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JORNAL
Edição 29 - Semana Nacional de Ciência e Tecnologia
04/11/2009
 
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Entrevista com o professor Celso Dal Ré Carneiro, da Unicamp


Geólogo, com mestrado e doutorado em geociências, Celso Dal Ré Carneiro é professor e chefe do Departamento de Geociências Aplicadas ao Ensino, do Instituto de Geociências da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Atua no magistério desde 1970, com experiência em diferentes níveis de ensino.

Em entrevista ao Jornal do Professor, Celso Dal Ré Carneiro aborda temas como a importância da ciência e tecnologia na escola, qual a melhor forma para os estudantes aprenderem conteúdos de ciência e tecnologia, e o trabalho realizado pelo Departamento de Geociências Aplicadas ao Ensino.

Jornal do Professor - Qual é a importância da ciência e tecnologia na escola?

Celso Dal Ré Carneiro - Creio que nunca, nas escolas, o ensino de ciência e tecnologia tenha perdido importância. Agora, porém, mais do que antes, os avanços do conhecimento vêm sendo tão rápidos e notáveis que uma pessoa incapaz de perceber seu alcance e significado facilmente sentir-se-á desvalorizada e deslocada de seu próprio tempo. Não se trata de criar “consumidores” ávidos por novas informações e que possam ficar, de algum modo, incomodados pela perspectiva de “estar perdendo algo” do que acontece. O problema é mais do que ajudar um cidadão a “acompanhar” o que há de novo, trata-se de revelar os fundamentos que estão por detrás desses avanços. Escrevo a palavra “acompanhar”, assim mesmo, entre aspas, porque não podemos criar meros expectadores, temos de estimular inteligências e desenvolver habilidades. Nesse campo, extremamente fértil, certamente surgirão os cientistas de amanhã. Assim, o papel da escola assume um significado mais profundo e, a meu ver, um alcance muito mais longo.

JP - Em sua opinião, o que não pode faltar no processo de ensino-aprendizagem (nessa área)?

CDRC - Antes de mais nada, precisamos estar preparados, como professores, a oferecer aqueles conceitos básicos em física, química, biologia e geologia que tornaram possíveis todos os avanços no conhecimento em todas as escalas, que vão desde objetos de tamanhos subatômicos a submicroscópicos, até as escalas gigantescas nas quais se situam o próprio sistema solar e o universo como o conhecemos hoje.

Temos de explorar convenientemente conhecimentos que surgem de todos esses campos, como por exemplo, os modernos conceitos sobre: (a) como a Terra funciona, (b) como os seres vivos funcionam, se movem e se multiplicam, e até mesmo tratar, da forma mais básica possível, das múltiplas facetas do ambiente natural, (c) como os seres vivos interagem com o sistema Terra, em especial a espécie humana, que tem causado profundas alterações ambientais. Esses conhecimentos formam um verdadeiro suporte para que uma pessoa normal possa entender o mundo contemporâneo.

JP - Qual a melhor forma para os estudantes aprenderem conteúdos de ciência e tecnologia?

CDRC - Não existe uma fórmula mágica ou uma solução melhor do que outras. Quem defender isso estará sendo, antes de mais nada, um bocado parcial. Nunca tive contato, em sala-de-aula, com crianças do antigo primário, nível que atualmente faz parte das primeiras séries do ensino fundamental. Já lecionei, contudo, em diversos níveis de ensino, desde as séries seguintes do ensino fundamental (da antiga 5a série em diante), ensino médio e ensino técnico. Tenho, é claro, mais tempo de dedicação com o ensino superior. Desde 1970 sou professor, e continuo a sentir uma alegria muito grande ao entrar em uma sala-de-aula. Esse espaço é para mim fonte permanente de estímulo.

Pensando melhor, uma forma muito boa pode se resumir a uma palavra: entusiasmo. Imagino que a principal porta de acesso a esse conhecimento de ciência e tecnologia seja proporcionada pelo professor, e o processo causará efeitos tanto mais acentuados nos alunos quanto maior for a alegria e entusiasmo que o professor puder passar a todos eles. Ele deve transmitir e captar nos seus alunos esse interesse pelo saber.

Uma descoberta científica é estimulante em si mesma. Quem já se envolveu em pesquisa e descobriu algo novo sabe muito bem disso. A geologia, campo no qual me formei e atuo, é pródiga. Muitos professores estudaram em ambientes nos quais pouca ênfase foi dada – ou talvez nenhuma ênfase tenha sido dada – aos experimentos práticos. Isso é um problema que precisa ser enfrentado. Nunca é tarde para começar a fazer as coisas e talvez muitos professores tenham mesmo que se tornar autodidatas.

JP - Qual sua opinião sobre as Feiras de Ciências? Por quê?

CDRC - Sempre fui entusiasmado com Feiras de Ciências. Quando professor de uma escola na periferia de São Paulo, na Vila Mangalot, zona noroeste da cidade, tive a oportunidade de fazer, junto com outros dois professores, muito animados, feiras que movimentaram a escola inteira em sábados e domingos. A alegria dos alunos em receber seus amigos, parentes e vizinhos era imensa. Eles queriam apresentar suas “descobertas”, mesmo que simples. Claro que tínhamos a noção de que muitos dos experimentos nada tinham de novo, mas eles estavam redescobrindo esses conteúdos.

JP - Quem participa das aulas ministradas pelos professores do Departamento de Geociências Aplicadas ao Ensino?

CDRC - Temos pós-graduandos que possuem variadíssimos campos de formação. Alguns deles vieram do exterior, mas a grande maioria é formada por brasileiros natos. Vários formaram-se em cursos de graduação de geografia, geologia, história, pedagogia, arquitetura, engenharia, química, biologia, física, filosofia etc. Muitos deles atuam profissionalmente como professores de escolas públicas e particulares de todos os níveis de ensino. Já interagimos com muitas centenas de professores, desde que a antiga área de Educação Aplicada às Geociências foi criada, há mais de 25 anos. Antigamente oferecíamos um curso de especialização em Ensino de Geociências, mas percebemos que os títulos de mestre e doutor são mais valorizados e proporcionam uma formação mais ampla.

Os cursos de licenciatura em geologia são ainda novos no Brasil, mas temos alguns alunos que nos procuraram para começar mestrado, ou que pretendem fazê-lo assim que se formarem.

Uma outra alternativa que o Departamento tem explorado muito são os cursos de atualização docente, os chamados cursos presenciais para professores “em serviço”. Neste caso atingimos mais de 900 professores que participam diretamente das atividades. Agora está em discussão uma modalidade de ensino a distância, com algum componente presencial, junto com colegas da Universidade Federal do Pará. Essa ideia parece demasiadamente promissora, mas ainda é cedo para avaliar seu impacto.

JP - O Departamento realiza algum trabalho voltado para professores e alunos dos níveis fundamental e médio? Em que consiste?

CDRC - O trabalho com professores e alunos dos níveis fundamental e médio tem sido fonte permanente de boas ideias e iniciativas. Fazemos poucas atividades diretamente com os alunos, pois entendemos que os profissionais mais indicados para realizar esse trabalho são os seus professores. Cada professor conhece bem o grupo com quem trabalha e isso precisa ser valorizado. É juntamente com o professor que concentramos as ações. O número de pessoas ainda é pequeno, também porque nosso grupo é igualmente reduzido. Fazendo umas contas rápidas, creio que não atingimos a casa de 200 professores das redes pública e privada que participaram efetivamente de projetos de pesquisa no campo da Educação em Geociências. Os resultados são surpreendentes. O mais interessante é registrar que esse entusiasmo dos professores independe de sua faixa etária, nem do volume de trabalho que cada um deles possui. Eles começam a se envolver e querem mais, muito mais.

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