A chefe do Museu de Folclore Edison Carneiro, do Rio de Janeiro, Elizabeth Bittencourt Paiva Pougy, acredita que trabalhar temas relacionados ao folclore na escola possibilita a aproximação entre as experiências de vida dos estudantes e o conteúdo escolar. “Relacionar saberes e fazeres cotidianos com as diferentes disciplinas didáticas pode dar mais sentido à pesquisa e ao estudo”, defende.
Na visão de Elizabeth, a prática de desafiar o estudante a pesquisar as manifestações culturais em sua própria comunidade pode gerar um processo de construção de identidade e mais interesse em investigar, participar e aprender. Além disso, segundo a museóloga, o aluno pode relacionar a cultura local a outras e, assim, perceber a natureza dinâmica da cultura em permanente construção e transformação.
O Museu de Folclore integra o Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
Jornal do Professor — Qual a importância de se trabalhar com o folclore na escola?
Elizabeth Bittencourt Paiva Pougy — O folclore e a cultura popular estão presentes em nosso dia a dia. A importância de se trabalhar com esse conteúdo na escola é justamente a possibilidade de aproximar o conhecimento que os estudantes trazem de suas experiências de vida do conteúdo escolar. Relacionar saberes e fazeres cotidianos com as diferentes disciplinas didáticas pode dar mais sentido à pesquisa e ao estudo.
— Como a escola deve tratar o conteúdo de folclore? É necessário dar ênfase ao folclore local e ao regional?
— Se o estudante é desafiado a pesquisar as manifestações culturais em sua própria comunidade, essa prática pode gerar um reconhecimento dos sujeitos sociais envolvidos, um processo de construção identitária (sic), maior interesse em investigar, participar e aprender, além de poder relacionar a cultura local a outras e perceber a natureza dinâmica da cultura que está em permanente construção e transformação. Quanto à questão do regional, para uma escola do Sudeste, por exemplo, faz mais sentido trabalhar a cultura nordestina, tomando por referência os movimentos migratórios, as dificuldades de adaptação decorrentes do preconceito e as influências que os nordestinos exercem sobre outros brasileiros com os quais se relacionam.
— Quais as áreas englobadas pelo folclore? E quais disciplinas podem se beneficiar com conteúdos relacionados ao folclore?
— Quando falamos sobre folclore e cultura popular, estamos nos referindo não apenas às manifestações festivas e às tradições orais e religiosas de diferentes grupos sociais brasileiros, mas ao conjunto de suas criações, à maneira como se organizam e se expressam, aos significados e valores que atribuem ao que fazem, aos diferentes modos de trabalhar, aos jeitos de falar, aos tipos de música que criam, às misturas que fazem na religião, na culinária, na brincadeira. Muitas são as disciplinas que podem dialogar com o conteúdo cultural de toda a comunidade escolar. Geografia, ciências, literatura, história e as diferentes áreas da educação artística são algumas das que certamente se beneficiam com o conteúdo cultural dos sujeitos envolvidos no processo dialógico de ensino e aprendizagem no contexto escolar.
— Há exemplos de atividades que podem ser desenvolvidas em aulas que tratem de conteúdo relacionado a folclore?
— Professores e estudantes podem investir em projetos de pesquisa sobre brinquedos e brincadeiras; sobre as trocas culturais e conflitos decorrentes dos processos migratórios em territórios brasileiros; sobre os processos de produção das festas coletivas, com ênfase naquelas que ocorrem em sua própria comunidade; sobre os diferentes ofícios de ambulantes e sua relação com profissões oficialmente reconhecidas. Ou seja, atualizando o enfoque desses estudos na escola, educadores estarão desconstruindo a tendência, que em algumas escolas ainda persiste, de associar o folclore ao passado, ao rural, ao anônimo, recontando todos os anos as lendas de saci, curupira e mula-sem-cabeça, circunscrevendo o entendimento de conteúdos culturais muito mais ricos e próximos dos educadores e estudantes a um campo restrito e distante.
— Quais os benefícios que o ensino de assuntos relativos a folclore pode proporcionar aos estudantes?
— Um dos maiores benefícios é justamente dar sentido ao estudo e à pesquisa escolar, na medida em que relaciona conteúdo empírico e teórico numa perspectiva dialógica, que é como entendemos a educação. A aproximação de conteúdo das culturas populares, quando se dá a partir da investigação dos repertórios culturais que estão próximos da vida dos alunos, da comunidade escolar, do bairro e da cidade onde esse grupo se insere, permite que os sujeitos se vejam como pertencentes a contextos complexos, em que diferentes expressões culturais estão relacionadas. Essas práticas permitem enxergar o outro como um sujeito também inserido em contextos complexos, em vez de imaginar que os nordestinos se vestem como vaqueiros, como baianas ou que brincam o bumba-meu-boi todos os dias.
— O que o Museu do Folclore tem a oferecer a estudantes, professores e à comunidade em geral?
— O museu faz parte do Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular. Além do museu, o centro tem ainda o setor de pesquisa, a Biblioteca Amadeu Amaral e o setor de difusão cultural, onde funciona o programa educativo. A biblioteca está aberta ao público de terça a sexta-feira, entre 10 horas e 17h30. O acervo é especializado em folclore e cultura popular. É possível ainda agendar visitas para conhecer o acervo sonoro-visual da instituição. Além da exposição de longa duração, o centro realiza exposições temporárias na Sala do Artista Popular e na Galeria Mestre Vitalino, com produção de catálogos para cada uma delas. Anualmente, é realizado um curso livre de folclore, geralmente no mês de julho. O centro presta assessoria ao professor e a outras instituições na construção de projetos específicos, promove visitas preparatórias ao museu para professores e empresta projetos itinerantes para instituições escolares e culturais para enriquecer a pesquisa dos usuários. Recentemente, foi preparada a publicação Professor, para distribuição gratuita, na qual estão reunidos textos de vários especialistas na área do folclore e da cultura popular que nos ajudam a pensar sobre como trabalhar com esse campo de estudos na escola. Outra maneira de acesso a parte de nosso acervo é a internet, na página www.cnfcp.gov.br.
— O que são projetos itinerantes? Como as escolas podem participar?
— Pensando na dificuldade de acesso, que muitas vezes impede estudantes de conhecerem os espaços do Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular, foram criados três projetos itinerantes para que o público tenha contato especial com parte do acervo e do conhecimento ali produzido. Os projetos De Mala e Cuia, Olhando em Volta e Fazendo Fita podem ser emprestados por um período de 40 dias. Atendem majoritariamente ao público escolar do ensino fundamental e médio, mas também podem ser emprestados a instituições culturais que desenvolvam ações educativas. Para ter acesso ao empréstimo de um dos projetos é imprescindível a participação na reunião de apresentação dos projetos itinerantes. São encontros mensais, previamente agendados, em que, além de informações sobre o conteúdo e o perfil de cada um, são discutidos diversos aspectos da relação entre educação, folclore e cultura popular, de modo que os educadores interessados possam preparar seu uso nas instituições em que atuam.
Mais informações sobre o Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular no endereço eletrônico educacao.cnfcp@iphan.gov.br, pelos telefones 2285-0441 e 2285-0891, ramais 204 ou 206 e no endereço: Rua do Catete, 179, Glória. CEP 22220-001, Rio de Janeiro, RJ.
Acesse a página do Museu do Folclore na internet
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