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JORNAL
Edição 114 - Ensino de Línguas
10/06/2015
 
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Vera Menezes (UFMG): “É preciso investir na formação dos professores”

Para Vera Menezes, o Brasil precisa investir na formação de professores em vários idiomas

Para Vera Menezes, o Brasil precisa investir na formação de professores em vários idiomas

Autor:Arquivo pessoal


A professora Vera Lúcia Menezes de Oliveira e Paiva defende o investimento na formação dos professores para que o Brasil possa avançar no ensino de idiomas. “O professor que não fala a língua que ensina não tem motivação para o trabalho, nem consegue motivar os alunos”, analisa.

Vera Menezes é professora titular da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e pesquisadora do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Atua na graduação e na pós-graduação, nas linhas de pesquisa em ensino-aprendizagem de línguas estrangeiras e em linguagem e tecnologia. Para ela, não adianta investir em bons livros didáticos, em equipamentos, em uma carga horária decente, “se não tivermos professores preparados para conduzir o processo”.

Com graduação em português, em inglês e em direito, mestrado em inglês, doutorado em linguística e filologia e pós-doutorado em linguística, Vera coordena o projeto de pesquisa Aprendendo com Memórias de Falantes e Aprendizes de Línguas Estrangeiras (Amfale), com colaboradores no Brasil, Japão, China e Finlândia. (Rovênia Amorim)

 

Jornal do ProfessorO ensino de línguas estrangeiras nas escolas ganha importância na atual sociedade do conhecimento. De que forma o Brasil pode avançar nesse ensino?

Vera Menezes — O primeiro passo é investir na formação dos professores. O professor que não fala a língua que ensina não tem motivação para o trabalho, nem consegue motivar os alunos. Esse tipo de professor, fatalmente, vai apelar para atividades mecânicas, que lhe dão mais segurança. Nenhum outro investimento dará certo se continuarmos com uma grande massa de professores malqualificados. Não adianta investir em bons livros didáticos, em equipamentos, em uma carga horária decente, se não tivermos professores preparados para conduzir o processo.

Como os professores da educação básica podem despertar o interesse dos alunos para o aprendizado de uma língua estrangeira? Mostrar ao estudante que esse aprendizado pode ajudá-lo profissionalmente, no futuro, é uma forma de estímulo?

— O futuro profissional pode ser um fator motivacional. O mais importante, porém, é o aluno perceber que consegue se inserir em práticas sociais mediadas pela língua adicional. O ensino precisa se voltar para o uso da língua.

O que é mais importante para que se alcancem bons resultados nas aulas de línguas estrangeiras na educação básica? O professor, o material adotado ou o método utilizado?

— Em primeiro lugar, o professor. O material didático ajuda muito, mas o professor precisa saber trabalhar com ele.

Quais os principais métodos utilizados para o ensino de uma língua estrangeira? Há um método melhor que outro?

— A história do ensino de línguas demonstra que se pode aprender com qualquer método. No entanto, acredito firmemente que o ensino de línguas só pode ser bem-sucedido quando o aprendiz vê sentido no que aprende, quando as atividades que desenvolve se inserem em práticas sociais autênticas e ele percebe que pode usar essa língua em experiências fora da sala de aula. Ouvir música, por exemplo, é uma prática de uso real da língua. Escrever mensagem em rede social, na língua que aprende; fazer um cartão do Dia das Mães ou de aniversário nessa língua; entrevistar um estrangeiro; produzir um cartaz de protesto, dentre outras atividades, são exemplos de práticas sociais autênticas. Ao fazer isso, o aluno vê sentido na aprendizagem da língua.

As instituições de educação superior brasileiras formam bons professores de línguas estrangeiras? Qual a contribuição que as universidades podem dar para melhorar o ensino de línguas na educação básica?

— A maioria das universidades forma bons professores. Mas, devido aos baixos salários, esses professores deixam de ir para o ensino público. Não basta formar bons professores. É preciso assegurar que eles permaneçam na rede pública. As universidades podem e estão contribuindo também com ações de educação continuada, mas nem sempre a direção das escolas libera os professores para participar de capacitações. É preciso incentivar e apoiar os professores para que eles invistam na própria formação.

Geralmente os estudantes não têm como praticar um segundo idioma, dentro ou fora da escola. Como eles poderiam fazer esse treinamento?

— Com o advento das novas tecnologias, não há limitações para a prática do idioma. As tecnologias de áudio e voz estão bastante evoluídas, e há inúmeras ferramentas de interação e comunicação gratuitas, na internet, que permitem o uso da língua. Os alunos precisam apenas de orientação e apoio dos professores para utilizar essas oportunidades de prática do idioma.

Há controvérsia entre os teóricos sobre o ensino de línguas nas escolas públicas. Uma corrente diz que é mito a impossibilidade de aprendizado de um segundo idioma na educação básica. Qual é a sua opinião?

— É sim possível aprender nas escolas públicas, desde que elas tenham uma carga horária didática decente e um professor que saiba a língua, que tenha boa formação como professor de língua adicional. Conheço bons exemplos de professores e também de alunos que saíram da educação básica com um nível de inglês razoável. Não se pode esperar da educação básica, com sua reduzida carga didática, que o aluno alcance um nível avançado, mas é possível ir além do elementar.

Uma das críticas às aulas de inglês no ensino fundamental é a ausência de prioridade para a habilidade de conversação. Em estudos acadêmicos, os alunos denunciam o conteúdo repetitivo e a ênfase no verbo to be. É preciso atualizar o método de ensino e investir na formação de professores?

— A crítica é justa. Prova disso é a seleção das obras aprovadas no Programa Nacional do Livro Didático (PNLD). A maioria dos professores escolhe os materiais que menos desafiam os alunos e que oferecem menos experiências de aprendizagem. Como nenhum livro tem foco exclusivo na forma, muitos professores se recusam a usar as obras, e todo o dinheiro investido na aquisição das mesmas vai literalmente para o lixo. Ainda estamos na luta para sair do foco na gramática para o foco no uso da língua. É possível usar a língua com propósitos comunicativos desde as primeiras aulas. Pensemos, por exemplo, no ensino dos numerais até nove. Em vez da repetição mecânica, é possível pedir aos alunos para compartilhar números de telefones, em inglês. Eles podem usar os números de emergência, como os do corpo de bombeiros, serviços de saúde, polícia, escola, amigos e parentes etc. Essa prática não mecânica os ajuda a aprender vocabulário e, ao mesmo, tempo a aprender a pedir e a dar informações sobre números de telefones em inglês. Esse é um exemplo de que é possível usar o verbo to be para comunicação e ir além dele. Para isso, insisto, precisamos ter professores bem qualificados.

A internacionalização da educação superior contribui para a valorização da língua estrangeira, principalmente o inglês?

— Sim, temos visto, em todas as universidades federais, um grande investimento em ensino de inglês com o advento do programa Ciência sem Fronteiras. Os alunos têm cursos para desenvolver a competência em inglês e estão motivados.

Em que medida o programa Ciência sem Fronteiras tornou-se um incentivo aos estudantes no aprendizado de um segundo idioma? Há motivação e maior interesse no aprendizado?

— Sim, tem sido um grande incentivo. Os estudantes, agora, vislumbram a possibilidade de realizar o sonho de ter uma vivência no exterior.

O Brasil precisa de uma política linguística? Como ela deve estar estruturada?

— Precisamos investir em um bom ensino de inglês, que é a língua da ciência, mas precisamos também investir em uma política plurilíngue, com formação competente de professores em vários idiomas. Precisamos ensinar a aprender outras línguas para interagir com países onde a ciência se desenvolve e também com aqueles que são nossos parceiros comerciais. Assim, não devemos nos limitar ao ensino de inglês e espanhol, como tem sido feito. Temos de abrir mais oportunidades para o ensino de mandarim, alemão, francês, árabe e outros idiomas. Ao mesmo tempo, precisamos também investir no ensino de português para estrangeiros e divulgar o português brasileiro no mundo. Além disso, precisamos de política de proteção às línguas indígenas e de formação de professor indígena.

Acesse a página da Faculdade de Letras da UFMG e a página da Amfale na internet

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