Logo Portal do Professor

JORNAL

Arte na Escola

Segunda-feira, 23 de Janeiro de 2012

Edição 66

EDITORIAL - Arte na Escola

Por escolha de 45,72% dos leitores que votaram na enquete colocada em nossa página, o tema da 66ª edição do Jornal do Professor é Arte na Escola.

Selecionamos para apresentar a vocês, experiências desenvolvidas por professores do Colégio Estadual Professor José dos Reis Mendes, em Trindade (GO); da Escola de Educação Básica Municipal Professora Curt Brandes, em Pomerode (SC); do Ginásio Experimental Carioca Rivadávia Corrêa, no Rio de Janeiro (RJ); e do Projeto Fazendo Arte, subordinado à Secretaria Municipal de Educação de Tremembé (SP).

A professora da Faculdade de Educação da USP, Rosa Iavelberg, é a entrevistada desta edição. Para ela, que é uma das autoras dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) na área de artes, o professor de artes deve ter formação teórica e prática para que as aulas de artes sejam plenas e cumpram o seu papel curricular.

No Espaço do Professor, temos a participação de uma das premiadas na 5ª edição do Prêmio Professores do Brasil. É Sinara Adriana Soares, que leciona português e inglês na Casa Familiar Rural de São Mateus do Sul (PR). Ela recebeu o prêmio pelo projeto Horta Mandala: Mãos na Terra.

Aproveitamos para sugerir que acessem algumas sugestões de aulas sobre o tema Arte, disponíveis no Portal do Professor.

Arte efêmera - Projetos urbanos nas paredes da escola

Pichação ou Arte nas ruas? Formas de se expressar

Arte- expressão e não repressão - Intervenções urbanas artísticas

Intervenção urbana ou vandalismo?

Arte Povera – Possibilidades na Escola

Ajude-nos a escolher o tema das próximas edições, votando na enquete colocada em nossa página. E aproveite para colaborar enviando sugestões, críticas, textos e músicas!

Seja bem-vindo!

Estudantes trocam a pichação pelo grafite em escola de Goiás

Grupo de alunos em frente ao muro grafitado

O muro pichado do Colégio Estadual Professor José dos Reis Mendes, na periferia de Trindade, município goiano de 104 mil habitantes, a 18 quilômetros de Goiânia, virou espaço para a grafitação — grafitagem, na linguagem dos adeptos. O projeto de arte criado em 2011 deu tão certo que a direção da escola pensa em ampliá-lo para o ano letivo de 2012. A ideia é que o muro interno da instituição seja aproveitado como espaço de expressão artística dos 700 alunos do ensino fundamental e médio.

“O prédio da nossa escola é antigo e estava sujo”, conta a diretora, Wannessa Cardoso Silva. “Como os alunos pichavam o muro que cerca o quarteirão, aproveitamos a criatividade deles porque os mesmos alunos que picham também sabem desenhar.”

Carlos Henrique de Castro Mendes, 15 anos, participava da turma dos pichadores. “Era legal pichar; tinha adrenalina”, diz o estudante do primeiro ano. Ele costumava assinar as pichações sob o apelido de Caos. “E quanto mais alto e difícil, mais a gente ficava famoso.”

O projeto de arte, do Muralismo ao Grafite, fez Carlos Henrique refletir. No muro, ele desenhou a prisão de um pichador por um policial. “Isso quase aconteceu comigo”, revela. Hoje, ele e outros colegas pedem para grafitar em muros pela cidade. “É muito melhor; o grafite é um jeito de expressar”, diz o jovem, que aprendeu, com o projeto, um pouco sobre a história dessa arte.

Coordenadora do projeto, a professora de história Maria Aparecida Pereira Laura pesquisou sobre o movimento artístico. “O primeiro grafiteiro famoso foi o norte-americano Jean Michel Basquiat, um jovem negro, usuário de drogas”, explica. Basquiat deixava mensagens poéticas nas paredes dos prédios abandonados de Manhattan, em Nova York. “Foi um movimento artístico de ruptura, de contracultura, que se destacou no processo de independência das Américas, principalmente do México”, continua a professora. “O muro era usado como espaço para a manifestação popular.”

Orgulho — Satisfeita com o resultado do projeto de artes, a diretora adianta que o novo visual do colégio ganhou elogios da comunidade e até fez aumentar o pedido de vagas para novos alunos. “O clima é outro na nossa escola depois desse trabalho do grafite” assegura Wannessa. “Os alunos mudaram o comportamento, chamam os pais para visitar a escola e ver o muro pintado, estão mais interessados nos estudos e se conscientizaram de que a escola é um espaço público, que também pertence a eles.”

Para dar continuidade ao projeto, a diretora propõe que se pinte também o muro interno. Ela pretende envolver, agora, os professores de biologia. “Todas as ruas do bairro têm nomes de flores, como gardênia e amor-perfeito, e plantas, como vitória-régia; por que não pintá-las pela escola, com os nomes científicos?”, sugere.

A professora Maria Aparecida, que coordenou o projeto, pensa em algo ainda maior. Em suas pesquisas, ela descobriu como a cultura de rua é valorizada por escolas públicas da Argentina. A partir daí, pensa em aproveitar o laboratório de informática para conectar os estudantes. “Os alunos vão poder aprender sobre arte, a falar espanhol e também a fazer uso da informática.”

Origem — A palavra grafite tem origem na língua italiana (graffiti, plural de graffito). O nome era utilizado, desde o império romano, para as inscrições feitas em paredes. Atualmente, o grafite é traduzido como inscrição caligrafada ou desenho pintado sobre um suporte não convencional, como os muros das cidades. Por isso mesmo, por muito tempo, foi visto como contravenção. Agora, é considerado expressão artística urbana. Ou seja, o artista usa espaços públicos para criar.

Grafite não é pichação, embora muitos grafiteiros respeitáveis, como Os Gêmeos — os paulistas Otávio e Gustavo Pandolfo —, admitam ter começado como pichadores. A prática do grafite espalhou-se a partir do movimento de contracultura de maio de 1968, quando os muros de Paris eram o suporte para inscrições de caráter poético-político. No século atual, o grafite é arte exposta até em museus. (Rovênia Amorim)

Arte extrapola a sala de aula em escola de cidade catarinense

Aluno Roger Maas pinta quadro

Cata-ventos para brincar na hora do recreio, telhas floridas de cerâmica, maquetes inspiradas em Di Cavalcanti, mosaicos que destacam a geometria de Escher, máscaras de diferentes culturas, e impressionismo na tela pintada com cotonete. A criatividade, o improviso e a riqueza de informações sobre a arte no decorrer na história da humanidade empolgam alunos, professores, pais e a comunidade vizinha à Escola de Educação Básica Municipal Professora Curt Brandes, em Pomerode, município de 27,7 mil habitantes, no nordeste de Santa Catarina.

“Eu não entendo nada de artes, mas tenho professores que abraçam a causa e vejo que os alunos aprendem de fato. Eles sabem não só a história da arte, quem são os grandes artistas, como têm noção prática das técnicas usadas”, diz a diretora Eliana Koch Schimitt. Para o ano letivo de 2012, os alunos terão uma sala própria para as atividades. “Será uma sala-ambiente, adaptada, com mobiliário adequado”, adianta a diretora.

A professora Moara Gustmann dá aulas de arte aos alunos do primeiro ao sexto ano; Gláucia Maria Erbs, aos estudantes do quinto ao oitavo. Elas seguem a apostila adotada pela prefeitura — o conteúdo é seguido a cada ano letivo —, mas recorrem à criatividade e ao improviso para dar vida aos trabalhos dos alunos. No projeto sobre impressionismo, por exemplo, Gláucia recorreu às técnicas de canetinha e canetão; guache na ponta arredondada do pincel e cotonete.

“Todas as telas ficaram lindas porque cada criança tem habilidade de trabalhar com técnicas diferentes”, empolga-se a professora, que tem descoberto talentos em suas aulas semanais, de duas horas. Roger Maas, 13 anos, que concluiu o sétimo ano, é um deles. Ele pinta paisagens e flores em telhas de cerâmica e aprendeu a desenhar retratos com giz pastel seco em papel canson. O talento do adolescente já é reconhecido na cidade. Tanto que ele passou a receber encomendas. “Vou passar as férias trabalhando”, diz. Roger pretende fazer faculdade de artes plásticas. “Meu sonho é ser artista”, acrescenta. O pai, artesão, está orgulhoso com o aprimoramento do talento do filho. “Ele já desenhava muito bem desde pequeno, e nas aulas de artes aprendeu mais e se destacou”, diz Gerson Maas. “Fico feliz porque é um dom e ele gosta do que faz.”

As aulas de artes não ficam restritas à sala de aula. No turno oposto ao das aulas (contraturno), os estudantes podem fazer cursos extras, também abertos à comunidade. O projeto Arte e Educação na Escola recebe também alunos hiperativos e com transtornos. “Meu filho melhorou a concentração, a coordenação motora e está mais tranquilo”, conta Simone Jeger, mãe de Lucas Jeger, 13 anos, portador da síndrome de Tourette, que se caracteriza por tiques, reações e movimentos bruscos e vocalização repetida.

Entre os cursos abertos à comunidade estão pintura em tecido, crochê, decupagem em MDF (medium density fiberboard — fibra de média densidade), vidros e telhas, pinturas em parede (texturização), pátinas e até da técnica chinesa feng shui. “É um público diferente, que quer aprender a fazer arte para ganhar dinheiro e complementar a renda familiar”, explica a professora Gláucia, que levou as aulas também para as turmas da educação de jovens e adultos.

Arte moderna — Nas aulas da professora Moara, a inspiração foi a Semana de Arte Moderna de 1922, na qual se destacaram artistas como Di Cavalcanti (1897-1976) e Tarsila do Amaral (1886-1973). As crianças ainda aprenderam sobre o estilo abstrato da japonesa naturalizada brasileira Tomie Ohtake e a obra do artista plástico brasileiro Juarez Machado. “Levei a música A Bicicleta, do Toquinho, para complementar o trabalho sobre Juarez Machado”, diz Moara. “Eles produziram uma bicicleta em arte tridimensional, usando papel, depois a colaram em bidimensional e desenharam um cenário.”

Nascido em Joinville, Santa Catarina, em 1941, Juarez Machado elegeu a bicicleta como tema da primeira exposição, aos 19 anos. “Passei toda a minha infância e adolescência em cima de uma bicicleta”, destaca. “Foi e ainda é o grande tema de meus desenhos, pinturas e esculturas.”

Se a bicicleta empolga a criançada nas aulas de artes, por que não brincar de cata-vento na hora do recreio? A professora de educação física Sorinéia Goede teve a ideia como forma de resgatar antigas brincadeiras. “A produção faz parte de projeto que estou elaborando sobre o resgate das brincadeiras antigas da comunidade de Pomerode”, explica. Alunos do oitavo ano ajudaram na confecção dos cata-ventos, oferecidos às turmas do primeiro ao terceiro ano. (Rovênia Amorim)

Projeto revela talentos em escolas do interior paulista

Jovens dançam balé

As aulas são gratuitas e ocorrem duas vezes por semana, durante uma hora, em prédio próprio. Pode participar qualquer aluno a partir do primeiro ano do ensino fundamental, matriculado em escolas públicas municipais de Tremembé, município paulista de 50 mil habitantes, a 150 quilômetros da capital. “No início do ano, a procura é grande, mas os que ficam mesmo são os que se identificam com a arte e querem seguir carreira artística. Temos descoberto talentos”, explica a gestora do projeto Fazendo Arte, Conceição Fenille Molinaro, professora de artes plásticas e cênicas formada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Nascido há nove anos, o projeto hoje oferece aulas de diferentes expressões artísticas, como hip-hop, dança flamenca, balé clássico, quadrinhos, artes plásticas (desenho, gravura e pintura), teatro e vários instrumentos musicais, com o apoio da Secretaria de Educação do município.

Atualmente, 620 alunos estão matriculados e participam de aulas coletivas. Eles aprendem musicalização, fazem prática de instrumento e leem partitura. “Todos querem participar das nossas duas orquestras”, afirma Conceição. “Fazemos apresentações em Tremembé e cidades vizinhas.”

Bruno Amaral toca, no violão, músicas do Metallica, grupo norte-americano de rock (heavy metal). O estudante busca o sucesso com sua própria banda.

Gustavo Nigoto, apaixonado pelo trombone, ouve solos do mestre Gilberto Gagliardi. Ele diz gostar do instrumento por ser mais cheio de notas brancas (notas naturais, que não sofrem alteração no som) e por completar a harmonia da orquestra. Os dois jovens, que moram em Tremembé, tiveram a chance de descobrir a música graças ao projeto Fazendo Arte, da Secretaria de Educação.

Aluno do segundo ano do ensino médio, Gustavo Nigoto, 16 anos, faz o curso regular em escola pública, à noite. À tarde, é aluno do curso técnico de músico, em escola particular. De manhã, trabalha como estagiário e ajuda um professor nas aulas de fanfarra em Taubaté, município vizinho. Aos sábados, volta para ensaiar na orquestra do projeto. “Nossos ex-alunos não saem daqui”, comenta Conceição. “O núcleo do projeto virou um ponto de encontro de jovens. Para essa juventude, isso é muito saudável.”

Bruno Amaral, 19 anos, já terminou o ensino médio e faz curso técnico de eletricista e manutenção de bicicletas. Ele continua frequentando o projeto, onde aprendeu a tocar violão, guitarra e contrabaixo. Atualmente, faz parte da Camerata de Violões e da banda de rock Sinopse. Quando necessário, substitui os professores de violão, viola caipira e guitarra. “Quando cheguei, gostava da ideia de aprender música, mas não sabia tocar nada”, diz.

As aulas de música do projeto já resultaram em grupos, como a banda Lady Rock, que segue carreira independente. Bruno faz parte da banda. “Estamos atrás do sucesso”, diz, animado. De diferente, o grupo usa violão, em vez de guitarra. “O Slash, do Guns N’ Roses, faz isso”, compara.

Quadrinhos — O curso de história em quadrinhos, em estilo mangá, é outra atividade do projeto bastante procurada. “Toda criança sabe desenhar, mas depois dos 10 anos vai perdendo o estímulo para a criatividade porque a família e a sociedade não acham importante, que não é algo de futuro”, afirma o professor Douglas Henrique Marques. De origem japonesa, o mangá tornou-se conhecido no Ocidente ao ser elogiado pelo desenhista norte-americano Frank Miller.

Nas aulas, cada aluno usa habilidade e criatividade para inventar personagens. “Quem mais procura o curso são adolescentes de 13 a 15 anos, o que é muito bom porque os jovens começam a ler, a se informar sobre a origem e a história do mangá, seus diferentes estilos e sua relação com outros movimentos artísticos, como a art nouveau e a pop art”, diz o professor. “Esses jovens passam a ter, na técnica do desenho, do mangá, uma alternativa de trabalho no futuro.”

O projeto de artes da cidade paulista ganha simpatia e parcerias importantes. Em junho de 2011, sediou o evento Quitutes e Batuques, uma caravana de artistas nacionais e internacionais. Na ocasião, um grupo de 12 artistas holandeses promoveu oficinas de cordas, percussão, sopro, teatro, hip-hop e brinquedos sonoros. (Rovênia Amorim)

Estudantes de escola carioca recriam obra-prima de Da Vinci

A famosa e enigmática Mona Lisa, obra-prima de Leonardo da Vinci, serviu de modelo para a criatividade dos alunos do oitavo ano do Ginásio Experimental Carioca Rivadávia Corrêa, no centro do Rio de Janeiro. A professora de artes Janete Martins Bloise escolheu o artista italiano para apresentar aos estudantes o período do Renascimento. O resultado ficou tão bom que quatro obras dos alunos foram selecionadas para a Mostra Municipal Conexão das Artes, organizada pela Secretaria Municipal de Educação.

Depois de ler sobre a arte na época do Renascimento e artistas daquele período, a professora entregou a cada um dos alunos cópia ampliada, em preto e branco, da pintura Mona Lisa. Divididos em grupos de quatro, teriam de trabalhar com colagem e pintura para recriar a obra. Os trabalhos foram filmados e transformados em vídeo para o blog da escola. Como fundo musical, nada mais apropriado do que a canção Mona Lisa, de Jorge Vercilo.

O grupo de Paula Oliveira Barros de Souza, 14 anos, criou a Mona Fashion. “Coloquei adereços e ajeitei o cabelo para a minha Mona Lisa ficar moderna”, explicou a aluna, que estudou sobre a obra a ponto de saber da matemática escondida na pintura — ao pintar o retrato, Da Vinci buscou conceitos matemáticos (razão áurea) para pintar a beleza perfeita.

“Como não temos material didático, busco recursos na Educopédia (enciclopédia virtual de educação), que nos permite assistir a vários vídeos e visitar virtualmente museus, como o Louvre, onde está o quadro da Mona Lisa”, explica a professora Janete. Os alunos do oitavo ano puderam assistir a um vídeo que traça uma linha do tempo, iniciada com a arte rupestre, passando pelo Renascimento, movimento intelectual e artístico que surgiu na Itália, entre os séculos 14 e 17.

“No século 16, encontramos, paralelamente ao interesse pela civilização clássica, o menosprezo pela Idade Média, associada a expressões como barbarismo, ignorância, obscurantismo, gótico ou sombrio. Por isso, o nome Renascimento”, destaca um trecho do vídeo. “A vida cultural deixou de ser controlada pela Igreja Católica e foi influenciada por estudiosos da sociedade greco-romana, chamados de humanistas.”

Outro artista da Renascença apresentado aos alunos foi Michelangelo, autor da Pietá e dos afrescos no teto da Capela Sistina, no Vaticano, em Roma. Entre os quais A Criação de Adão, pintado por volta de 1511. Os trabalhos dos alunos também foram filmados e postados no blog.

“Em 2011, nossa escola passou a ter período integral, o que está sendo muito bom”, diz a professora. “Ao ficar o dia todo, a gente se envolve mais nos projetos, tem mais tempo de conversar com os alunos e conhecê-los melhor.”

As exposições que chegam à cidade também servem de motivação para as aulas. Este ano, os alunos visitaram a do artista gráfico holandês Maurits Escher (1898–1972), outro recorreu à matemática para criar gravuras. Para o ano letivo de 2012, Janete pensa em ampliar o uso da tecnologia nas aulas de arte. A ideia é que cada turma da escola, do sétimo ao nono ano, tenha seu próprio blog para postar trabalhos e escrever comentários sobre a arte dos colegas. (Rovênia Amorim)

Confira o blog da escola

Projeto de horta dá prêmio à professora do Paraná

Professora Sinara e ministro Fernando Haddad

O projeto Horta Mandala: Mãos na Terra foi um dos 39 premiados na 5ª edição do Prêmio Professores do Brasil. Criado pela professora Sinara Adriana Soares, da Casa Familiar Rural de São Mateus do Sul (PR), tem como objetivo produzir os mais variados tipos de culturas, de forma simples e com baixo custo operacional e econômico, de modo a prover a escola e as famílias dos alunos com alimentos nutritivos, além de servir como complemento da renda familiar.

Formada em letras e com pós-graduação em inglês, Sinara está no magistério desde 2001. E desde 2006 trabalha nessa escola, dando aulas de português e inglês. Segundo ela, que costuma trabalhar utilizando projetos, “a educação deve ser pensada para além da escola, permitindo que cumpra sua importante função de educar as novas gerações e onde todos assumam sua cota de responsabilidade, formulando um sistema educativo integrado com a sociedade.”

Sinara explica que a realização do projeto só é possível, porque ele está centrado na determinação de valores, atitudes, hábitos e práticas, que colocam o ambiente numa perspectiva de ecossistema vivo e interativo.

De que maneira os conteúdos de português e de inglês são trabalhados no projeto Horta Mandala? É Sinara quem explica:

“Os conteúdos de português são trabalhados com textos sobre horticultura e avicultura, análises de gráficos, planejamentos, relatórios, textos dissertativos-argumentativos, textos narrativos (peças teatrais), análises de reportagens sobre o projeto etc. A linguagem formal aparece em textos escritos e a linguagem informal no momento das aulas práticas. São várias as atividades possíveis de relacionar com o projeto no dia a dia, sendo que, em português, são mais fáceis de relacionar com os conteúdos.

Em inglês também são trabalhados textos sobre horticultura, novo vocabulário, tradução, interpretação e atividades diversas. As atividades sobre horticultura e avicultura não são tão diversificadas para trabalhar com a língua inglesa, mas mesmo assim isso é possível.”

Breve resumo do projeto

Este projeto recebeu o nome de Horta Mandala: Mãos na Terra pela aplicabilidade de sua técnica com uma organização sistemática em diagrama composto de círculos concêntricos semelhante ao desenho de uma mandala. Esta é uma palavra sânscrita que significa círculo, uma representação geométrica da dinâmica relação entre o homem e o cosmos, e na filosofia oriental serve de instrumento de meditação sobre o ciclo da vida.

O desenho dos canteiros de forma circular permite um maior aproveitamento da área em comparação com um cultivo em área, o sistema convencional.

Desenvolvido desde 2009, o projeto atende três turmas do ensino médio – 1º, 2º e 3º ano. Como a Casa Familiar Rural oferece o curso técnico em Agroecologia integrado ao ensino médio, o projeto atende, de maneira indireta, as famílias dos estudantes da Casa Familiar Rural, através da Pedagogia da Alternância (os alunos passam um período na escola e outro em suas casas, aplicando as técnicas que aprenderam nas aulas).

(Fátima Schenini)

Saiba mais sobre o projeto Horta Mandala

Rosa Iavelberg (USP): ensino de artes deve articular teoria e prática

Rosa Iavelberg sentada em frente ao computador

Doutora em artes e mestre em educação, Rosa Iavelberg é professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP). Coordenadora do setor educativo do Centro Universitário Maria Antônia, órgão de extensão universitária e cultura ligado à USP, também coordena o curso de especialização As linguagens da Arte, da Pró- Reitoria de Cultura e Extensão da mesma universidade. Graduada em arquitetura e urbanismo, é uma das autoras dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) na área de artes.

Nesta entrevista ao Jornal do Professor, ela defende que o ensino de artes deve articular teoria e prática. “O que se aprende no teórico afeta o que se faz na prática criativa e vice-versa”, afirma.

Em sua opinião, o professor de artes deve ter formação teórica e prática para que as aulas de artes sejam plenas e cumpram o seu papel curricular. “Saber como os alunos aprendem para orientar o ensino e ter vivências em práticas artísticas nas linguagens que ensina é fundamental”, ressalta.

Jornal do Professor – Por que é importante que o ensino de arte faça parte do currículo escolar?

Rosa Iavelberg – Arte é uma forma de conhecimento e expressão. Seu ensino tem como objetivo garantir aos alunos acesso ao patrimônio cultural e histórico e possibilitar atos de criação e conhecimento em diferentes linguagens da arte. Fazendo e conhecendo arte na escola o aluno se reconhecerá como leitor competente das obras dos artistas e valorizará o papel da arte na sociedade e na vida dos indivíduos.

JP – O que deve ser ensinado?

RI – O currículo pode priorizar conteúdos advindos da arte brasileira e de diversos povos e culturas, sem hierarquias de valor, contanto que os recortes selecionados tenham qualidade artística e estética. O fazer e o conhecer arte devem estar associados no desenho curricular.

JP – As aulas de artes ainda são vistas como um conteúdo secundário pelos gestores e professores no Brasil?

RI – No Brasil, a arte foi ensinada nos moldes da escola tradicional com cópia de modelos e treino de habilidades. Ensinou-se também no paradigma da escola renovada com foco na livre expressão e, atualmente, considera-se a influência da cultura no ensino de arte. A terminologia acompanha os avanços da arte e da educação. O termo “educação artística” esteve relacionado às orientações da escola renovada, na crença da livre expressão e da não interação da criança e do jovem com a arte dos adultos na aprendizagem em arte. Hoje está muito difundida a terminologia inscrita nos Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino de Arte. Tal concepção está de acordo com a inserção de arte no currículo como área de conhecimento como as demais, com conteúdos próprios. Acredita-se que a aprendizagem em arte se dá por intermédio de atos criativos nas linguagens da arte associadas à interação com a produção social e histórica da arte.

JP – Como deve ser o ensino de artes nas escolas públicas? Há uma divisão de conteúdo para o ensino fundamental e ensino médio?

RI – Não existe uma proposta diferente para escolas públicas e privadas. O ensino de qualidade é um só, parte-se do que os alunos trazem como saber para ensinar o que ainda não sabem na área de arte. Teoria e prática articulam-se na aprendizagem da arte, o que se aprende no âmbito teórico afeta o que se faz na prática criativa e vice-versa. Conhecer a produção dos artistas na história situa o aluno no universo da arte. Evidentemente os conteúdos adequam-se ao ciclo escolar, principalmente no tratamento didático que se dá a eles. Pode-se ensinar arte contemporânea brasileira, por exemplo, desde a educação infantil até o ensino médio. A seleção de conteúdos, as obras selecionadas e o planejamento das sequências didáticas são regulados pelos conhecimentos anteriores dos estudantes e suas possibilidades de aprendizagem. Assim sendo, para cada ano existem expectativas de aprendizagem diferentes em crescente complexidade ao longo da permanência na escola.

JP – Qual a formação que um professor de artes deve ter?

RI – A formação do professor precisa ser prática e teórica. Conhecer arte, ter domínio didático em arte, ou seja, saber como os alunos aprendem para orientar o ensino e ter vivências em práticas artísticas nas linguagens que ensina é fundamental. Um professor que não tem experiências de criação em arte, não tem hábitos de frequentar exposições, espetáculos, apresentações e que não frui arte no cotidiano, não saberá orientar o percurso de criação e despertar o entusiasmo dos alunos por conhecer arte.

JP – Arte implica em várias formas de expressão, como desenho, pintura, dança, escultura, teatro, arquitetura, música. A escola deve escolher entre as linguagens ou abordar todas?

RI – São muitas as linguagens da arte, elas se diferenciam entre si e por vezes estão relacionadas como, por exemplo, a linguagem arquitetônica e a do desenho. A escola deve priorizar o ensino do maior número de linguagens que puder, contanto que elas possam ser aprendidas com profundidade em sua especificidade. Em razão do tempo didático sabe-se que muitos conteúdos e muitas linguagens ao mesmo em um projeto tornam precária a aprendizagem e impedem que se cumpram as expectativas de apreensão de conhecimento.

JP – O ensino de arte no Brasil segue parâmetros de países que despontam em qualidade na educação?

RI – O ensino de arte no Brasil, em termos de pesquisa e produção de conhecimento na área, não fica atrás dos países avançados em educação. Entretanto, existe um vão a ser diminuído entre as proposições teóricas e sua difusão na maioria das escolas. As principais faltas são a formação dos professores, a valorização da profissão, a inserção da arte no currículo com o mesmo valor das demais disciplinas e a articulação do que se ensina nas escolas com as práticas sociais em arte. Faltam nas escolas, sobretudo, materiais para práticas artísticas, informativos sobre arte (livros, vídeos, CDs). Falta também tornar curricular a visita a museus, a feiras de arte, a ateliês de artistas, a estúdios de artistas gráficos, a escritórios de arquitetos, a estúdios de músicos, a espetáculos de teatro e shows de música.

JP – Como o professor pode aproveitar as novas tecnologias para aproximar o ensino de arte dos alunos?

RI – A tecnologia, além de possibilitar mais meios de criar e de acessar informações sobre arte, aproxima os jovens de seus interesses, expande o contato com a produção artística do mundo todo.

JP – Precisamos avançar em política pública para a área de artes?

RI – Sim. É necessário expandir o tempo didático para cada linguagem (teatro, dança, música, artes visuais) que é ensinada e investir na formação dos professores com práticas artísticas de criação, conhecimento dos processos de aprendizagem em arte e da produção social e histórica da arte.