Portal do Governo Brasileiro
Início do Conteúdo
JORNAL
Edição 115 - A Família na Escola
08/07/2015
 
ou

Heloísa Szymanski: “Aproximação entre a escola e família deve fazer parte do projeto político-pedagógico”

A direção da escola precisa dar os primeiros passos para uma aproximação com as famílias

A direção da escola precisa dar os primeiros passos para uma aproximação com as famílias

Autor:Foto extraída do Currículo Lattes


Professora titular aposentada da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, com experiência na área de família e educação, Heloísa Szymanski considera a aproximação entre a família e a escola muito importante. Ela enfatiza a necessidade de a direção da escola dar os primeiros passos e criar mecanismos para que essa aproximação aconteça. “O ponto de partida é a escola colocar em seu projeto político-pedagógico essa intenção e desenvolver ações efetivas e uma política interna para que isso aconteça”, diz. “Esse é o ponto fundamental para acontecer.”

Com graduação em psicologia, mestrado e doutorado em educação e pós-doutorado na Universidade de Oxford, na Inglaterra, na área de psicologia, Heloísa desenvolve atividades na Associação Educacional Labor, instituição voltada para a melhoria da educação no Brasil. (Fátima Schenini)

Jornal do ProfessorQual é a importância de aproximar a família da escola? Quais os benefícios que essa aproximação pode trazer a todos os envolvidos?

Heloísa Szymanski — A importância é grande, tanto para as escolas particulares quanto públicas. Nas escolas públicas, que são o meu foco de interesse e onde desenvolvi todas as minhas pesquisas, vejo a escola e a família como duas instituições educativas. Uma formal; outra, informal. E ambas podem contribuir para o desenvolvimento da criança, do adolescente e também usufruir dessa influência mútua, tanto nos modos de aprender e de ensinar quanto nos conteúdos mesmo, principalmente em escolas públicas que atendem crianças que vêm de famílias muito diferentes entre si.

Em São Paulo, há um número muito grande de migrantes e agora também de imigrantes, da América Latina, do Haiti, que estão chegando. Então, as escolas públicas aqui em São Paulo têm esse desafio de trabalhar com uma diversidade muito grande, o que é uma riqueza, por um lado, e um enorme desafio, por outro. Então, a escola pode e deve passar os modos da nossa sociedade, da nossa cultura, dos nossos valores atuais quanto à utilização de tempo, quanto a modos de compreensão das informações, conteúdos e também quanto a modos de ensinar. Por que eu falo em modos de ensinar? Notei em várias pesquisas que o modo de ensinar pela imitação e pelo fazer é muito frequente entre as famílias de crianças que frequentam as escolas públicas, diferente do modo exclusivamente verbal adotado pela escola. Então, por exemplo, uma troca nesse sentido é extremamente rica porque ambas as formas são boas. A criança precisa se formar e se desenvolver no modo verbal, mas também o aprender pelo fazer é muito importante. Esse é só um exemplo de como, no modo de aprender, a escola e a família podem trabalhar juntas com a criança. Então, vejo que essa importância aparece tanto de um lado quanto de outro. Ambos ganham. Ambos contribuem, tendo em vista a criança e o adolescente — o educando — como centro das preocupações educacionais.

De que maneira professores e diretores podem estimular maior participação dos pais na escola? Que atividades ou recursos podem ser usados nesse sentido?

— O ponto de partida, e sem ele nada é possível, é a importância de querer essa aproximação. Pode parecer uma coisa simples e de bom-senso, mas é extremamente difícil esse querer. Muitas vezes, há até o desejo de uma participação, eu diria até idealizada. Uma participação, como Paulo Freire chamaria, de bancária. A escola diz como as famílias devem agir e elas obedecem. Mas, às vezes, isso não acontece, e as escolas ficam frustradas e sentem que as famílias não colaboram. Mas deixam de ver muitas coisas, como o medo que as famílias, principalmente as de baixa renda, têm da escola porque elas mesmas, essas famílias, são egressas da escola pública. Muitos pais e muitas mães já tiveram enormes dificuldades, já não conseguiram completar a escolaridade. Então, esse contato com a escola nem sempre é fácil por parte das famílias. A escola, na verdade, se põe, principalmente nas grandes metrópoles e nos bairros periféricos, como a única presença do Estado. E é muito poderosa. E esse poder exercido para o crescimento educacional é maravilhoso. Mas muitas vezes ele entra de modo meio opressivo em relação às famílias cujos filhos não conseguem acompanhar a escolaridade e há ainda o medo que as famílias muitas vezes têm das escolas. Há um desejo de participação por parte da escola, dos professores e da gestão, mas não há uma compatibilidade, a criação de um discurso comum.

O grupo gestor, a direção da escola, precisa dar os primeiros passos para essa aproximação com as famílias e criar mecanismos para que isso aconteça. Os professores não conseguem, isoladamente, estabelecer aproximação mais efetiva, embora possam, sim, ter um contato informal com os pais. Isso acontece com muitos professores, que são maravilhosos nesse contato e nessa colaboração com as escolas, mas sem uma política da escola é muito difícil que se instaure essa colaboração.

Então, o ponto de partida é a escola colocar em seu projeto político-pedagógico essa intenção e desenvolver ações efetivas e uma política interna para que isso aconteça. Esse é o ponto fundamental. Na elaboração desse projeto político-pedagógico deve haver a participação da escola e da liderança comunitária, de ex-alunos. Isso é muito efetivo. E não é sonho.

A senhora mencionou a importância de haver um aproveitamento do modo de ensinar, pela imitação e pelo fazer, que costuma ocorrer nas famílias de crianças que frequentam as escolas públicas. Como isso poderia ser aplicado na escola?

— Tenho um exemplo simples: um pai, pedreiro de profissão, foi a uma aula de matemática do filho e, com o prumo, explicou o que era um ângulo reto. Isso, numa realidade para os alunos, foi um pulo depois para a teorização. Imagine o filho vendo o pai no lugar do professor, por alguns momentos, ensinando a todos. Lembro também de uma atividade desenvolvida em uma escola de educação infantil, em encontro com os pais. As mães contavam como ensinavam as filhas a cozinhar; os pais, como ensinavam os filhos a lavar o carro, entre outros exemplos. Os professores puderam assim constatar a importância, para as crianças, de ver a coisa acontecer e de aprender fazendo. O passo seguinte, para o verbal, para o conceitual, fica bem facilitado. Isso não vale só para as crianças de baixa renda: vale para todo mundo. É um modo de aprender muito rico.

A importância de aproximar a família da escola é um assunto que está sendo abordado nos cursos de licenciatura, com os futuros professores?

— Sim. Nas pesquisas que estão sendo realizadas, muitas escolas efetivamente já colocam isso em prática. Aliás, na pesquisa de uma das minhas mestrandas, ela encontrou um material riquíssimo no MEC sobre a participação das famílias nos conselhos escolares.

Qual sua opinião a respeito do aproveitamento do espaço físico das escolas e da participação dos professores para a disseminação de conhecimentos aos pais ou responsáveis? Seria o caso de se fazer palestras em áreas como saúde, psicologia ou direito, por exemplo?

— Cada escola, com a sua comunidade, pode pensar essas propostas. Numa das escolas em que desenvolvi minhas pesquisas, foram realizadas atividades muito enriquecedoras junto à comunidade e à família, mas que envolveram a abertura da escola à comunidade. A partir de atividades de interesse dos pais, essas informações foram passadas. Nem sempre palestra é um modo de transmissão do conhecimento mais adequado, embora haja um pouco esse mito. A palestra funciona quando alguém quer muito conhecer um determinado tópico e nem sempre há esse desejo intenso em todo mundo e nem sempre uma capacidade de comunicação tão boa por parte do palestrante. Sem contar que muitas pessoas não têm tempo para ficar 40 minutos ou uma hora sentados ouvindo alguém falar. O importante nessas atividades de troca de saberes é que sejam planejadas de forma a realmente comunicar os conteúdos, os valores, as crenças.

As políticas educacionais brasileiras avançaram nas questões relacionadas à aproximação da família e da escola?

— As políticas existem e são muito boas. Mas exigem um tempo para se estabelecerem. Para que essas políticas se estabeleçam, para que os conselhos de representantes sejam, de fato, de representantes, as escolas precisam de formação. Principalmente sua equipe gestora. A formação de gestores é fundamental para a implementação das políticas escolares, dos projetos políticos-pedagógicos. Criar um conselho efetivamente representante é uma maravilha, mas não é fácil.

E essa formação seria feita de que maneira?

— Seria uma formação em serviço, realizada nos níveis federal, estadual e municipal. Acompanhar as escolas nesse processo de aproximação com a família, assessorar as escolas nisso, ouvi-las nas suas dificuldades, acolhê-las, mesmo. Muitas escolas têm esse desejo e não conseguem instrumentalizá-lo porque não têm uma receita. Cada escola está numa comunidade, com as famílias de seus alunos, e precisa construir isso com criatividade. Então, precisam de assessoria.

ENQUETE

Ajude-nos a escolher o tema da próxima edição do Jornal do Professor. É só clicar em uma das opções abaixo!

Fim do Conteúdo
REPORTAR ERROS
Encontrou algum erro? Descreva-o aqui e contribua para que as informações do Portal estejam sempre corretas.
CONTATO
Deixe sua mensagem para o Portal. Dúvidas, críticas e sugestões são sempre bem-vindas.