmente não tomava conhecimento disso; ao contrário, ria às gargalhadas. Não temia gritos, não temia tapas, não temia qualquer tipo de castigo. E até dizia, gentil: "Bem que eu queria ficar assustada com suas ameaças, como prova de consideração e de afeto, mas você vê, não consigo."
Aquilo, além de humilhá-lo profundamente, deixava-o completamente perturbado. Meter medo na mulher transformou-se para ele em questão de honra. Tinha de vê-la pálida, trêmula, gritando por socorro.
Como fazê-lo? Pensou muito a respeito e chegou a uma conclusão: para amedrontá-la só barata ou rato. Resolveu optar pela barata, por uma questão de facilidade: perto de onde moravam havia um velho depósito abandonado, cheio de baratas. Foi até lá e conseguiu quatro exemplares, que guardou num vidro de boca larga.
Voltou para casa e ficou esperando que a mulher chegasse, quando então soltaria as baratas. Já antegozava a cena: ela sem dúvida subiria numa cadeira, gritando histericamente. E ele enfim se sentiria o vencedor.
Foi neste momento que o rato apareceu. Coisa surpreendente, porque ali não havia ratos, sobretudo um roedor como aquele, enorme, ameaçador, o Rei dos Ratos. Quando a mulher finalmente retornou encontrou-o de pé sobre uma cadeira, agarrado ao vidro com as baratas, gritando histericamente.
Fazendo jus à fama ela não demonstrou o menor temor; ao contrário, ria às gargalhadas. Foi buscar uma vassoura, caçou o rato pela sala, conseguiu encurralá-lo e liquidou-o sem maiores problemas. Feito que ajudou o homem, ainda trêmulo, a descer da cadeira. E aí viu que ele segurava o vidro com as quatro baratas. O que deixou-a assombrada: o que pretendia ele fazer com os pobres insetos? Ou aquilo era um novo tipo de perversão?
Àquela altura ele já nem sabia o que dizer. Confessar que se tratava do derradeiro truque para assustá-la seria um vexame, mesmo porque, como ele agora o constatava, ela não tinha medo de baratas, assim como não tivera medo do rato. O jeito era aceitar a situação. E admitir que viver com uma mulher sem medo era uma coisa no mínimo amedrontadora.
SCLIAR, Moacyr. A mulher sem medo. In: Folha de S. Paulo, 17 jan. 2011. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1701201107.htm>. Acesso em: 17 nov. 2012.
Após a leitura do texto, os alunos deverão responder, em duplas, ao seguinte questionário:
1. Quanto ao tamanho do texto, ele é curto ou longo?
2. Em relação ao enredo, é uma história longa, com muitos fatos relacionados?
3. Em quanto tempo você acredita que aconteceram os fatos do texto?
4. Quantas pessoas ou personagens participam da história narrada?
5. O tema e os fatos narrados são raros ou comuns?
6. O nível de formalidade é alto, baixo ou mediano?
7. Esse texto foi escrito em 1ª ou 3ª pessoa? Exemplifique.
8. Você acredita que o autor imprimiu uma visão pessoal sobre o fato narrado ou foi totalmente objetivo? Explique.
9. Você caracteriza esse texto como predominantemente narrativo, descritivo, dissertativo (argumentativo) ou expositivo? Explique.
10. Você caracterizaria esse texto como humorístico, crítico, satírico, irônico, reflexivo ou de protesto?
Após os alunos terem respondido ao questionário, o professor fará a correção dos exercícios oralmente, pedindo que diferentes alunos leiam a resposta dada sobre uma mesma questão, de forma a conduzi-los a um consenso sobre o que é uma crônica.
O professor entregará o texto, "Na escuridão miserável", aos alunos, para que eles o leiam, e tentem perceber quais características nos permitem enquadrar os dois textos lidos no gênero crônica.
Na escuridão Miserável Fernando Sabino Eram sete horas da noite quando entrei no carro, ali no Jardim Botânico. Senti que alguém me observava, enquanto punha o motor em movimento. Voltei-me e dei com uns olhos grandes e parados como os de um bicho, a me espiar, através do vidro da janela, junto ao meio-fio. Eram de uma negrinha mirrada, raquítica, um fiapo de gente, encostada ao poste como um animalzinho, não teria mais que uns sete anos. Inclinei-me sobre o banco, abaixando o vidro: (A companheira de viagem. 4. ed. Rio de Janeiro, Record, 1977. p.135-7). |
Disponível em: <http://www.linguaportuguesa.net.br/2010/01/fernando-sabino-na-escuridao-miseravel.html>. Acesso em: 24 mar. 2014.
Após a leitura, o professor deverá elencar com os alunos (anotando no quadro-negro) as características principais do gênero crônica, tomando como base a leitura dos dois textos, sobretudo, as características que seguem:
Para ilustrar um pouco mais sobre o gênero crônica, o professor entregará aos alunos o texto, "A última crônica", de Fernando Sabino, e exibirá para eles o vídeo do Youtube, abaixo, que é uma adaptação da referida crônica.
A última crônica
Fernando Sabino
A caminho de casa, entro num botequim da Gávea para tomar um café junto ao balcão. Na realidade estou adiando o momento de escrever. A perspectiva me assusta. Gostaria de estar inspirado, de coroar com êxito mais um ano nesta busca do pitoresco ou do irrisório no cotidiano de cada um. Eu pretendia apenas recolher da vida diária algo de seu disperso conteúdo humano, fruto da convivência, que a faz mais digna de ser vivida. Visava ao circunstancial, ao episódico. Nesta perseguição do acidental, quer num flagrante de esquina, quer nas palavras de uma criança ou num acidente doméstico, torno-me simples espectador e perco a noção do essencial. Sem mais nada para contar, curvo a cabeça e tomo meu café, enquanto o verso do poeta se repete na lembrança: "assim eu quereria o meu último poema". Não sou poeta e estou sem assunto. Lanço então um último olhar para fora de mim, onde vivem os assuntos que merecem uma crônica.
Ao fundo do botequim um casal de pretos acaba de sentar-se, numa das últimas mesas de mármore ao longo da parede de espelhos. A compostura da humildade, na contenção de gestos e palavras, deixa-se acrescentar pela presença de uma negrinha de seus três anos, laço na cabeça, toda arrumadinha no vestido pobre, que se instalou também à mesa: mal ousa balançar as perninhas curtas ou correr os olhos grandes de curiosidade ao redor. Três seres esquivos que compõem em torno à mesa a instituição tradicional da família, célula da sociedade. Vejo, porém, que se preparam para algo mais que matar a fome.
Passo a observá-los. O pai, depois de contar o dinheiro que discretamente retirou do bolso, aborda o garçom, inclinando-se para trás na cadeira, e aponta no balcão um pedaço de bolo, vistoso, sob o vidro. A mãe limita-se a ficar olhando imóvel, vagamente ansiosa, como se aguardasse a aprovação do garçom. Este ouve, concentrado, o pedido do homem e depois se afasta para atendê-lo. A mulher suspira, olhando para os lados, a reassegurar-se da naturalidade de sua presença ali. A meu lado, atencioso, o garçom encaminha a ordem do freguês. O homem atrás do balcão apanha a porção do bolo com a mão, larga-o no pratinho - um bolo simples, amarelo-escuro, apenas uma pequena fatia triangular. A negrinha, contida na sua expectativa, olha a garrafa de Coca-Cola e o pratinho que o garçom deixou à sua frente. Por que não começa a comer? Vejo que os três, pai, mãe e filha, obedecem em torno à mesa a um discreto ritual. A mãe remexe atentamente na bolsa de plástico preto e brilhante, retira qualquer coisa. O pai se mune de uma caixa de fósforos, e espera. A filha aguarda também, atenta como um animalzinho. Ninguém mais os observa além de mim.
São três velinhas brancas, minúsculas, que a mãe espeta caprichosamente na fatia do bolo. E enquanto ela serve a Coca-Cola, o pai risca o fósforo e acende as velas. Como a um gesto ensaiado, a menininha repousa o queixo no mármore e sopra com força, apagando as chamas. Imediatamente põe-se a bater palmas, muito compenetrada, cantando num balbucio, a que os pais se juntam, discretos: "Parabéns pra você, parabéns pra você..." Depois a mãe recolhe as velas, torna a guardá-las na bolsa. A negrinha agarra finalmente o bolo com as duas mãos sôfregas e põe-se a comê-lo. A mulher está olhando para ela com ternura - ajeita-lhe a fitinha no cabelo crespo, limpa o farelo de bolo que lhe cai ao colo. O pai corre os olhos pelo botequim, satisfeito, como a se convencer intimamente do sucesso da celebração. Dá comigo de súbito, a observá-lo, nossos olhos se encontram, ele se perturba, constrangido - vacila, ameaça abaixar a cabeça, mas acaba sustentando o olhar e enfim se abre num sorriso.
Assim eu quereria minha última crônica: “que fosse pura como esse sorriso".
SABINO, Fernando. A Companheira de viagem. Rio de Janeiro: Editora do Autor, 1965, p. 174.
Disponível em: <http://intervox.nce.ufrj.br/~jobis/s-ult.html>. Acesso em: 24 mar. 2014.
Após a leitura do texto, o professor exibirá o vídeo abaixo:
Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=MODgSsn6XBM>. Acesso em: 24 mar. 2014.
Após a leitura do texto e exibição do vídeo, o professor discutirá com os alunos sobre a temática da crônica, "A última crônica", que trata tanto sobre o próprio fazer literário (o narrador não estava encontrando inspiração para escrever), quanto sobre a beleza que pode ser encontrada nos fatos do cotidiano (a família humilde que festeja o aniversário da filha num botequim).
Disponível em: <http://envolverde.com.br/portal/wp-content/uploads/2012/01/pessoa-escrevendo.jpg>. Acesso em: 24 mar. 2014.
Após terem discutido o texto, "A última cônica", o professor pedirá aos alunos que produzam uma crônica, que posteriormente será lida para os colegas.
Para contextualizar, os alunos poderão escrever a partir da seguinte proposta:
O(a) professor(a) de Língua Portuguesa lhe pediu para escrever uma crônica. Você estava sem ideia sobre o que iria escrever e decidiu ir a uma sorveteria perto da sua casa para pegar inspiração, chegando lá (ou no caminho para a sorveteria), você viu uma situação que poderia ser transformada numa crônica...
Lembre-se das características da crônica:
Não se esqueça de dar um "tom" para a sua crônica (humorístico, crítico, satírico, irônico, reflexivo e/ou de protesto).
Atividade 3
O professor pedirá aos alunos que leiam as crônicas produzidas. Ao final, deverá apresentar um feedback para os alunos, se eles escreveram textos dentro do gênero estudado, e reforçará com eles quais as características do gênero crônica foram ou não contempladas nos textos produzidos.
Professor, segue abaixo algumas sugestões de textos que tratam sobre o gênero crônica:
Crônica.
Disponível em: <http://www.brasilescola.com/redacao/cronica.htm>. Acesso em: 24 mar. 2014.
O GÊNERO CRÔNICA E A PRÁTICA ESCOLAR
Disponível em: <http://www.fflch.usp.br/dlcv/lport/pdf/maluv017.pdf>. Acesso em: 24 mar. 2014.
Crônica: Limites entre jornalismo e literatura
Disponível em: <http://educacao.uol.com.br/disciplinas/portugues/cronica-limites-entre-jornalismo-e-literatura.htm>. Acesso em: 24 mar. 2014.
Os alunos serão avaliados qualitativamente quanto:
Em relação aos textos produzidos pelos alunos, o professor deverá observar:
Sem estrelas 0 classificações
Denuncie opiniões ou materiais indevidos!