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Edição 31 - Prêmio Professores do Brasil - 2009
15/12/2009
 
ou

O que é ser professor hoje?

José Antônio Moreira dá aulas de sociologia em Cuiabá (MT).

José Antônio Moreira dá aulas de sociologia em Cuiabá (MT).

Autor:Arquivo Pessoal


O professor José Antônio Moreira dá aulas de sociologia no ensino médio desde 2007, atuando principalmente na Escola Estadual Rodolfo Augusto Trechaud e Curvo, em Cuiabá (MT). Ele é licenciado em ciências sociais pela Universidade Federal de Mato Grosso.

Publicamos abaixo o artigo que José Antônio enviou para o Jornal do Professor.

Os professores na contemporaneidade ou as duas heranças socráticas

Recentemente tive que responder a seguinte questão: o que é ser professor hoje? Para respondê-la retomei duas heranças do filósofo grego Sócrates. Vejamos quais são:

I. A primeira delas ocorre quando recorremos ao filósofo grego para fazer a seguinte sentença: “só sei que nada sei”, que a ele é atribuída, para por diversas vezes utilizá-la de maneira equivocada. O principal equívoco consiste em simplesmente dizer que nada sabemos e que tudo ignoramos. Perdemos assim seu sentido fundamental que, pretendo recuperar aqui, e consiste na sabedoria de reconhecer a própria ignorância como ponto de partida para o saber. Isto é: reconheço a minha própria ignorância para que dela possa me libertar, porque o seu reconhecimento é o que torna necessário a busca do aprendizado, do conhecimento. Esta primeira herança socrática remete a nossa identidade como professor, pois nunca deixamos de ser aprendizes e que, portanto, professor e aprendiz não são termos opostos ou muito distantes, mas complementares.

II. A segunda herança socrática é negativa em relação a nós: profissionais da educação. Por seu sentido possuir um caráter pejorativo este legado se apresenta como pólo oposto ao da primeira contribuição. Leiamos: na Grécia Antiga havia os sofistas, que foram professores muito criticados por seus contemporâneos porque cobravam pelas aulas, inclusive por Sócrates, que os acusou de prostituição.

Ocorre que na Grécia Antiga apenas os nobres se ocupavam com o trabalho intelectual, pois gozavam de tempo para o ócio, já que, os trabalhos manuais eram tarefa dos escravos, e os sofistas pertenciam à classe média, portanto, faziam das aulas o seu ofício, já que não eram suficientemente ricos. Quanto a isso, Maria Lúcia Aranha e Maria Helena Martins (1993) frisam que “até hoje os professores são mal-remunerados tanto porque as pessoas se recusam a pagá-lo de forma semelhante ao que é feito aos outros profissionais liberais, tanto porque os próprios professores sofrem da 'síndrome de Sócrates’!” [1] Isto é: um sintoma que se apresenta quase como uma doença em nosso pensamento: o de que ser professor não é uma profissão, mas uma vocação. Essa simples sentença que a primeira vista parece bela traz consigo conseqüências perversas, pois naturaliza o que é socialmente construído, - cabe lembrar: o que é natural não pode ser combatido, contestado – reforçando assim a idéia de que os professores que tomam uma atitude de reivindicação por melhores salários para a profissão são mercenários, prostitutos, já que vocação acaba se opondo à profissão no imaginário social.

Esse processo na prática naturaliza, consolida ainda mais a condição desigual que o profissional da educação encontra na atualidade: o salário do professor continua a ser menor do que o de outro profissional com diploma de nível superior.Desse modo continuamos a sofrer da “síndrome de Sócrates”, os nossos contemporâneos e nós, profissionais da educação de hoje.

Uma maneira simples de compreendermos essa questão é a seguinte: por que o piso salarial do professor (profissional com diploma universitário) é inferior ao de qualquer outro profissional com nível superior no Estado? Penso que o caminho desta indagação é o caminho para compreendermos o que é ser professor hoje. Nós como todos os outros cidadãos brasileiros desejamos a melhoria da qualidade da educação, e trabalhamos para isso, mas acredito que a melhora dos índices de qualidade não depende APENAS da introdução de recursos tecnológicos nas escolas, de cursos de capacitação e da motivação não remunerada dos profissionais da educação através de publicidades recentemente veiculadas nos meios de telecomunicação pelo Governo Federal. Pois, em uma sociedade em que a estética prevalece sobre a ética, a valorização do profissional da educação depende fundamentalmente da valorização salarial da profissão. Então, um movimento importante e lógico no processo da melhoria da educação está na equiparação dos pisos salariais com outros profissionais com nível superior, que são igualmente importantes para a vida social.

José Antônio Moreira – cientista social e professor da rede estadual.

[1] ARANHA, Maria Lúcia de Arruda & MARTINS, Maria Helena Pires.Filosofando: introdução à filosofia. São Paulo: Moderna, 1993.

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